"Todos os ônibus já deveriam ter piso baixo"

A cadeirante e ativista Sandra Ramalhoso considera que o sistema de transporte por ônibus em São Paulo continua excluindo as pessoas com baixa mobilidade

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Mobilize Brasil  |  Postado em: 13 de março de 2023

Cobradora apóia pessoa em ônibus com elevador queb

Cobradora apóia pessoa em ônibus com elevador quebrado

créditos: Thiago Jim/Plamurb via Whatsapp


A palavra ônibus vem do latim omnibus e significa “para todos”. No entanto, algumas pessoas são excluídas desse sistema de transportes que deveria ser universal. Sandra Ramalhoso, por exemplo. Ela é uma pessoa com deficiência que circula em cadeiras de rodas motorizada pelas ruas e pelo transporte público de São Paulo. Integra o Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência e também o Conselho Municipal de Transporte e Tráfego. Ativista, Sandra sempre costuma lembrar os perrengues que enfrenta em seu dia a dia, inclusive nos acessos aos ônibus da cidade. Por isso, fomos ouvi-la para discutir a aparente onda crescente de “acidentes” envolvendo pedestres, ciclistas e especialmente idosos nos coletivos na capital paulista, infelizmente com algumas mortes. Leia a entrevista:


Sandra Ramalhoso, atuante em duas comissões municipais Foto: Arquivo pessoal



Você é uma pessoa "diferente", com mobilidade reduzida. Como você avalia o tratamento dado pelos funcionários dos ônibus a deficientes e pessoas idosas?
O tratamento dispensado por motoristas e cobradores nos ônibus de São Paulo chega a ser vergonhoso. Claro que não podemos generalizar, porque existem profissionais que cumprem rigorosamente e até carinhosamente seus deveres…mas, infelizmente, os motoristas que conduzem microônibus e ônibus de porte médio, aqueles que têm elevadores, e que muitas vezes cumprem duas funções no ônibus - dirigir e cobrar - além de mediar eventuais conflitos, esses condutores trabalham sob intensa pressão, e muitas vezes não conseguem atender as pessoas com restrições de mobilidade. Ele sabe que o embarque ou o desembarque de um cadeirante leva pelo menos cinco minutos e que isso vai gerar atrasos em sua programação de viagem. Então, é comum que esse motorista invente uma desculpa, diga que a plataforma está com defeito, e se negue a levar o cadeirante.Além disso, os próprios passageiros também reclamam do tempo de embarque de um cadeirante nesses elevadores, o que corrobora uma certa má vontade para com as pessoas com deficiência. É um sistema agressivo, discriminatório…


O problema, então, é o tipo de veículo…
Não haverá treinamento capaz de melhorar, de humanizar essa relação, nesses ônibus de piso elevado, que exigem essa trabalhosa e demorada operação dos elevadores. A legislação brasileira, a Comissão Permanente de Acessibilidade, o Ministério Público, várias organizações já definiram que todos os ônibus precisam ter piso baixo. A SPTrans não está cumprindo essa determinação e isso prejudica os passageiros e dificulta o trabalho do motorista. Afinal, ele é pressionado pela empresa, pela população e pelos usuários com deficiência. Por mais formação que se dê, ele não conseguirá atuar bem…


Há diferenças de tratamento aos passageiros entre empresas e bairros diferentes? Você poderia citar um bom exemplo? E também um mau exemplo?
Sim, há diferenças, mas quase sempre em função do tipo de veículo e da infraestrutura de embarque e desembarque. Com um bom equipamento, o motorista e o cobrador têm mais condições para atender às pessoas idosas ou com deficiência. Se o ônibus tem piso baixo, se é daqueles modelos em que o veículo “ajoelha” (se inclina) para facilitar o acesso, ou se há uma plataforma elevada para embarque em nível, as pessoas conseguem entrar no veículo com mais rapidez e evitam todo aquele estresse para os funcionários. Mas, se a pessoa está na periferia da cidade, as condições geralmente são piores. Uma colega cadeirante que reside em um bairro distante, na zona sul, conta que tem que esperar dois, três ônibus para conseguir embarcar. É assim: a pessoa com deficiência acaba ficando no ponto.

Há também ótimos exemplos. Eu mesma hoje tomei um ônibus ali na Vila Clementino (zona sul, mais próxima do centro de São Paulo) e o embarque foi rapidinho, porque o veículo me permitiu o acesso e a manobra da cadeira com facilidade. O desembarque, no Centro, também foi ágil porque o terminal tem uma plataforma elevada. A periferia continua sofrendo pela falta de qualidade dos pontos de ônibus, pela falta de condições das calçadas - para que a pessoa possa chegar ao ponto - e pela falta de qualidade dos ônibus. Com tanta precariedade, com tanta demora, tantas dificuldades, os passageiros se estressam e quando embarcam encontram um cobrador e um motorista já sobrecarregados. E na periferia, muitas vezes não há cobrador; e então o estresse, naturalmente, aumenta. E daí surgem discussões, brigas e, infelizmente, alguns acidentes.


Em sua visão, como militante em duas comissões (PCD e CMTT) do município, quais seriam as maiores urgências para melhorar essa relação entre motoristas, cobradores e o público que usa os ônibus cotidianamente?
Como já argumentei, um primeiro ponto seria a melhora dos ônibus. Esses ônibus com piso alto e plataformas elevatórias deveriam ser eliminados. Ônibus tem que ter piso baixo, rampa de acesso e locais adequados para a viagem das pessoas com deficiência. Um segundo aspecto é a necessidade de melhorar as condições dos pontos de embarque, que precisam ser acessíveis e oferecer conforto às pessoas, antes mesmo do embarque. E um terceiro aspecto é a necessidade do cobrador. Ele é um agente de relacionamento com os usuários: pode apoiar idosos, cadeirantes, anões, pessoas cegas ou com baixa visão, ou mesmo mães com crianças, enfim, pessoas que estejam com alguma dificuldade.

O cobrador também pode responder a dúvidas sobre o trajeto, sobre a localização dos pontos de referência ao longo da viagem. Se ele não é mais necessário para receber as passagens, pode ser reciclado como um “agente de inclusão”, uma nova função, para atender ao público e apoiar o motorista. E todos os profissionais precisam ter uma boa formação sobre sua função, sobre as necessidades do público. Eles precisam saber como lidar com idosos, pessoas cardíacas, autistas, cegos, com cadeirantes que ainda não sabem manobrar suas cadeiras, crianças… Em resumo, o que precisa ser melhorado é a estrutura das vias, das calçadas, dos pontos de parada, a renovação da frota de ônibus e a formação dos profissionais que trabalham no transporte público.


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Comentários

Joao Luis - 15 de Março de 2023 às 06:01 Positivo 0 Negativo 0

Não é com atitudes meramente políticas e eleitoreiras que resolve-se o problema do transporte no País, se ao invés de políticos e apadrinhados políticos tivéssemos técnicos nas secretarias de transportes, a situação do transporte seria outra

Mauricio Simões - 14 de Março de 2023 às 10:47 Positivo 0 Negativo 0

Boa tarde. A decisão é simples. Assim como só credenciam novos ônibus elétricos, banindo os à diesel. Que se determine as fábricas tornar inaceitável ônibus de piso altos. Aliás,eles são apenas caminhões adaptados. Atenciosamente Maurício

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