Após quase uma década de denúncias, debates, visitas técnicas, promessas de campanha e um enorme desrespeito com a população que vive na Região Metropolitana de Cuiabá, o governo de MT decidiu avançar na retirada dos trilhos do lendário VLT de Cuiabá. O assunto foi destaque no jornal da TV Globo desta segunda-feira.
"Os 280 carros que transportariam 160 mil pessoas por dia vieram da Espanha, avaliados em quase R$ 500 milhões, e continuam no mesmo lugar, preservados pelo consórcio que implantaria o VLT.
“A gente faz toda a manutenção nos veículos, tanto a parte de zeladoria, manutenção preventiva, testes, engraxes, lubrificações, e a gente passa todos esses relatórios, protocola no governo do estado de Mato Grosso”, diz o engenheiro de teste José Raimundo dos Santos.
Os trilhos de aço, que vieram da Polônia, e os amortecedores de borracha, fabricados na Itália, estão sendo retirados por máquinas pesadas e se misturam a montanhas de entulho. “É tanto ferro ali que arrancaram, tanta coisa ali que estragaram, gente, o que é isso? Isso aí é um dinheiro que nós vamos pagar”, afirma a cuidadora Raquel Souza Silva.
Dos 22 km de trilhos previstos no projeto, seis já estavam prontos no municipio de Várzea Grande, na Região Metropolitana de Cuiabá. Agora, segundo o consórcio responsável pela obra, tudo isso deve ser jogado fora. Com a destruição, já são quase R$ 89 milhões desperdiçados só em trilhos, pelos cálculos do consórcio.
Veja o vídeo do Jornal Nacional
O VLT era uma das obras para a Copa do Mundo. A construção foi interrompida ainda em 2014, depois que a Polícia Federal e o Ministério Público denunciaram corrupção e desvio de dinheiro. O então governador Silval Barbosa chegou a ser preso e fez delação premiada.
A obra já custou R$ 1 bilhão, e o consórcio, numa estimativa feita cinco anos atrás, calculava que precisaria de mais R$ 922 milhões para terminar. O governo do estado rompeu administrativamente o contrato com o consórcio em 2017, na gestão de Pedro Taques. O consórcio recorreu na Justiça e teve o recurso negado. Em 2020, o atual governador, Mauro Mendes, decidiu fazer a substituição do modal, de VLT para BRT, que era a escolha inicial do estado, dessa vez com ônibus elétricos.
“Fizemos um estudo muito profundo com a participação de entes federais, do estado, de prefeituras, e chegamos à conclusão de que o BRT é moderno, eficiente e vai custar praticamente a metade do preço que nós gastaríamos só para terminar o VLT”, diz o governador Mauro Mendes.
Mas o coordenador de Mobilidade Urbana do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (Idec), Rafael Calabria, avalia que a troca de VLT para BRT é um retrocesso: “Os benefícios que o trilho oferece em sustentabilidade, em capacidade de passageiros e na diversidade de opção que a cidade vai ter são muito maiores do que as oferecidas pelo BRT. Então, o investimento um pouco maior se justificaria. Ainda mais no caso de Cuiabá, que já começou a obra, seria só finalizar. Então o BRT, além de uma opção errada, vai ter um desperdício de dinheiro público”, afirma.
A licitação do BRT já foi feita, mas o Ministério Público de Mato Grosso investiga supostas irregularidades na licitação. A denúncia foi feita pela prefeitura de Cuiabá, que é contra a mudança. “Não há o menor bom-senso em dizer com BRT que está começando do zero é mais barato que o VLT, que já tinha 70% das obras executadas e boa parte dos seus recursos pagos”, ressalta o prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro.
Quem usa o transporte coletivo, hoje feito apenas por ônibus, reclama. “Tem que ter qualidade. A gente entra no ônibus assim, aquele calor, a gente que tem pressão alta, tem tudo, estou vendo a hora da gente ter um ‘piripaque’”, diz a aposentada Eugênia Joaquina da Cruz. “Eu espero que saia logo, para que a gente possa usar, ter mais um pouco de conforto”, afirma a cuidadora Raquel Silva.
O que dizem o governo e o consórcio
O governo de Mato Grosso declarou que o contrato previa que o VLT seria entregue pronto, que os equipamentos comprados são propriedade do consórcio responsável pela obra e que entrou na Justiça para receber indenização de todo o valor que o estado investiu.
O consórcio VLT Cuiabá-Várzea Grande afirma que o desmonte do projeto não encontra amparo de ordem técnica ou econômica, que mantém a guarda e manutenção dos trens até uma decisão da Justiça e que sempre esteve à disposição do estado para uma solução legítima e viável para concluir o projeto.
Leia também:
Entre BRT e VLT, Cuiabá ficou refém do carro e da moto
Câmara de Cuiabá realiza nova audiência sobre obra do VLT
Semob/MDR conclui estudos sobre VLT de Cuiabá
Engenheiro fala a CPI sobre VLT de Cuiabá
Lojistas pedem melhorias no transporte público de Cuiabá