Resultado do trabalho da Associação Sul-Catarinense de Cegos (ASCC), o projeto quer dar oportunidade para que pessoas com deficiência visual possam andar de bicicleta com segurança. As bikes foram customizadas pelo aposentado David Marcelo, que, além da mão da obra, doou algumas peças e horas de dedicação ao serviço. Orgulhoso, ele admira a alegria dos usuários do projeto, enquanto acerta alguns ajustes na correia e na altura do banco.
"De uns 12 anos pra cá comecei a mexer em bicicletas, mas não é uma profissão. Quando me falaram do projeto, aceitei na hora fazer as bicicletas, e se surgir novas oportunidades vou continuar fazendo", completa.
Enquanto as pessoas que não enxergam aproveitam o passeio na parte de trás da bicicleta, quem está no comando precisa de muita atenção e força para guiar. Os olhos de quem conduz são os olhos do caroneiro, que vai ouvindo os detalhes do percurso, acompanhando a descrição da paisagem e recebendo orientações sobre a hora de parar e descer da bike.
"A primeira vez eu estava realmente nervoso, mas foi tranquilo. Queremos convocar outras pessoas para participar do projeto como voluntários e ter essa sensação maravilhosa de conduzir alguém, de conversar com ele, traduzindo as suas sensações, é um privilégio", diz o voluntário André Roldão.
O projeto foi lançado oficialmente neste domingo, no Parque das Nações. Quinze cegos e cinco voluntários fizeram os passeios durante a tarde. As duas bicicletas adaptadas ficarão disponíveis para o uso de pessoas com deficiência visual, com o auxílio de condutores, durante todos os dias da semana.
Aventureiros, Toni e Delfino já pensam em participar de competições sobre duas rodasFoto: Caio Marcelo / Especial
"Sentimento de liberdade"
Ansioso para mais um teste na bicicleta antes do lançamento do projeto, o aposentado Antônio Carlos Nunes, 56 anos, há pelos menos 20 não sabia o que era pedalar, desde que perdeu a visão. Antes do acidente que o deixou cego, a bicicleta era o seu meio de transporte.
"Primeiro parece que você não vai ter equilíbrio, mas daí logo vem um sentimento de conquista e liberdade. Apesar de ter um condutor, é como se fosse a gente mesmo que estivesse conduzindo", resume.
O amigo Delfino da Rosa Cunha, 42 anos, que também perdeu a visão depois de adulto, também retomou as voltas de bicicleta a partir do projeto, e quer manter o hábito. Os dois são atletas de bocha, e já começam a vislumbrar competições na nova categoria, o ciclismo:
"Perguntam se eu tenho medo de cair, mas não tem problema. Até quem enxerga cai. É só levantar e tentar de novo."
Iniciativas pelo Estado promovem inclusão
O projeto em Criciúma é mais um dos espalhados pelo país e surgiu a partir da troca de ideias com outras iniciativas. Um desses projetos, Rodaguia, de Joinville, já compartilhou experiências com grupos de Blumenau, Florianópolis, Rio do Sul, Rio de Janeiro e Brasília. Segundo o presidente da Associação Joinvilense para Integração dos Deficientes Visuais (Ajidevi), Paulo Sérgio Suldovski, a ideia é levar o pedal inclusivo a todos os locais onde ele possa ser implantado.
"Hoje são onze bicicletas, duas delas para crianças, com o foco no fortalecimento dos vínculos com a família. Quem frequenta a associação pedala regularmente, mas também temos passeios externos em parceria com o movimento Pedala Joinville, participamos de pedais noturnos, mantendo a pessoa ativa no meio da sociedade", defende.
Em Florianópolis, o projeto Novos Horizontes leva para passeios de aventura pessoas com deficiência visual, sempre aos sábados, oferecendo novas sensações e compartilhando experiências. Com passeios pelo Centro de Blumenau, o projeto Novo Olhar, lançado pela Sociedade Cultural Amigos do Centro Braille e empresários, oferece atividades pelas ruas centrais aos domingos, também com o objetivo de integrar a bicicleta ao trânsito da cidade.
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