Carros elétricos podem trazer uma série de benefícios para as cidades: são silenciosos, não emitem gases de efeito estufa e reduzem ao mínimo a poluição urbana. No entanto, ninguém ainda conseguiu equacionar respostas para outros problemas ambientais provocados pelas baterias, que demandam lítio e outros minerais em sua fabricação. E também não se sabe ainda como reciclar esses componentes ao final de sua vida útil.
Numa conta rápida: um carro elétrico tem de 12 kg a 30 kg de lítio em suas baterias. Considerando a frota de 1,4 bilhão de carros, caminhões, vans e ônibus hoje em circulação no planeta, seriam necessários de 16 a 42 milhões de toneladas desse metal para manter as rodas girando. É muito mais do que as atuais 105 toneladas produzidas anualmente por Austrália, Chile, China, Argentina, Brasil, Zimbábue e Portugal.
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Uma nova pesquisa divulgada pelo jornal britânico The Guardian calculou que a transição para veículos elétricos apenas nos Estados Unidos pode exigir o triplo da produção atual de lítio. Dessa forma, a transição para veículos elétricos movidos a baterias de lítio até 2050 exacerbaria as desigualdades ambientais e sociais globais relacionadas à mineração, podendo até mesmo ameaçar a meta de aquecimento global de 1,5 graus celsius. A menos que ocorra uma redução drástica de carros nas áreas urbanas dos EUA. E aqui a palavra-chave é transporte público.
No Brasil...
Nesta semana, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o Ministério de Minas e Energia, lançaram uma nova análise com projeções sobre o futuro da eletrificação do transporte no Brasil. Conforme o boletim ClimaInfo, há um caminho ainda difícil pela frente, o que deve atrasar a adoção dessa tecnologia entre a massa de consumidores brasileiros.
Os principais obstáculos são a falta de postos para recarga, o alto investimento necessário para esses postos e, sobretudo, os custos das baterias. Outro problema é o fato de que as montadoras nacionais ainda não se interessaram pela fabricação doméstica desses veículos, o que resulta em modelos importados vendidos na cotação do dólar, a preços que assustam e afastam o consumidor médio.
Assim, a expectativa dos elétricos para a próxima década é de um crescimento tímido no mercado nacional. De acordo com a EPE, em 2032 os veículos elétricos devem responder por apenas 7% dos licenciamentos. No transporte de cargas, contudo, esse avanço será mais notável: em dez anos, 20% dos licenciamentos no setor devem ser de modelos elétricos, e 15% de híbridos.
Pode não ser uma boa notícia para a indústria de veículos, mas talvez seja uma oportunidade para eletrificar e melhorar a qualidade do transporte público e recuperar usuários que fugiram para carros e motos.
Não há dados sobre o Brasil, mas nos EUA a adoção de "políticas ambiciosas de investimento em transporte de massa, com mais bairros e cidades caminháveis e reciclagem robusta de baterias reduziria em mais de 90% a quantidade de lítio extra necessária em 2050", diz o texto do The Guardian. O cáculo foi apoiado em uma pesquisa recente (jan 23) do projeto Climate and Community.
O trabalho realizado pelos pesquisadores da Universidade da Califórnia - Davis projetou o crescimento da frota de veículos ano a ano, considerando várias opções: a simples substituição de todos os carros atuais por outros elétricos; o desenvolvimento de modelos compactos, com baterias menores; a reciclagem das baterias; e a substituição do transporte individual por investimentos maciços em transportes públicos, elétricos e coletivos, além da combinação dessa opções.
O melhor cenário, com redução das emissões de carbono e com menor impacto na mineração, se mostrou com a adoção do transporte coletivo: ônibus, bondes, barcas e bicicletas, tudo elétrico. Simples assim.
Leia o resultado da pesquisa em
Achieving Zero Emissions with More Mobility and Less Mining
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