A arte da calcetaria, que é a técnica de revestir ruas e calçadas, ganhou um novo alento para seguir sendo preservada na cidade do Rio de Janeiro. A Prefeitura do Rio, por meio da Secretaria Municipal de Conservação, em parceria com a Secretaria Municipal de Trabalho e Renda, preparou para o mercado mão de obra especializada nessa técnica.
O curso de formação de calceteiros durou pouco mais de um mês e formou 57 profissionais capacitados para fazer a manutenção de pisos em pedras portuguesas, entre trabalhadores já contratados por empresas, que foram se aperfeiçoar na função, e pessoas buscando uma oportunidade. Todos os alunos que procuravam recolocação já estão encaminhados para vagas de emprego. A cerimônia de entrega dos certificados foi realizada nesta quinta-feira (6), no Palácio da Cidade, em Botafogo.
O conteúdo do curso foi dividido em aulas práticas e teóricas, além de visitas guiadas a locais icônicos como o calçadão de Copacabana e as calçadas do Theatro Municipal e da Cinelândia. Em sala, os participantes puderam conhecer a história da calçada portuguesa, ter noções de empreendedorismo e aprender sobre segurança do trabalho e utilização de materiais e moldes para confecção desses pisos, entre outros temas.
Cerimônia no Palácio da Cidade de entrega dos diplomas aos calceteiros. Foto: Rafael Catarcione/Prefeitura do Rio
Além de receberem apostila, uniforme, EPI (Equipamento de Proteção Individual), martelinho e todo o material necessário, os alunos tiveram aulas práticas com Gedião Azevedo, único mestre calceteiro que hoje atua na conservação destes pisos na cidade. Ele orientou a turma na confecção do mosaico comemorativo do Bicentenário da Independência, na Quinta da Boa Vista, e nos reparos em trechos das calçadas da Praça General Tibúrcio, na Urca, e do calçadão da Avenida Atlântica, na altura do Leme.
A secretária de Conservação, Anna Laura Valente Secco, comemorou: "A profissão de calceteiro é uma arte que precisa ser preservada. Temos orgulho de formar uma turma de trabalhadores aptos a exercer essa função, tão importante para a nossa cidade, repleta de mosaicos belíssimos. É com alegria que anuncio que os alunos desempregados já foram contratados por empresas", declarou.
Já o secretário de Trabalho e Renda, Alexandre Arraes, falou do acesso dos formandos a linhas de crédito: "Estamos fechando o Microcrédito Produtivo Orientado com a InvestRio Sicoob para os que desejarem ter suas MEIs."
Mulheres
Um dos destaques do curso de calceteiros foi a participação feminina. Pela primeira vez, duas mulheres estavam entre os formandos: a técnica em edificações Neusa Maria de Oliveira, de 59 anos, e Nilma Faria de Aguiar, de 55 anos, que já trabalhou como aderecista em escolas de samba e na produção de novelas. Ambas já foram convocadas para uma vaga de emprego.
Neusa aceitou o desafio de entrar em uma área que costuma ser dominada por homens: "Sou uma pessoa inquieta, procuro sempre me atualizar a fim de conseguir um lugar no mercado. Não é fácil, principalmente para quem já passou dos 50. Não tenho medo de trabalhar na rua, debaixo de sol e chuva. E vejo o ato braçal de quebrar as pedras como sendo o lapidar de um diamante", ponderou.
Já Nilma sempre admirou as calçadas em pedras portuguesas e conta: "Gostava de olhar os desenhos em lugares como o Largo da Carioca e o Castelo. O curso abriu meus olhos para a importância de colocar bem as pedras, de maneira que o resultado fique, além de bonito, seguro para as pessoas andarem. Não é um trabalho de pedreiro, é uma arte que faz parte da nossa história e precisa ser preservada."
Além da qualificação profissional, um grupo de formandos saiu do curso com uma nova perspectiva. Sete participantes vieram de abrigos da Prefeitura do Rio e estão aptos a trabalhar como calceteiros. Um deles é Fernando Dias Lopes, de 45 anos, que já foi pedreiro, pintor e ajudante de alvenaria, e quando soube do curso, agarrou logo a oportunidade.
Visita ao Palácio de São Clemente
Na semana anterior à formatura, os alunos visitaram o Consulado Geral de Portugal no Rio de Janeiro, onde foram recebidos pela cônsul-geral, Maria Gabriela Soares de Albergaria, e conheceram o Palácio de São Clemente, residência oficial da diplomata. A construção, em Botafogo, tem pedras portuguesas na área externa e em alguns ambientes da parte interna. A secretária de Conservação, Anna Laura Valente Secco, e o secretário de Trabalho e Renda, Alexandre Arraes, acompanharam a visita.
Albergaria enfatizou a importância das calçadas portuguesas: "As pedras portuguesas, para além do valor em termos de história, têm um valor patrimonial também. Estou muito satisfeita por ver que terminaram o curso e estão muito mais capacitados e entusiasmados em seguir essa profissão e a fazer coisas tão bonitas como aquelas que vemos na orla de Copacabana", disse.
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