Anunciada pela Prefeitura no começo de setembro, a ciclovia da Av. Paulista deve começar a ser construída em janeiro e ser entregue até julho de 2015. Antes disso, o debate sobre o projeto foi aberto à sociedade na audiência pública realizada na Câmara Municipal de São Paulo na noite de quinta-feira (6) diante de um auditório lotado de ciclistas, populares e representantes de entidades civis.
Antes contrário à implementação da ciclovia na Avenida Paulista, o vereador Andrea Matarazzo (PSDB), presidente da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente da Casa, abriu a sessão afirmando estar satisfeito com o projeto, que segundo ele teria resolvido as questões que levantou relativas ao trânsito de pedestres. Além de Matarazzo, a mesa foi composta pelos vereadores Police Neto (PSD), Nabil Bonduki (PT), pelo diretor de planejamento e educação no trânsito da CET, Tadeu Leite Duarte e pela coordenadora da Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico e vice-presidente do Condephaat, a arquiteta Valéria Rossi Domingues.
A obra tem gerado controvérsias principalmente com setores mais conservadores da Câmara e da sociedade, o que torna importante a realização da audiência pública. O evento desta quinta-feira (6) contou com a presença de integrantes da Ciclocidade e do Vá de Bike, da jornalista e arquiteta Renata Falzoni (Bike é Legal), Thiago Benicchio (ITDP), Aline Cavalcante (oGangorra), muitos outros ativistas e grande público, com a cobertura do Mobilize Brasil. Também estiveram presentes membros da CMTC, Paulista Viva, FGV e moradores do entorno da avenida. Após apresentação do projeto por parte do diretor da CET, os inscritos puderam fazer o uso da palavra, com elogios, críticas e dúvidas a respeito do projeto.
Duarte reafirmou o compromisso de iniciar as obras em janeiro de 2015, com expectativa máxima de 6 meses a partir dali para sua conclusão, prazo que pode cair pela metade se não houver contratempos no andamento do processo. A arquiteta do Condephaat, por sua vez, garantiu que a proposta será apreciada pelo órgão com destaque na pauta no dia 17/11 e que tecnicamente as solicitações de documento enviado pela organização Paulista Viva já foram atendidas. Segundo Antonio Carlos Franchini Ribeiro, presidente dessa associação, a cidade corre o risco de se tornar sectária e, sem apresentar a fonte dos números, revelou que a construção de ciclovias estaria comprometendo cerca de 20% do leito carroçavel no município. A Paulista Viva tem se posicionado sistematicamente contra a criação da ciclovia, pedindo detalhes técnicos e todo tipo de documentação possível para impedir ou postergar as obras.
Vereadores, ativistas e munícipes apreciam o projeto da ciclovia da avenida Paulista Foto: Du Dias/Mobilize Brasil
Planejamento e menos velocidade
Em outra esfera de pensamento, o diretor da Ciclocidade, Gabriel Di Piero, defendeu inflamadamente a implementação em carácter de urgência da nova ciclovia. “Muitos falam que as ciclovias estão sendo feitas sem planejamento, mas na minha opinião, perder vidas é que é falta de planejamento. É preciso reduzir as velocidades de tráfego na cidade e é fundamental que a Paulista receba a estrutura cicloviária”, disse.
Não foram poucos aqueles que fizeram uso da palavra para lembrar dos ciclistas brutalmente mortos na avenida, que, segundo Willian Cruz (Vá de Bike), carrega o triste rótulo de avenida com maior número de acidentes por quilêmetro envolvendo ciclistas. “Estatísticas de acidentes e mortes descaracterizam muito mais um cartão postal da cidade do que uma ciclovia”, afirmou Cruz.
O consultor em mobilidade urbana, Daniel Guth, e a ativista Renata Falzoni afirmaram que a avenida tem todas as características para o uso dos ciclistas. Segundo Guth existe hoje uma demanda real na avenida de cerca de mil ciclistas por dia, número que avançaria significativamente com a construção da via exclusiva. “A implementação de ciclovias é um processo de equidade”, defendeu Guth. Já Falzoni destacou a importância de privilegiar quem usa a sua própria força para se deslocar, que deve ter os caminhos encurtados. “Precisamos focar nosso trabalho na parte mais orgânica das cidades”, defendeu a fotógrafa e jornalista.
Houve ainda quem aproveitasse a audiência para apontar os problemas em ciclovias já executadas, como forma de contribuir para o melhor planejamento tanto da ciclovia da Paulista como das outras que virão. Ao representante da CET foi feito o pedido de se repensar, por exemplo, o uso de tinta vermelha sobre o asfalto, que logo desbota e descasca. Outra falha técnica, esta grave, denunciada por moradores de ruas onde foram implantadas ciclovias é a não observação, no projeto, de galerias para escoamento das águas junto às sarjetas. Estes locais, por onde passam as bicicletas e são lindeiros às calçadas, ficarão intransitáveis após as chuvas, disseram. Um morador do bairro do Ipiranga, na zona sul, queixou-se do trajeto escolhido para a instalação a ciclovia, segundo ele cheio de altos e baixos, enquanto verificou a existência de paralelas ideais à passagem de bicicletas, com vantagens como serem vias planas, mais amplas e calmas.
Numa das falas mais emocionantes da noite, o munícipe Clemente Gauer, pediu a todos que fizessem um minuto de silêncio em homenagem às vidas subtraídas pela ausência de uma estrutura para bicicletas na avenida. Gauer ressaltou que “em oposição às obras viárias que tem como intuito diminuir o tempo de deslocamento do ponto A ao B, como as grandes avenidas, pontes e viadutos, as ciclovias trazem outro paradigma, de ode à vida e contato mais íntimo com a cidade". Em seguida, sugeriu batizar a ciclovia com os nomes de Marcia Prado, Julliana Dias, Marlon Moreira e David Santos, para que não sejam esquecidos” ressaltou.
Clique no link e veja o projeto de ciclovia na Paulista.
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