O legado da Copa do Mundo de 2014 para a mobilidade urbana foi discutido ontem (30), em Brasília, durante o Seminário Mobilidade e Acessibilidade Humana, no Instituto de Ensino Superior de Brasília (IESB). Especialistas e representantes do governo do Distrito Federal debateram as melhores formas de aproveitar os investimentos provenientes do evento esportivo.
A pesquisadora do Observatório de Metrópoles e representante do Transporte Ativo, Renata Florentino, questionou o real benefício a ser trazido pela Copa do Mundo. De acordo com ela, os projetos apresentados para a área de mobilidade continuam priorizando os carros, e não foram pensados para valorizar a convivência humana. “Olhando os projetos, dá para ver que muito asfalto está sendo criado, pouco está sendo investido em trilhos e os veículos não-motorizados parecem que nem contam”, criticou.
Renata recriminou a implantação dos Bus Rapid Transit (BRTs) que estão sendo construídos em várias cidades-sede. “Na verdade, os BRTs estão abrindo mais espaço para os carros. Estamos tirando os ônibus da frente dos automóveis individuais, restringindo-os a apenas uma faixa e deixando outras três ou quatro livres para os carros. Isso não incentiva ninguém a deixar o veículo em casa e andar de ônibus, muito pelo contrário”, justificou.
A pesquisadora citou o exemplo da Transoeste, no Rio de Janeiro, onde, no intervalo de quatro meses, cinco pessoas morreram. Ela atribui as mortes à alta velocidade dos ônibus e à ausência de uma travessia de pedestres adequada. “Temos que nos questionar se os meios de transporte que estão sendo criados serão mesmo mais confortáveis, seguros e baratos. Se a resposta for negativa, estaremos apenas endividando os nossos estados e não resolvendo o problema”, concluiu Renata.
Um problema a mais para Brasília
O técnico de planejamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Carlos Carvalho, e o diretor do Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans), Marco Antonio Campanella, lembraram um problema específico da capital federal, que é a concentração das atividades econômicas no centro da cidade.
Estima-se que cerca de 500 mil pessoas se desloquem diariamente das cidades-satélites para a região central de Brasília para trabalhar e estudar. Esse fluxo dificulta ainda mais a busca de soluções para o transporte coletivo do DF. Se as oportunidades de emprego estivessem mais espalhadas pela região, os deslocamentos seriam menores e, consequentemente, as soluções em transporte urbano mais simples.
Carvalho defende que o próprio transporte é, por si só, uma ferramenta de potencialidade econômica. “Se levamos transporte de qualidade, há mais geração de emprego e de renda, o que começa a atrair as pessoas para outras regiões”, esclareceu.
Já o diretor do DFTrans anunciou que o governo tem projetos de criar quatro centros econômicos em variadas áreas do DF, justamente para espalhar as oportunidades de emprego pela região. Campanella reconheceu que Brasília sofre com problemas crônicos na área de mobilidade urbana, mas defendeu que eles serão resolvidos com integração entre os diversos modos, como ônibus, bicicletas e trens.