O que bicicletas, cigarros, armas e bebidas alcoólicas têm em comum? De acordo com o novo texto da Reforma Tributária aprovada em julho na Câmara dos Deputados, e que deverá passar pelo Senado, muita coisa. Afinal, o texto inclui a possibilidade de que as bicicletas sejam taxadas da mesma forma que os demais produtos citados, no contexto do novo Imposto Seletivo Federal (IS).
Importante lembrar que este tributo tem sido chamado popularmente de “imposto do pecado”. O motivo? Ele está sendo criado, em tese, como um desestímulo a produtos que fazem mal à saúde e ao meio ambiente.
“A possibilidade da inclusão da bicicleta no IS é um contrassenso por si só. Trata-se de um equívoco muito grave, pelo simples fato de a bicicleta ser uma ferramenta que representa o oposto dos produtos nocivos: ela faz bem à saúde e o seu uso auxilia no combate às mudanças climáticas”, explica Rodrigo Coelho, presidente do Conselho Deliberativo da Aliança Bike (Associação Brasileiras do Setor de Bicicletas).
“A tributação da bicicleta já é altíssima no Brasil, correspondendo a 72% do custo total. O que defendemos é a desoneração ampla e mais justa da cadeia produtiva da bicicleta”, complementa.
A medida, porém, pode criar um tributo extra para as bicicletas no país. Como efeito direto, o preço delas seria elevado ainda mais – tornando-as um bem menos acessível para a população brasileira.
O que diz o texto da Reforma Tributária
Na Reforma aprovada pela Câmara dos Deputados, fica claro que o principal objetivo do Imposto Seletivo é onerar a produção, a comercialização e a importação de bens prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. No texto, porém, esta ação se estende a produtos que também tenham alguma produção na Zona Franca de Manaus.
Aí entra o segundo ponto que merece atenção: a maior parte da produção de bicicletas do país não acontece na Zona Franca, mas estende-se por praticamente todos os estados do país. O que significa que o IS teria um efeito negativo para a maior parte da indústria de bicicletas do país.
Quanto do mercado de bicicletas no Brasil poderá ser afetado pelo Imposto Seletivo:
- 82% de toda produção de bicicletas do país;
- Quase 90% das bicicletas comercializadas ficarão mais caras para a população;
- 87,5% da mão de obra formalmente empregada na indústria de bicicletas seria impactada negativamente;
- 98,7% dos estabelecimentos industriais de bicicletas e componentes no país passariam a pagar imposto seletivo.
(Fontes: IBGE e RAIS)
“Acreditamos que uma política tributária justa precisa olhar para a produção do setor de bicicletas como um todo no Brasil. Onerar excessivamente o setor de bicicletas não faz jus aos benefícios diretos que o uso da bike traz para a sociedade”, comenta Rodrigo.
Com os dados, fica claro para a entidade que o Imposto Seletivo trará impactos negativos diretos no acesso à bicicleta, com produtos mais caros e inacessíveis, especialmente sobre a população de mais baixa renda. De acordo com a Pesquisa Anual de Comércio Varejista de Bicicletas 2022, da Aliança Bike, mais de 70% das bikes consumidas no Brasil têm preço entre R$ 800,00 e R$ 2.500,00 – consideradas bicicletas de entrada, mais baratas.
Campanha Salve a Bike
Por conta da possibilidade da inclusão das bicicletas no imposto do pecado, a Aliança Bike criou a campanha Salve a Bike. O objetivo é tirar a bicicleta da incidência do imposto seletivo na reforma tributária por meio do apoio popular. Todas as informações da campanha, incluindo o abaixo-assinado, estão na página da campanha.
Parlamentares ignoram pedido de leitor
Na semana passada, recebemos um comentário de David Marques da Silva, de Guarantã do Norte (MT), localizada no "coração" do país. David é vereador (Podemos) em seu município e entusiasta do uso da bicicleta nas cidades.
Ele explica que em agosto passado enviou ofícios a todos os deputados e senadores de Mato Grosso pedindo atenção "para que a nova reforma tributária avalie de forma justa a taxação de impostos sobre bicicletas". Na correspondência David lembra que "muitos usuários de bicicletas, sejam elas elétricas ou convencionais, optam por esse meio de locomoção devido à falta de condições financeiras para utilizar combustíveis, bem como para fins de competição ou lazer. Além disso, o uso de bicicletas traz benefícios significativos para a saúde, contribuindo para a redução dos gastos com o Sistema Único de Saúde (SUS)", completa o texto. Indignado, o vereador comenta que não obteve nenhuma resposta dos parlamentares matogrossenses.
Abaixo uma das correspondências enviadas:
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