Com base em dados da qualidade do ar, será possível em um futuro não muito distante decidir o melhor trajeto e horário para se deslocar de carro ou de transporte público em grandes cidades como São Paulo. É o que apontam pesquisadores da Universidade de São Paulo, que vêm elaborando mapas com as regiões da cidade onde se verificam os maiores índices de poluição e os períodos de pico dessas emissões.
Os estudos estão sendo realizados por equipes do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) e da Faculdade de Saúde Pública (FSP-USP), com apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). E parte dos resultados desses projetos foram apresentados durante um painel sobre oportunidades de estudos em cidades inteligentes realizado nesta terça-feira (9), na abertura do Fapesp Week Illinois, em Chicago (EUA).
Para este estudo em São Paulo, equipamentos portáteis como contadores de partículas a laser e aparelhos de GPS foram instalados em diferentes tipos de veículos. A partir daí, os pesquisadores mediram e obtiveram dados georreferenciados da concentração de material particulado a que motoristas e passageiros estão expostos na cidade em diferentes trajetos e horários.
“Com base nos dados coletados conseguimos construir mapas e identificar quais regiões da cidade têm maior concentração de poluentes”, contou à Agência Fapesp Thiago Nogueira, professor da FSP-USP.
A exposição aos poluentes durante os deslocamentos foi avaliada por meio de diferentes modos de transporte – carro, ônibus, metrô e bicicleta – e regiões da cidade.
Os resultados revelaram que os moradores da região oeste da capital paulista estão expostos a uma concentração maior de um poluente atmosférico chamado carbono negro. Além disso, nas áreas da cidade com maior concentração de áreas verdes, observou-se melhores condições de qualidade do ar. Em contrapartida, regiões com maior presença de edifícios altos apresentaram qualidade intermediária do ar. “Vimos que os prédios altos desfavorecem a dispersão da poluição do ar”, explicou Nogueira.
Cidades globais
Os pesquisadores também mediram, em dez cidades globais, incluindo São Paulo, os níveis de exposição a material particulado em períodos diferentes do dia. Os resultados indicaram que a exposição aos poluentes, fora do horário de pico de trânsito, foi 40% menor pela manhã e 91% menor durante a noite.
Além disso, os maiores índices de exposição a altas concentrações de material particulado foram registrados em situações em que o carro estava com as janelas abertas. O estudo também constatou que os motoristas e passageiros de ônibus em São Paulo estão expostos a níveis mais altos de poluentes atmosféricos do que os usuários de carro e de metrô. Os níveis de exposição atmosférica nos meios de transporte em São Paulo, contudo, foram menores do que os registrados nas outras nove cidades participantes, localizadas na África, Ásia e na América do Sul.
“Apesar da cultura de que São Paulo é uma cidade muito poluída, na comparação com outros países observamos que os níveis de exposição a material particulado na capital paulista são mais baixos”, afirmou Nogueira.
Entre as razões para essa diferença há o fato de que os combustíveis utilizados no Brasil para abastecer os veículos são mais limpos em comparação aos adotados nos países das outras nove cidades participantes. Além disso, a matriz energética brasileira tem maior participação de fontes renováveis, explicou Nogueira.
“Também temos no Brasil o Proconve [Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores], que vem, a cada etapa, estabelecendo a exigência do uso de combustíveis mais limpos e motores mais eficientes no país”, acrescentou o pesquisador.
Desigualdade no acesso
Atualmente, 70% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no mundo são provenientes das cidades, sendo que quase a metade é originada dos transportes urbanos, em maior parte, pelos carros de transporte privativo, sublinhou Mariana Giannotti, professora da Escola Politécnica da USP (Poli-USP) e coordenadora de transferência tecnológica do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) da Fapesp. “Nesse sentido, o transporte público representa uma ótima estratégia para enfrentar questões relacionadas à sustentabilidade”, avaliou a pesquisadora durante palestra no evento.
A pesquisadora e colaboradores compararam o acesso ao transporte público em São Paulo, Nova York e Londres com base no tempo de viagem dos usuários e no custo das passagens. Os resultados indicam que Nova York possui uma política de integração que é justa e contribui para aliviar a desigualdade no acesso ao transporte público da população. Já em São Paulo a situação é diferente, comparou Giannotti.
“Em São Paulo, a desigualdade está sendo reforçada pela forma como é cobrada a tarifa dos usuários de transporte público. Normalmente, as pessoas gastam, em média, entre 20% e 40% de sua renda na cidade com essa finalidade, enquanto os moradores de Nova York despendem entre 5% e 10%”, comparou.
Cooperação
Realizado na sede do Discovery Partners Institute, em Chicago, o objetivo do encontro da Fapesp foi criar oportunidades de cooperação científica e tecnológica entre pesquisadores do estado de São Paulo e do Sistema de Universidades de Illinois (UIS, na sigla em inglês), formado pelos campus da instituição em Chicago, Urbana-Champaign e Springfield, no centro-oeste norte-americano. Participaram ainda do evento pesquisadores da região dos Grandes Lagos, na fronteira entre Estados Unidos e Canadá, e de instituições parceiras do Canadá e do México.
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