“A vida vale um retrovisor?”, a pergunta do pai do motociclista Pedro Kaique Ventura Figueiredo, de 21 anos, é retórica, mas ilustra o sentimento dos familiares de vítimas de sinistros provocados por brigas no trânsito. O histórico do motorista Igor Ferreira Sauceda, que atropelou e matou o motociclista, revela o uso do carro como arma de intimidação.
“Infelizmente, esses casos estão se tornando cada vez mais frequentes e nada tem sido feito para evitar que motoristas agressivos, violentos e mentalmente doentes continuem ferindo e matando em ocorrências que poderiam ser evitadas”, comenta Alysson Coimbra, médico e diretor científico da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra). Uma semana antes de ser preso, Sauceda já havia sido acusado de perseguir e ameaçar uma família. "Esse comportamento recorrente evidencia um padrão de uso do veículo para intimidar e ameaçar outras pessoas. É um claro indicativo de que ele não tem o controle emocional necessário para dirigir com segurança", observa Coimbra.
O especialista em segurança viária defende que as avaliações psicológicas sejam feitas a cada renovação da Carteira Nacional de Habilitação. "Essa avaliação é fundamental para garantir que os motoristas estejam em condições de dirigir com segurança. Atualmente, a perícia é realizada apenas no momento de obtenção da CNH, mas deveria ser repetida, para todos os motoristas, porque permite identificar comportamentos de risco e prevenir tragédias como a que vitimou Pedro Kaique”, justifica o especialista.
Impunidade
A impunidade dos crimes de trânsito é um dos fatores que contribuem para que casos bárbaros continuem destruindo vidas e famílias. Pedro deixou uma companheira e um filho novo. Teve a vida abreviada por um motivo torpe, mas ainda assim a lei prevê que motoristas que cometem crimes de trânsito não agem com dolo, com a intenção de ferir ou matar.
Coimbra enfatiza a necessidade de mudar a lei para aplicar o dolo a motoristas que assumem condutas de risco ao volante, como dirigir sob efeito de álcool e drogas, em velocidade excessiva, ou em perseguições. "A legislação atual muitas vezes trata esses casos como culposos, ou seja, considera que os motoristas não têm intenção de matar. No entanto, ao assumir comportamentos de risco, o motorista está ciente das possíveis consequências fatais de suas ações. Portanto, esses casos deveriam ser tratados como dolosos, com penas mais severas".
Fiscalização
À imprensa, o jurista Wálter Maierovitch, afirmou que o motorista que sai em perseguição com um Porsche tem o objetivo de matar. "Ainda que ele (motorista do Porsche) tenha levado um pontapé, ou o retrovisor tenha sido quebrado, isso não justifica de maneira alguma uma perseguição. Ele impôs a pena de morte, ele quis o resultado, ele saiu em perseguição, ele jogou o carro contra a moto", disse.
Coimbra concorda com o jurista e reforça a importância de uma legislação mais rigorosa e de uma fiscalização eficiente para garantir a segurança no trânsito. "Precisamos de leis que reflitam a gravidade das ações dos motoristas e de uma fiscalização que assegure o cumprimento dessas leis. Somente assim poderemos reduzir o número de sinistros de trânsito", conclui o diretor da Ammetra.
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