Uma audiência pública realizada na última terça-feira (12) discutiu o Projeto de Lei 2789/2023, que estabelece novos limites de velocidade nas vias do país com o objetivo de reduzir os sinistros de trânsito. Após os debates, concluiu-se pela necessidade de desvincular a matéria de outros projetos que tramitam na Câmara dos Deputados, de forma a agilizar sua tramitação na casa. A iniciativa partiu do deputado federal Jilmar Tatto (PT), autor do projeto, e acatada pelo deputado Juninho do Pneu (União), coautor do projeto e um dos autores do requerimento para a realização da audiência pública. A proposta busca formular um grupo de trabalho para sensibilizar o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), sobre a urgência da matéria.
Além dos parlamentares, participaram da audiência representantes dos ministérios da Saúde, Transportes, Cidades, além do Observatório Nacional da Segurança Viária, Organização Panamericana da Saúde, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e WRI Brasil. Todos os oradores enfatizaram que a readequação de velocidade é fundamental para garantir a diminuição de mortes e lesões causadas pelos sinistros de trânsito.
Para entender mais detalhes do projeto e dos debates realizados, entrevistamos a ativista Ana Luiza Carboni, coordenadora do projeto Vias Seguras e diretora da União de Ciclistas do Brasil (UCB), uma das organizações que elaboraram a proposta do projeto de lei. A entrevista foi realizada por e-mail, com mediação da assessoria da UCB e posterior edição pelo Mobilize Brasil.
Há uma tendência mundial para a redução das velocidades nas áreas urbanas para 40 km/h e até 30 km/h em regiões com maior presença de pedestres e ciclistas. Por que não estabelecer um limite padrão para todas as vias. Por exemplo, 40 km/hora em todas as ruas? Isso não seria mais compreensível e educativo para os motoristas?
O projeto de lei 2789/2023, proposto por organizações da sociedade civil, busca alterar a maneira que a velocidade é estabelecida, tendo como parâmetro o uso da via, não apenas suas características técnicas. Ou seja, numa via onde exista alta movimentação de pedestres e risco elevado de sinistros, a velocidade deve ser reduzida. Um bom exemplo é a orla do Rio de Janeiro, que hoje tem uma velocidade máxima de 70 km/h, incompatível com o volume de pessoas que transitam na região. O atropelamento recente do ator Kayky Brito demonstra a necessidade de mudar esse paradigma, reduzindo velocidades. Depois da perícia, sabemos que o motorista estava conduzindo a 48 km/h, e o ator ficou internado por quase um mês. Caso estivesse conduzindo na velocidade máxima da via, o mais provável é que o ator não estivesse vivo. Esse é um ponto crucial da proposta. A velocidade é o maior fator de risco para a ocorrência e o agravamento de colisões e atropelamentos, e as velocidades permitidas nas nossas cidades são incompatíveis com a vida. O excesso de velocidade é a principal infração de trânsito no Brasil, e a redução de velocidades máximas é a medida mais eficiente para a redução de mortes e lesões nas vias urbanas.
Mas o Código de Trânsito Brasileiro já não regulamenta esses limites? Quais são os parâmetros atuais e os novos, propostos pelo projeto de lei?
Atualmente, o CTB permite que os órgãos de trânsito regulamentem velocidades superiores ou inferiores às estabelecidas no próprio Código. É fundamental mudar, limitando a autonomia dos órgãos municipais e estaduais, de forma que esses órgãos possam adotar apenas velocidades iguais ou inferiores, incluindo o uso de cada via como critério. No CTB temos a classificação de Vias de Trânsito Rápido (VTR), dotadas de acesso especial, sem interseções de nível, e que não são ligadas diretamente a edificações ou lotes de terrenos além de não apresentarem passagem direta de pedestres no nível da via. Em outras palavras, nessas vias rápidas não deve existir interação com pessoas e, por isso, a proposta nesses casos é estabelecer um limite máximo de 60 km/h, o que protege os ocupantes de veículos em caso de colisão. O Código também considera as vias arteriais, avenidas que ligam duas regiões de uma cidade, controladas por semáforos, com acesso a lotes, edificações, e também a outras vias, com interseções em nível. Neste caso, a proposta é uma velocidade máxima de 50 km/h, como recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), levando em consideração o volume de pessoas que transitam nas avenidas. Vias coletoras ou vias locais não teriam alteração de velocidades.
Quais são os trâmites futuros do projeto de lei? Ele terá que passar por comissões? Haverá espaço para mais sugestões na plataforma "Participa Brasil"?
Atualmente, o PL 2789/2023 está apensado [vinculado] ao PL 8085/2014, e os esforços estão concentrados em desvincular a matéria, porque exigiria a criação de uma comissão especial para essa tramitação. No dia 14 de dezembro, durante audiência pública na Câmara dos Deputados, foi anunciada a possibilidade de a Câmara criar um grupo de trabalho para agilizar a tramitação do PL 2789/2023. Embora seja comum que os projetos de leis passem por diversas comissões, neste momento não podemos prever se ele permanecerá apensado ou não. Quanto às sugestões da plataforma 'Participa Brasil', vale ressaltar que essa ferramenta é utilizada para consultas a projetos do executivo federal. O PL 2789/2023, no entanto, é um projeto de lei redigido pela sociedade civil organizada. Caso a sociedade deseje fazer outras sugestões, é possível propor emendas em contato direto com as organizações que atualmente fazem a incidência. As pessoas interessadas podem ter mais detalhes no site específico do projeto: https://transitandopelavida.org.br/salvando-vidas.
Leia também:
Motivos para reduzir a velocidade nas cidades
Fortaleza reduzirá para 50 km/h a velocidade em dez avenidas
Detran estuda reduzir velocidade máxima em algumas vias do DF
OMS sugere cinco medidas para reduzir a velocidade nas cidades
Recife redesenha vias para mais segurança a pedestres
E agora, que tal apoiar o Mobilize Brasil?