Reportagem publicada hoje (17) na Folha de S. Paulo informa que cinco cruzamentos da cidade do Rio de Janeiro estão sendo controlados com auxílio de inteligência artificial do Google.
Conforme o texto, o projeto Green Light não usa sensores ou câmeras, mas dados em tempo real do Google Maps - programação dos sinais de trânsito, horários de pico, hábitos dos motoristas etc. - para sincronizar os semáforos. Se uma rua aparece no aplicativo com trânsito congestionado, a IA do Google calcula um ajuste no equipamento, de modo a promover maior fluxo dos carros. Segundo a Companhia de Engenharia de Tráfego do Rio (CET), desde novembro de 2023, quando a experiência foi iniciada, o uso da tecnologia reduziu em 10% o tempo de espera do motorista nos cruzamentos. Segundo a CET Rio, e também há expectativa de reduções nas emissões de gás carbônico (CO2).
O experimento foi questionado por Meli Malatesta, doutora e especialista em mobilidade, que inicialmente estranhou a ausência na notícia de qualquer referência a pedestres, cadeirantes, ciclistas e outros "entes" que circulam pelas cidades e precisam cruzar essas vias com segurança e conforto. Com experiência de 35 anos na CET/SP, a urbanista entende que não é possível pensar a vida urbana apenas levando em consideração o trânsito motorizado. Em entrevista realizada pela internet, Meli Malatesta convidou a urbanista e engenheira Luisa de Moura Chaves e o engenheiro Jonie Daniel de Magalhães, ambos especialistas em simulação de transportes, para discutir o tema.
Luisa de Moura Chaves entende que o conceito da chamada "onda verde" tem potencial para melhorar a fluidez do trânsito em algumas vias, mas adverte para as limitações dessa técnica, que pode drenar mais fluxo para as ruas que recebem esse tratamento e criar novos pontos ou eixos de congestionamento.
Ela e seu colega Jonie Daniel avaliam que esses sistemas de abertura contínua dos semáforos poderiam ser aplicados sobretudo em faixas e corredores do transporte coletivo para aumentar a velocidade e a eficiência do transporte público e assim atrair mais passageiros e desestimular o uso de automóveis nas cidades.
Luisa acredita que antes de aplicar tecnologias de computação as cidades deveriam investir na melhoria das infraestruturas básica, como calçadas, lombofaixas e outros recursos de traffic calming, além de programas de urbanismo tático, buscando reduzir a velocidade do trânsito em algumas vias.
Os três pesquisadores coincidem na perspectiva de que a tecnologia possa ser um fator de segurança especialmente para os pedestres, com semáforos sonoros, detectores de pessoas com mobilidade reduzida e temporizadores adequados para a travessia das vias. Meli Malatesta lembra que no Brasil os semáforos de pedestres adotam como padrão a velocidade de 1,2 metro por segundo, mas pesquisas indicam que a média no país estaria em 0,7 metros por segundo. "Há uma variação dessa velocidade, dependendo da região do país, mas sabemos que a população brasileira está envelhecendo, o que sugere a necessidade de rever as velocidades e tempos de travessia das ruas", explica Meli.
Ela também acredita na necessidade de repensar a forma de condução dos ônibus que fazem o transporte público das cidades. "Os ônibus têm picos de velocidade que podem provocar quedas ou atropelamentos de pessoas idosas. Talvez seja o momento de revisar os critérios para de velocidade desses coletivos", completa Meli Malatesta.
Para saber mais sobre o projeto Green Light acesse
Leia também:
A defesa do ar limpo no Brasil
Era assim. Agora está livre de carros. O bom exemplo em Brasília
O ranking da mobilidade no mundo
Barulho de trânsito afeta saúde, aprendizado e cognição das crianças
Calçada é parte importante da vida urbana, e não apenas lugar de passagem