Quando surge a notícia da construção de um novo anel viário, sempre aparecem opiniões favoráveis a esse tipo de intervenção e contra, seja pelo impacto urbanístico, seja pelo montante de recursos destinado a uma obra que favorece o transporte individual. Existem os anéis viários urbanos e os anéis rodoviários, que comportam o trânsito local ou de longa distância, cada um com diferentes necessidades e diferentes cuidados. Quais seriam os critérios que eles devem seguir para trazer melhorias de fato? Mesmo havendo estudos de tráfego, estudos ambientais e planejamento urbano, sua construção ainda traz polêmica. Afinal, anéis viários são uma solução para o trânsito?
Os anéis viários desafogam o tráfego por curto espaço de tempo.
Soluções como a não degradação da região, a readequação da lei de uso e ocupação do solo, um desenho amigável da via e de seus equipamentos e a estruturação de transporte coletivo de qualidade podem ensejar maior durabilidade e eficiência dessas vias. Os anéis podem responder
de forma eficiente do ponto de vista do trânsito e, fundamentalmente, da mobilidade e qualidade urbana, mas é preciso: projetar vias laterais de trânsito local, para separá-lo do trânsito de longa distância; criar vias de passagem, na quantidade e no desenho adequados para minimizar a secção urbana gerada pela sua construção; dotar a via de transporte coletivo de qualidade e de ciclovia; e criar uma urbanização com arborização e equipamentos de comunicação modernos.
Teodomiro Diniz Camargos
Engenheiro, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG)
Anéis viários não desafogam o trânsito de forma permanente.
Não existe solução permanente para o trânsito, ainda mais quando o País decide estimular a compra e o uso do automóvel em nossas cidades. Rodovias e anéis viários muitas vezes, logo após sua inauguração, já estão engarrafados e saturados. A solução para o trânsito são menos carros nas ruas, mais investimentos em transporte público de alta capacidade, transportes não motorizados - como bicicleta - e um desenvolvimento orientado pelo transporte (tradução da sigla TOD - transit oriented development). A Lei Nacional de Mobilidade Urbana (Lei 12.587), aprovada no ano passado, gera uma ótima oportunidade para que o poder público, as empresas do setor e a sociedade reflitam sobre o planejamento urbano sustentável das cidades brasileiras para as próximas décadas.
Pedro Torres
Gerente de desenvolvimento urbano sustentável no ITDP Brasil
Existe o anel viário urbano, que "protege" determinada área com forte atração de viagens do fluxo de passagem, e o anel rodoviário, que separa o tráfego rodoviário do tráfego urbano.
No primeiro, a solução será de longo prazo se for considerada em projeto a máxima ocupação permitida para o uso do solo na área protegida. Já no segundo caso, a solução se manterá enquanto os conflitos com o tráfego urbano não forem significativos. Contudo, com o crescimento das cidades, os anéis rodoviários passam a ser utilizados pelo tráfego urbano, perdendo sua função original, prejudicando a fluidez e ocasionando acidentes. Essa situação requer a construção de um novo anel rodoviário ou de vias de contorno. O mais importante, entretanto, é procurar conciliar as políticas de expansão urbana com o sistema viário estruturante, garantindo a correta destinação do uso do solo e a minimização dos conflitos nas interseções, com os transportes não motorizados e pedestres.
Rone Evaldo Barbosa, engenheiro civil, conselheiro do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), analista de infraestrutura do Ministério dos Transportes e professor da Universidade Estadual de Goiás
A pergunta anuncia a sua resposta e a sua negação.
Transitar é circular, por função econômica ou por deleite, de forma caótica ou planejada. Esse deslocamento move pessoas, bens e informações, em dimensões globais. Vias de transporte que reduzem os tempos das viagens e do retorno do capital têm sido um dos desejos da engenharia moderna, e controlar essas vias, suas velocidades e seus pontos de partida e chegada é controlar a economia e sua outra face, a disputa entre empresas e nações. Os anéis viários almejam um trânsito sem atrito, onde as coisas e as pessoas efetuam mais movimentos em tempos mais curtos; são círculos que contêm uma parte mas separam outros, são dispositivos que aceleram veículos mas impedem caminhos, alternativas e diálogos. Nos muitos tempos e lugares da metrópole, impossível uma solução de mobilidade definitiva que satisfaça a todos, seus múltiplos desejos e particulares posições. Não se pode ganhar tudo ou para sempre.
Kleber Frizzera
Arquiteto, professor do departamento de arquitetura e urbanismo na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), secretário de Desenvolvimento de Vitória-ES entre 2005 e 2012
Solução permanente em matéria de trânsito, é bem improvável.
Há que se considerar o anel viário como uma alternativa a mais, principalmente em regiões metropolitanas densamente povoadas e com várias rodovias de acesso, de forma a evitar que os veículos que não têm origem ou destino na cidade precisem utilizar o sistema viário local. Entretanto, sempre é necessário considerar seriamente a relação custo-benefício nas dimensões financeira e socioambiental, com as devidas compensações sociais e ambientais diante dos impactos inevitáveis. Além disso, é fundamental garantir os instrumentos democráticos para ouvir as populações atingidas. Por outro lado, há que se frisar que a melhor solução para o trânsito das grandes cidades é o transporte coletivo eficiente, confortável e rápido. Para isso ocorrer, são necessários vias expressas para os ônibus (BRTs), transporte sobre trilhos (metrô, trem, VLT) e um sistema cicloviário integrado a todos os terminais dos outros modais.
Maurício Broinizi Pereira
Coordenador da Secretaria Executiva da Rede Nossa São Paulo, secretário executivo da Rede Brasileira por Cidades Justas e Sustentáveis
Não existe uma única ferramenta que desafogue de forma definitiva e permanente o tráfego urbano.
Os anéis viários propiciam rotas alternativas, direcionando parte do tráfego para circulação em sentido anelar, especialmente a circulação de média e longa distância. Esse efeito alivia vias radiais, ajudando a distribuir e organizar o fluxo de veículos no interior da mancha urbana. Um elemento importante é diferenciar anéis viários urbanos dos anéis rodoviários, como o Rodoanel Mário Covas, em São Paulo, que se destina a organizar o tráfego de passagem, impedindo que este dispute vias com o tráfego interno. Nele, os acessos são controlados e acontecem por meio das rodovias interceptadas, a faixa de domínio já comporta o crescimento futuro da via, e a operação pedagiada desestimula o uso da infraestrutura em deslocamentos locais. Outra característica essencial à eficácia dos anéis viários é a qualidade de suas conexões. As vias que recebem o fluxo precisam ter a capacidade de dar vazão ao tráfego recebido, sob pena se verem convertidas em novos gargalos.
Laurence Casagrande
Presidente da Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa)