Enquanto a medida pretende conscientizar os condutores e diminuir o número de atropelamentos, cicloativistas reclamam da infraestrutura precária para as bicicletas e da má educação entre os que dividem as mesmas ruas. As estatísticas apontam que quase um ciclista morre em acidentes na metrópole por semana.
"O que mais dificulta a vida do ciclista em São Paulo é o comportamento dos motoristas. O objetivo da fiscalização não é punir, mas tornar o trânsito mais seguro", diz o cicloativista Willian Cruz. O analista de sistemas pedala todos os dias até o trabalho e, desde 2002, publica dicas e informações no blog Vá de Bike.
De acordo com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), 49 ciclistas morreram em acidentes de trânsito em 2011 e outros 49 no ano anterior. Enquanto isso, em 2010, apenas três ciclistas morreram na capital europeia da bicicleta, Copenhague, onde um terço dos deslocamentos é feito sobre duas rodas. Apesar da diferença nas dimensões das cidades, a comparação evidencia que São Paulo tem muito a aprender com a capital dinamarquesa num ponto importante: a cultura da bicicleta como parte do trânsito.
Thiago Benicchio, diretor da Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), destaca que falta enxergar a bicicleta como meio de transporte. "Os brasileiros a veem como instrumento de lazer ou esporte", afirma. "Não temos educação de trânsito nem infraestutura", completa.
O alemão Fabian Küster, diretor da Federação Europeia de Ciclistas (EFC, na sigla em inglês), apoia a intensificação do controle dos motoristas pela CET, mas diz que uma mudança de mentalidade não acontece de um dia para o outro. "Vejo a iniciativa como positiva por atribuir aos ciclistas os mesmos direitos dos demais usuários de trânsito", afirma.
Segundo a pesquisa O Uso de Bicicletas na Região Metropolitana de SP, divulgada pelo Metrô em 2010, 214 mil pessoas utilizam a bicicleta diariamente em São Paulo, sendo 70% dos deslocamentos para ir e voltar do trabalho. A Ciclocidade estima que 500 mil utilizem a bicicleta ao menos uma vez por semana.
Exemplo de fora
De acordo com a Ciclocidade, São Paulo - com 11,2 milhões de habitantes - dispõe hoje de apenas 113 km de ciclovias, ciclofaixas e vias de trânsito compartilhado. A modelo Copenhague tem mais de 350 km à disposição de seus 1,2 milhão de moradores. Quase todas as vias principais da capital dinamarquesa dispõem de faixas para bicicletas.
Além disso, Benicchio ressalta que as rotas para bicicletas não são funcionais em São Paulo. "Nenhuma dessas estruturas é completa, ligando pontos importantes da cidade." Já Cruz afirma que ciclovias devem ser construídas a partir de estudos prévios e preferencialmente em locais de tráfego pesado ou por onde circulem muitos ciclistas. "É impossível colocar ciclovias em toda a cidade. E se cria a ideia falsa de que bicicleta só pode andar na ciclovia. Quando o ciclista precisa sair dessas estruturas, é agredido pelos motoristas", diz.
A melhor integração é algo que se pode aprender com os exemplos de fora do País. "As cidades europeias mais propícias para o uso da bicicleta estão na Holanda e na Dinamarca", destaca Küster, da EFC. Fora da Europa, ele cita o exemplo da capital colombiana, Bogotá, que investiu pesado em infraestrutura para bicicletas e dispõe hoje de 344 km de rotas, utilizadas diariamente por cerca de 285 mil ciclistas.
"Não necessariamente as soluções urbanas de Copenhague ou Bogotá funcionarão aqui. Mas podemos aprender com os valores que orientam as políticas públicas de lá", pondera Benicchio. Para ele, é mais adequado comparar São Paulo com megacidades, como Nova York. A cidade americana é tão complexa quanto a capital paulista e avançou significativamente na estrutura cicloviária na última década, contando hoje com cerca de 464 km de ciclovias e ciclofaixas.
Menos carros
São Paulo cresceu principalmente com a chegada do automóvel e as vias da cidade foram construídas para ele. "O grande problema das megacidades é o trânsito caótico de carros, que torna o uso da bicicleta perigoso", diz Küster. É insustentável uma população do tamanho da de São Paulo se locomover apenas de carro ou moto. Segundo o Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo, há 5,2 milhões de automóveis na cidade.
Para o diretor da EFC, o uso de carros deve ser tornado mais caro, com taxas como a Congestion Charge de Londres, cobrada de veículos que entram no centro da cidade entre 7h e 18h durante a semana. Küster aposta ainda na integração da infraestrutura cicloviária à de transporte público e no aumento de vagas de estacionamento para bicicletas.
Compartilhamento
Outra solução é o sistema de aluguel de bicicletas, existente em inúmeras cidades europeias. O modelo ganhou destaque no Brasil ao ser introduzido no Rio de Janeiro, em 2008. Outras cidades, como a catarinense Blumenau, também o adotaram. Em São Paulo, a ONG Instituto Parada Vital, criada em 2007, implementou um sistema integrado de aluguel de bicicletas, com bicicletários em 16 estações de metrô. Em março deste ano, a prefeitura paulistana, o Itaú Unibanco e a empresa Serttel firmaram a parceria do sistema BikeSampa, que prevê a instalação de 3 mil bicicletas de uso compartilhado.
Também está em estudo uma proposta semelhante do Bradesco, e o Pedalusp - sistema de compartilhamento para alunos, professores e funcionários da USP na Cidade Universitária - está em teste desde o início de maio.
Apesar de não cobrir toda a cidade, Cruz enxerga o sistema de compartilhamento como uma maneira de estimular o uso e ampliar a compreensão das vantagens da bicicleta e de que ela é parte do trânsito. "Com mais bicicletas nas ruas, elas deixam de ser invisíveis."
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