"Transporte público: o mais novo jogo de azar"

Especialista discute a proposta da loteria municipal para financiar o transporte público em Porto Alegre. E avalia que há o risco de que a conta seja paga pelos idosos

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Fonte: Portal do Trânsito/Edição: Mobilize Brasil  |  Autor: Rodrigo Vargas de Souza*  |  Postado em: 21 de outubro de 2022

Transporte em Porto Alegre: idosos pagarão a conta

Transporte em Porto Alegre: idosos pagarão a conta?

créditos: EPTC

Projeto de lei aprovado pela Câmara Municipal de Porto Alegre em junho e sancionado pelo prefeito Sebastião Melo em agosto passado permite a criação de uma loterial municipal. Segundo a Prefeitura, o objetivo da nova lei 13.215/2022 é o incremento de receitas para custear o transporte coletivo da capital gaúcha, além de viabilizar as gratuidades para idosos. Neste artigo, publicado originalmente no Portal do Trânsito, Rodrigo Vargas de Souza analisa a proposta e indica o risco de que os idosos acabem bancando a conta final das gratuidades. Leia o texto:


Jogos de azar são aqueles nos quais os que têm sorte são os que ganham com o azar dos outros jogadores, devido à diferença de probabilidades entre a sorte e o azar. Como as chances da sorte são escassas, são muitos mais os que têm azar, daí que tais jogos são sustentáveis através das perdas dos jogadores que financiam os que vão ter a sorte. E o que jogo de azar tem a ver com o transporte público? Você já vai entender.


Não é nenhuma novidade que o transporte público passa por uma profunda crise. Ele vem perdendo passageiros há anos consecutivamente e precisa urgentemente de novas fontes de financiamento. Mas a notícia da aprovação do projeto de lei nº 009/22 no último dia 1º de Junho pela Câmara Municipal de Porto Alegre, confesso, me deixou um tanto preocupado com os caminhos tomados pelo Executivo. O projeto em questão visa a criação de uma Loteria Municipal. Além disso, tem como objetivo incrementar receitas para a qualificação e redução dos custos do sistema de transporte coletivo.


Desde 2015, quando se aprovou a Emenda Constitucional 90, de autoria da deputada federal Luiza Erundina (PSOL-SP), o transporte passou a ser um direito social, assim como são a saúde e a educação. No entanto, é necessário que haja a regulamentação para que a emenda comece a valer na prática.


Atualmente, segundo estudo produzido pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), os usuários arcam com quase 90% da receita do sistema de transporte público urbano no Brasil.


E quem é o maior público usuário de jogos de loteria no nosso país? Um estudo recente sobre o perfil dos apostadores de loterias no Brasil apontou que 51% dos apostadores tinha renda pessoal de até R$ 2.800,00 mensais, aproximadamente, ou seja, são de baixa renda.


Não é preciso refletir profundamente para perceber quem vai seguir financiando o sistema de transporte…
O que me faz lembrar de uma clássica cena do Chaves. Nela, o personagem fica incumbido por cuidar de uma banca de churros e acaba comprando dele mesmo.


Espero estar errado, mas receio que essa proposta venha a contribuir pouco (ou nada) para reduzir a crise do transporte público. E que, infelizmente, o transporte público parece estar longe de deixar de ser um “jogo de azar”. Os poucos usuários do transporte financiam seu próprio bolão, mas na hora de receberem seu “prêmio”, são deixados à própria sorte.


*Rodrigo Vargas de Souza é formado em Psicologia pela Unisinos e desde 2015 atua na Coordenação de Educação para Mobilidade da EPTC, órgão Gestor do trânsito na cidade de Porto Alegre


Leia o texto da lei:

 




 

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