Hong Kong é tão maravilhosa que lembra o Rio de Janeiro. Situada na costa sul da China, banhada pelo Oceano Pacífico, a cidade tem uma geografia linda e difícil, com faixas de terreno plano espremidas entre praias e montanhas arborizadas. Tão distante da Linha do Equador quanto o Caribe, tem clima agradável o ano todo. No verão, a temperatura fica na faixa de 30 graus. No inverno, raramente baixa dos 15 graus. Hong Kong é tão pujante que também lembra São Paulo. É uma metrópole com PIB cerca de 25% superior ao da capital paulista.
Com lazer e beleza cariocas e uma riqueza de dar inveja a paulistanos, a cidade chinesa foi escolhida pela revista britânica The Economist a melhor do mundo para viver, em 2012. A eleição de Hong Kong sugere que beleza natural e economia pujante são importantes para a qualidade de vida. Isoladamente, porém, nenhum dos dois fatores faz de uma cidade um lugar excepcional para viver. Com perfis que lembram várias características de Hong Kong, as duas capitais brasileiras listadas no ranking saíram-se mal. São Paulo ficou em 36º lugar, e o Rio de Janeiro em 42o lugar. Ambas ficaram atrás de capitais latino-americanas como Buenos Aires, na Argentina (26ª posição), Santiago, no Chile (31ª), e Lima, no Peru (35ª).
Parte da distância que separa Hong Kong das maiores capitais brasileiras no ranking se explica pelo êxito da cidade chinesa na gestão do espaço público e na aplicação de políticas de mobilidade. Hong Kong transformou um aparente problema – extremo adensamento urbano – em vantagem. Eis alguns exemplos positivos oferecidos pela melhor cidade do mundo:
Gestão do espaço
Hong Kong tem área 7% menor que o Rio de Janeiro e população 11% maior. Em vez de permitir a ocupação dispersa do ter-ritório, como faz o Rio, Hong Kong restringe drasticamente a ocupação do solo. Somente um quarto do espaço da ilha é habitado. Como resultado, a densidade demográfica na cidade é das mais altas do mundo. Chega a 44.700 habitantes por quilômetro quadrado, na Ilha de Kowloon.
O bairro de Copacabana, no Rio, registra 35.858 habitantes por quilômetro quadrado. Para abrigar uma população crescente, Hong Kong cresce para cima. “O governo não libera a construção em regiões periféricas”, afirma o holandês Stefan Al, professor de planejamento urbano da Universidade de Hong Kong. A cidade tem a maior quantidade de arranha-céus do mundo: 1.224, mais que o dobro de Nova York, nos Estados Unidos, a segunda colocada.
Ao restringir a extensão da cidade, Hong Kong não desperdiça recursos com saneamento, eletrificação e pavimentação de áreas distantes. Investe em dar maior eficiência à infraestrutura existente. Graças à grande concentração espacial, tudo em Hong Kong está perto para todos – inclusive o contato com a natureza. A cidade é rodeada por parques e reservas naturais, que correspondem a 38% de sua área total. “Qualquer morador chega à praia ou a um parque em menos de 20 minutos”, afirma Al.
Gestão da mobilidade
A população de São Paulo é 36% maior que a de Hong Kong. Mas São Paulo tem 6 milhões de carros particulares, ante 435 mil. A explicação está na qualidade do transporte coletivo. A rede de transporte de Hong Kong é usada por 90% da população. A adesão nas capitais brasileiras é de 65%, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “O transporte público daqui é uma coisa de outro mundo. Os carros não fazem falta”, diz Maurício Alvarenga, empresário de comércio internacional que mora em Hong Kong há 11 anos.
Hong Kong tem ônibus pequenos, médios e grandes, trens, metrôs, bondes e balsas. Apesar de intensamente usados, em 12 milhões de jornadas por dia, eles têm conservação impecável. A higiene é obsessão na cidade, que sofreu dois surtos de gripe aviária nos últimos 100 anos. É padrão limpar lugares onde o público encosta as mãos, como botões de elevador, seis vezes ao dia.
Além de limpo, o transporte é barato. Uma passagem de bonde ou balsa custa cerca de R$ 0,50. As passagens de metrô variam entre R$ 1 e R$ 5, conforme dia, horário, deslocamento e perfil social do viajante. A cobrança variável é possível graças ao uso de um cartão pré-pago, chamado Octopus. Ele também é aceito como meio de pagamento em supermercados, restaurantes, máquinas de refrigerante e lojas de conveniência. É onipresente nas carteiras dos honcongueses.
Mais do que administrar o transporte, o que se faz em Hong Kong é zelar pela mobilidade. Mesmo o hábito de andar a pé é alvo de planejamento e incentivo. Para os dias de calor, há passarelas equipadas com ar-condicionado. Para o pedestre vencer as ladeiras – a topografia é acidentada como em São Paulo –, há escadas e esteiras rolantes, como num aeroporto. É de Hong Kong a maior escada rolante a céu aberto do mundo, no bairro Soho, perto do centro. A Mid Levels Escalator tem 20 escadas rolantes que somam 800 metros de extensão. Para vencer um desnível de 135 metros, basta ao pedestre subir nas escadas e esperar 20 minutos. De graça e sem esforço.
Ambiente de negócios
Além da mobilidade, a cidade privilegia o empreendedorismo. Em Hong Kong, é possível abrir uma empresa em um dia, pela internet. A tributação é simples, e os impostos são baixos pelos padrões internacionais: 16,5% para companhias e 15% para salários. “Minha empresa tem mais de 600 funcionários. Só preciso de cinco contadores”, diz Alvarenga. “Aqui as regras são claras.” Segundo o Banco Mundial, Hong Kong é o segundo melhor lugar para fazer negócios no mundo. O estudo leva em conta diversos fatores, até o tempo para conseguir ligação à rede de energia elétrica ou alvarás de construção civil.
A reputação comercial de Hong Kong foi construída com o tempo. No século XIX, ela foi tomada do Império Chinês pelos britânicos, após a Guerra do Ópio (1839-1842). Tornou-se um porto livre. Voltou a fazer parte da China em 1997, com leis e administração independentes. Converteu-se na porta de entrada das empresas ocidentais para o maior mercado do mundo.
Para facilitar a entrada de turistas e trabalhadores, Hong Kong tem 122 consulados. Cidadãos de 170 países não precisam de visto para ficar até seis meses. Dos 100 maiores bancos do mundo, 73 têm agência lá. Por comparação, São Paulo tem apenas 17. O aeroporto internacional de Hong Kong é considerado o terceiro melhor do planeta, segundo a consultoria Skytrax. Os aero-portos de Rio de Janeiro e São Paulo nem sequer figuram entre os 100 melhores.
De acordo com o Departamento de Imigração de Hong Kong, 407 brasileiros moram na cidade. Um número baixo, que qua-druplicou nos últimos dez anos. A maioria vai para Hong Kong tentar a sorte nos negócios, criando uma companhia nova ou abrindo uma filial na Ásia. A cidade está a distâncias que variam de três a cinco horas de voo de capitais como Seul, Tóquio ou Pequim – no coração da região econômica mais dinâmica do mundo.
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