A isenção de impostos federais para o transporte coletivo, que permitiu um reajuste abaixo da inflação das tarifas de ônibus, trem e metrô, ou seja, a redução do valor real da passagem, pode representar uma inflexão importante na política de mobilidade no país.
Em São Paulo, se fosse aplicado o índice de inflação desde o último reajuste e a prefeitura não subsidiasse a tarifa, ela alcançaria R$ 4,13. Com o subsídio municipal, seria R$ 3,43. A isenção federal possibilitou uma redução de 6,71% na tarifa, fixando os R$ 3,20 adotados. Embora esse valor pese significativamente no bolso do trabalhador de baixa renda para um transporte de qualidade sofrível, a situação poderia ser pior caso essa medida não tivesse sido tomada.
O governo federal, preocupado com o nível de emprego na indústria automobilística, vinha privilegiando apenas a redução dos impostos dos carros, estimulando seu consumo. A nova postura, resultado da interlocução do prefeito Fernando Haddad com a presidenta Dilma, poderá representar, se tiver continuidade, em um ponto de inflexão importante para estimular o transporte coletivo.
É necessário estabelecer mecanismos para transferir recursos do uso do automóvel para o transporte coletivo, como, por exemplo, taxar mais fortemente os modelos de luxo e cobrar a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) sobre os combustíveis para financiar obras de mobilidade sustentável. Entre elas, a construção de novas linhas de metrô, BRT e corredores de ônibus, a implantação de ciclovias, a recuperação de calçadas e a melhoria nas transferências intermodais, pois bons acessos para os pedestres são fundamentais para o uso do transporte coletivo.
Não se trata de impedir o consumo do carro, mas estimular seu uso racional e sustentável. A melhoria do transporte coletivo --com mais eficiência, conforto, rapidez e redução do custo-- é a melhor forma de limitar o uso do automóvel nos deslocamentos urbanos cotidianos, com impacto positivo no trânsito.
Em São Paulo, uma maior redução na tarifa exige, por um lado, rigor na aferição dos custos das empresas de ônibus e, por outro, ganho de eficiência do sistema. Isso deverá ocorrer nos próximos anos, com a implantação de 150 quilômetros de corredores de ônibus e outro tanto de faixas exclusivas, conforme o plano de metas de Haddad.
A implantação do Bilhete Único Mensal, a partir de novembro, compromisso de campanha do prefeito, será fundamental para garantir o direito ao transporte coletivo e à própria cidade. Com esse bilhete, o cidadão poderá usar os ônibus quantas vezes precisar durante todo o mês, pagando o equivalente a duas passagens diárias nos dias úteis, ou seja, por volta de R$ 147 por mês --os estudantes pagarão a metade do valor. O governo estadual precisa se integrar à proposta, incluindo o metrô e os trens metropolitanos no Bilhete Único Mensal.
Com ele, os trabalhadores que recebem vale-transporte ou passagens pagas pelo empregador poderão se deslocar para qualquer outra atividade sem custo adicional, ganhando o direito de circular gratuitamente para o lazer, a qualificação profissional e os encontros familiares e sociais.
A oferta qualificada de transporte noturno e nos fins de semana, que também está programada, representará um benefício enorme para a juventude e trabalhadores que realizam atividades fora dos horários convencionais.
A redução do custo do transporte coletivo é essencial para que as passagens pesem menos no bolso do usuário. Isso exige maiores investimentos em corredores de ônibus, a reorganização das linhas, maior eficiência do sistema e controle social dos custos das empresas para reduzir gorduras que encarecem o valor das passagens.
*Nabil Bonduki é doutor em estruturas ambientais urbanas, professor titular da FAU/USP e vereador em São Paulo pelo PT