Programadas para começar em agosto passado, as obras de requalificação da Avenida Rio Branco, no Bairro do Recife, ainda não saíram do papel. A via está fechada para circulação de veículos desde fevereiro, logo após anúncio da Prefeitura sobre projeto de transformar o local em uso prioritário para pedestre, com arborização, embutimento de fiação, retirada de mobiliário urbano e outras intervenções.
Comerciantes do local estão frustrados com o atraso. Enquanto isso, lojistas que trabalham no Centro aguardam o fechamento de outras ruas, ação também prometida pela gestão municipal. Por iniciativa própria, alguns já colocaram cones e até um banco para evitar estacionamento em frente aos seus estabelecimentos.
Quando o modelo conceitual do Passeio Rio Branco foi anunciado, em 20 de fevereiro, o prefeito Geraldo Julio informou que ele ainda iria virar projeto executivo a ser contratado, por licitação, a partir de junho. O início da obra deveria ter começado em agosto, com previsão para ser concluída em dezembro deste ano. A avenida foi a primeira a ser fechada para pedestre pela atual gestão. A ideia é transformá-la na extensão da Praça do Marco Zero, um dos principais pontos turísticos da capital pernambucana.
Após o anúncio, o G1 foi ao Recife Antigo ouvir comerciantes e pedestre sobre a ideia, que foi bem recebida pela maioria. O vendedor André Souza, que trabalhava em um quiosque de caldo de cana, foi um dos que tinha boas expectativas com o projeto, apostando que as vendas aumentariam durante a semana, como já ocorre aos sábados e domingos.
Ele foi ouvido novamente na última quarta (24) pela reportagem, e o tom da conversa mudou. "O movimento caiu 80%, e duvido que isso ainda saia este ano, pois vem aí as eleições, depois Natal. Estou pensando até em sair daqui, já que o meu chefe está tendo prejuízo", comentou.
Já comerciante Ozael Medeiros ainda está otimista. Ele abriu uma sorveteria na Rio Branco há cerca de um mês, apostando na requalificação do Recife Antigo. "Eu acho que a Prefeitura está perdendo tempo em dar um bom destino a esta área pública. O movimento é bom aos domingos, mas e no resto da semana? Procurei algumas secretarias e me informaram que a obra só deve começar depois do Carnaval", disse.
Em nota, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Planejamento informou que o cronograma "permanece conforme anunciado", ou seja, com conclusão para dezembro. O órgão explicou que a Prefeitura já possuía um contrato que contempla outros tipos de intervenções na cidade, mas, por conta da especificidade das obras na Avenida Rio Branco, foi necessário realizar licitação para atender exclusivamente a esta demanda.
Assim, de acordo com a secretaria, a contratação para inicio das obras será realizada após a conclusão do projeto executivo, previsto para o fim de outubro. O projeto prevê a restauração das calçadas, mantendo a característica original, o embutimento da fiação elétrica e a transformação do passeio público em um espaço destinado à circulação de pedestres e modais não motorizados.
Segundo o projeto, a via será elevada à altura das calçadas, se estendendo até a Praça do Marco Zero e promovendo a integração desses ambientes. Ao final da execução, a Rio Branco contará com postes de iluminação, quiosques padronizados, bancos públicos, espaços de convivência com a vegetação e nova arborização.
Fechamento de outras vias
Em fevereiro deste ano, o prefeito Geraldo Julio também informou que estava estudando o fechamento de outras ruas, em locais no Centro da cidade. Seguindo a dica do arquiteto Pedro Guedes, o G1 encontrou comerciantes na Rua São José do Ribamar, no bairro de São José, que isolaram a frente das lojas por conta própria para evitar que veículos estacionem. Eles colocaram cones, cabos de ferro, jarros e até um banco na via. O mesmo ocorre na Rua de Santa Rita, paralela à Ribamar.
Banco colocado em frente à loja na Rua São José do Ribamar; à direita, cones impedem estacionamento de carros, motos e caminhões na Rua de Santa Ria (Foto: Luna Markman/G1)
Nenhum dos entrevistados quis se identificar temendo represálias contra a iniciativa. Todos afirmaram que os veículos atrapalham a circulação dos clientes e até impedem que os pedestres visualizem as vitrines. As amigas Josélia Oliveira e Valderez Calado concordam. "Você anda por essas ruas estreitas com dificuldade. Acho que sem carros ficaria mais cômodo para nós", opinou Josélia. "Você já enfrenta um trânsito para chegar aqui, e ainda tem que disputar espaço nessas ruas pequenas. É terrível", complementou Valderez.
Por outro lado, o G1 ouviu alguns ambulantes que usam o próprio carro para comercializar seus produtos. Eles não apoiam o fechamento das ruas. Sem identificar-se, um ambulante afirmou que estaciona o carro em frente a uma loja na Rua de Santa Rita, em concordância com o dono do estabelecimento. "Vai ficar muita gente desempregada se isso ocorrer", disse.
Para o arquiteto e urbanista Pedro Guedes, o fechamento de vias no Centro da cidade iria valorizar o comércio. "Faria com que os pedestres gostassem mais de passear por ali. O grosso das pessoas compra no Centro, não nos shoppings", disse.
Sobre o Passeio Rio Branco, Guedes aponta que já houve mudança no comportamento da população. Ele cita, por exemplo, que ocorre toda segunda-feira uma pelada no local. Restaurantes estão colocando mesas na calçada. Estudantes de uma escola pública de referência do Porto Digital também usam o espaço para escutar música. "Você vê que a área já está ficando mais valorizada. A Prefeitura tem que parar com o discurso e fazer mesmo uma cidade para as pessoas", pontuou.
Em resposta, a Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Urbano informou que "a Prefeitura do Recife está desenvolvendo projetos que ainda não foram finalizados, devendo ser anunciados tão logo sejam concluídos".
Ambulantes que usam carros para vender produtos temem fechamento de ruas (Foto: Luna Markman/G1)
Pátio em frente à Igreja de São José do Ribamar virou estacionamento para carros (Foto: Luna Markman/G1)