Sevilha é uma cidade milenar, repleta de muralhas, arcadas, palácios e igrejas, além de magníficos jardins que testemunham seu passado fenício, visigodo, árabe e depois católico. Lá vivem cerca de 1,3 milhão de pessoas e um total de 1,8 milhão na Província de Sevilha, que congrega mais de cem municípios.
É um lugar de forte presença religiosa, com grandes procissões durante todo o ano, mas especialmente nas datas de celebração da fé católica. Também é uma das cidades com maior presença das polêmicas corridas de touros e da música e dança flamencas. Essa história também está impressa nos pavimentos das ruas, praças e calçadas da cidade, com exuberantes mosaicos de pedras.
Tamanha tradição não impediu que a cidade fizesse grandes transformações na mobilidade urbana, especialmente nas duas últimas décadas, a partir de uma legislação que procura estimular o transporte público, por bicicletas e a pé, de forma a reduzir o uso de carros e as consequentes emissões de carbono.
Todas as esquinas são dotadas de rampas de acessibilidade, com faixas de travessia rigorosamente sinalizadas e respeitadas pelos motoristas: basta que as pessoas - pedestres ou ciclistas - se posicionem na faixa e o trânsito para até que todos tenham cruzado a rua.
Nas avenidas mais movimentadas, os semáforos de pedestres oferecem uma espera relativamente curta, de um a dois minutos, e tempos confortáveis de travessia, com sinalizadores de segundos e marcadores sonoros.
Parece não haver a menor dúvida sobre a prioridade que deve ser dada a quem caminha ou circula em cadeiras de rodas, scooters e outros equipamentos de apoio a pessoas com mobilidade reduzida. Mesmo as polêmicas calçadas de mosaicos de pedra mostram-se bem mantidas, niveladas, com juntas reduzidas, permitindo caminhadas sem sustos ou tropeços.
Sem catraca
O acesso aos ônibus e VLTs é feito com o pagamento ao condutor ou com a validação do cartão local de transportes: entra-se, passa-se o cartão ou paga-se em dinheiro, sem ser constrangido por nenhum bloqueio ou catraca.
O transporte público está apoiado sobretudo em ônibus - a maioria diesel padrão Euro 6 - que cobrem a região central, em linhas circulares, além do VLT (tranvia), ainda restrito à área mais turística. Novas linhas desse transporte elétrico sobre trilhos estão em implantação ou em projeto, para completar as conexões planejadas com o metrô.
O metrô resume-se a uma única linha, composta por três tramos que atendem a parte da cidade e localidades ao sul. Outras três linhas do metrô são planejadas, mas sua construção depende de análises detalhadas sobre o subsolo, de forma a evitar danos ao patrimônio histórico da cidade. O metrô de Sevilha começou a ser planejado em 1974, mas teve sua construção paralisada em 1983, em razão de problemas financeiros e também de efeitos danosos às fundações das construções locais. As obras somente foram retomadas por volta de 1999, já no contexto da integração europeia e com o suporte de tecnologias mais seguras para a escavação dos túneis.
No pedal
São as bicicletas e patinetes, porém, que oferecem a maior surpresa aos visitantes. Sevilha conta com 170 km de ciclovias, a maior parte construída entre 2007 e 2009, em excelente estado de conservação após uma série de obras de manutenção realizadas durante a pandemia. Graças a essa infraestrutura, nos horários de pico, milhares de magrelas circulam por todos os cantos da cidade, nas ciclovias, nas ruas e também nas calçadas, lembrando a efervescência ciclística das cidades holandesas.
Ciclovias: rede chegou a 170 km, com boa qualidade Foto: Lisboa para Pessoas
De forma geral, as ciclovias são segregadas do trânsito motorizado e implantadas sobre as largas calçadas, sinalizadas com a cor verde. E como a cidade é praticamente plana, a maior parte dos ciclistas utiliza bikes comuns, sem assistência elétrica. Além da boa infraestrutura, a cidade oferece o sistema Sevici, de bicicletas compartilhadas, com cerca de 2.500 bikes em 264 estações, mas todas restritas à região central.
Há também conflitos: em algumas ruas fechadas aos carros, os caminhantes invadem as faixas destinadas às bicicletas e patinetes, dificultando a circulação dos ciclistas. A maioria age com paciência, contornando as massas de pedestres, mas alguns sinalizam, acionando nervosamente suas campainhas. E, eventualmente, acontecem pequenos choques, seguidos de desculpas ou bate-bocas. Explica-se: as ciclovias são simplesmente sinalizadas no pavimento, com poucas balizas que as separem dos passeios de pedestres. Assim, os mais distraídos - especialmente turistas - tornam-se um perigo para os pedalantes. E vice-versa.
Imagem do site Bike Share Map mostra a concentração de estações de bicicletas na área central da cidade
Fora dessa "Sevilha turística", a infraestrutura é mais pobre, com raras ciclovias e nenhuma estação de bicicletas compartilhadas. Calçadas e faixas de pedestres mostram-se mais desgastadas, mas ainda assim livres de degraus, buracos e tranqueiras que impeçam a circulação. Há também pequenos trechos cicloviários em outros municípios da província, mas com padrões menos vistosos que os da capital.
De qualquer forma, se for a Sevilha, chegue de trem, opte por um bom calçado ou alugue uma bicicleta.
Estação de trens Santa Justa: sem conexão com o metrô, mas aberta a bicicletas e patinetes após protestos de usuários Foto: Mobilize Brasil
Plano de mobilidade nasceu há 20 anos
O panorama de mobilidade era radicalmente diferente em Sevilha até o ano 2000. As primeiras iniciativas de renovação da mobilidade urbana na cidade surgiram com a Lei 2/2003 (Ordenación de los Transportes Urbanos y Metropolitanos de Viajeros en Andalucía), que estabelecia critérios e prazos para que as cidades andaluzas criassem e colocassem em prática seus planos de mobilidade. O planejamento procurava reverter a tendência de crescimento do uso do carro particular e o relativo abandono dos transportes públicos. E também apontava propostas para estimular a mobilidade a pé e o uso das bicicletas. A documentação completa sobre as discussões e seus resultados estão disponíveis no link https://www.sevilla.org/servicios/movilidad/pmus/plan-de-movilidad-urbana-sostenible.
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