Sem o bonde como ‘marca-passo’, veículos pisam no acelerador e fazem das calçadas estacionamento. Custo de vida no bairro subiu.
Um ano e três meses depois do acidente que matou o motorneiro Nelson Correa da Silva e cinco passageiros, a ausência do bonde em Santa Teresa, que fazia ligação com o Centro, acelerou a desordem urbana no bairro e encareceu a vida dos moradores. Vias estreitas e curvas dão passagem a ônibus em velocidade alta e carros tomam as calçadas como estacionamento. Quem vive lá reclama da falta de fiscalização.
O professor de matemática Vassili Caetano Marins, morador da Rua Joaquim Murtinho, afirma que os motoristas de coletivos têm abusado da imprudência. “Como a maioria das ruas são ladeiras, eles só descem de pé embaixo”, alerta. A Guarda Municipal diz estar atenta ao problema e que, ao longo do ano, já multou 722 motoristas por diversas infrações cometidas nas principais ruas do bairro, entre elas excesso de velocidade e estacionamento em locais proibidos. Pede que a população denuncie irregularidades para a Central 1746 da prefeitura. Já a Secretaria Municipal de Transportes informa que está em licitação a compra de novos radares de controle de velocidade para o bairro.
“O bonde era o marca-passo do bairro”, define o diretor de Transportes da Associação de Moradores de Santa Teresa, Jacques Schwarzstein, morador da Rua Almirante Alexandrino. E explica: “Além de limitar a velocidade dos veículos, definia os espaços onde era possível estacionar ou não. Agora, como sabem que não há o risco de sofrerem danos com a passagem do bonde, os motoristas estacionam onde bem entendem. No fim de semana, aqui vira um inferno”, diz.
A ausência do bonde estourou no bolso do trabalhador. Jorge Siqueira da Silva, 65 anos, gasta agora 4,5 vezes mais por mês para ir e voltar do trabalho todo dia. Ele é usuário do bonde desde criança: aos 8 anos viajou pela primeira vez para ir à escola; a partir dos 18, para trabalhar na construção civil, atividade que exerce até hoje.
Subsidiada pelo governo do estado, a tarifa do bonde até o ano passado era de R$ 0,60. Jorge gastava R$ 7,20 por semana e R$ 28,80 mensais. Depois do acidente, viu-se obrigado a andar de ônibus, cuja tarifa é de R$ 2,75. Gasta R$ 33 por semana e R$ 132 mensais. Isso representa uma diferença de R$ 104,20 mensais em seu orçamento. “Estou pagando quatro vezes mais para fazer o mesmo percurso. É um absurdo”.
Presidente da Companhia Estadual de Engenharia de Transportes e Logística (Central), Eduardo Macedo promete que o bonde voltará a circular “em meados de 2014”.
Acesso único e assento para 24 pessoas
Quando voltar a funcionar, em 2014, o bonde será outro. Por medida de segurança, o estribo será recolhido, impedindo que passageiros viajem do lado de fora, e o acesso será por entrada única, do lado da calçada. “Era pelos dois lados, muito perigoso”, comenta Eduardo Macedo.
Haverá lugar para 24 passageiros sentados, e não mais 40. As laterais serão fechadas até a metade, motores e sistema de frenagem serão controlados por computador e o deslocamento dos carros, monitorado por GPS. Os 17 km de trilhos serão trocados, e o novo percurso será do Largo da Carioca até o Silvestre, onde se conectará com o trenzinho do Corcovado. “Estão fazendo um bonde para turistas, não para moradores”, protesta o historiador Álvaro Braga, presidente de uma das várias associações de moradores do bairro.
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