Uma bike, uma câmera e o desejo de saber o que a bicicleta significa na vida das pessoas. Essa é a ideia básica do projeto Transite – brasileir@s e suas bicicletas, do fotógrafo paulista Felipe Baenninger, de 28 anos.
Há cerca de três anos, ele saiu de São Paulo em direção a Porto Alegre, dando início à sua jornada sobre duas rodas pelo Brasil. O que seria, inicialmente, uma viagem por 17 estados, acabou virando um giro completo, e todo o material colhido no percurso será organizado em fotolivro com financiamento coletivo.
Nesta semana, Felipe chegou ao Ceará, o penúltimo estado desta viagem. Uma pesquisa prévia mostrou ao jovem que há grupos consolidados de ciclistas na capital cearense, novos empreendimentos voltados para bicicleta e ciclistas dispostos a pedalar sob sol ou chuva.
“Quando a cidade tem uma cultura muito fértil da bicicleta, é possível ver por contraste visual. Na sexta (22) caiu uma super chuva. Saí às 6h da manhã e vi bastante bike; alguns [ciclistas] até sem capa de chuva. Fortaleza merece estudos aprofundados sobre o uso da bicicleta, e isso vai mostrar como é grande esse uso pelas pessoas", analisa.
Ciclistas em Fortaleza
No sábado (23), a equipe da Agência Brasil acompanhou o fotógrafo numa pedalada pelo centro da cidade para colher depoimentos e tirar retratos de ciclistas.
Na Praça do Ferreira, um dos locais mais movimentados do centro, Paulo Soares de Freitas, de 34 anos, vende salgados e sucos usando uma bicicleta cargueira. Os produtos ficam em três isopores, sendo um na frente e dois na garupa. “A bicicleta é meu ganha-pão. Minha profissão depende dela”, disse ele. Ao ser questionado pelo fotógrafo sobre seu maior temor ao usar a bicicleta, Paulo respondeu que é o de tê-la apreendida pelos órgãos de fiscalização, como já aconteceu uma vez. “Eu trabalho assustado”, salientou.
Esse é um dos questionamentos de Felipe sobre o uso da bicicleta nas cidades: o que diz respeito às atitudes do poder público. Para ele, ao criar proibições e restrições, as administrações se eximem de responsabilidades.
"É difícil investir em informar e mostrar que existem possibilidades de convivência. Proibir é mais fácil, mas isso não impede que as pessoas continuem fazendo algo proibido. Se tem muita bike, tem uma demanda que pode ser observada para saber quais as necessidades dos ciclistas. Mais do que um incômodo para o poder público, essas pessoas precisam ser cuidadas. Ali está o cidadão: uma hora ele está na bike, outra, a pé, outra, no ônibus”, desabafou.
A pressão popular levou algumas cidades a promover mudanças significativas, como por exemplo Rio Branco, no Acre. “Lá, com a preocupação de como será a cidade daqui a alguns anos, fizeram uma série de ações para melhorar a locomoção de bicicleta e a pé". Segundo Felipe, as ciclovias em Rio Branco estão espalhadas pela cidade inteira, e são maiores do que em muitas cidades maiores. "A cultura se multiplicou. Pegar uma bicicleta para se locomover em Rio Branco se tornou algo natural”, conclui.
Exemplo deve vir daqui
A partir desse tipo de experiências, o fotógrafo defende que é possível criar soluções próprias e criativas para estimular o uso da bicicleta sem que seja necessário olhar para exemplos estrangeiros. “Esses exemplos são positivos e servem para engrandecer o debate. O que vejo, porém, é utilizarem as cidades cicláveis da Europa, ou medidas tomadas nos EUA, como diminuição do que é feito aqui. Não somos iguais a eles, temos outras necessidades, nossos contextos geográficos são outros, temos clima tropical. Há muito o que pensar de dentro para dentro”, acrescentou.
Projeto Transite
Felipe planejou o projeto "Transite - brasileir@s e suas bicicletas" por dois anos e meio antes de começar a rodar pelo Brasil. Antes, ele se inspirou no documentário Bycicle Portraits, encampado por dois fotógrafos que viajaram pela África do Sul, conhecendo o sentimento das pessoas por suas bicicletas. E teve, como motivação, a própria relação com sua magrela.
“Comecei a andar à noite, como lazer, com um sentimento de liberdade dentro de uma cidade tão opressora e veloz como São Paulo. Isso veio culminar com o contato com pessoas que já andavam de bicicleta na cidade e, com elas, percebi resistências ao modo vigente de fazer as coisas. Dado o panorama mundial do uso dos recursos naturais, a bicicleta significa, para mim, mudanças na saúde, na mente e no relacionamento com as pessoas”, ressaltou.
De Fortaleza, Felipe planeja ir à cidade de Limoeiro do Norte – a 200 km da capital – considerada a terra das bicicletas, por ter uma proporção estimada de uma bicicleta para cada habitante. De lá, ele segue para o Piauí, último destino do projeto.
Fotos e informações sobre os destinos já percorridos e sobre o financiamento do projeto podem ser acessadas no endereço projetotransite.com.br.
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