Boa Vista pode se tornar um bom exemplo de mobilidade

Capital de Roraima conta com suas vias largas para escoar o trânsito. Ciclovias começam a surgir, mas a cidade ainda tropeça em calçadas esquecidas

Notícias
 

Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Marcos de Sousa/ Mobilize Brasil  |  Postado em: 08 de junho de 2022

Ônibus em Boa Vista: 600 pontos simples e 75 abrig

Ônibus em BV: 600 pontos simples e 75 abrigos climatizados

créditos: Fernando Teixeira/Prefeitura de Boa Vista


 

 

Banhada pelo rio Branco, a cidade de Boa Vista, capital do estado de Roraima, tem uma área urbanizada de 133 km²  onde vivem cerca de 420 mil pessoas. O traçado das vias - largas e com traçado retilíneo, radial em direção ao centro - foi planejado nos anos 1940 e tem permitido a circulação relativamente confortável de sua frota de veículos. Boa Vista conta com aproximadamente 220 mil veículos motorizados, dos quais cerca de 206 mil são de uso particular e individual: 115 mil automóveis e caminhonetes, e mais de 91 mil motonetas e motocicletas. Enfim, é uma cidade densamente motorizada, mas que passou por transformações interessantes nos últimos anos, com o estímulo ao uso da bicicleta e melhorias no transporte público, além da adequação de sua infraestrutura para a circulação mais livre das crianças.

 

A largura das vias na capital roraimense também permite - pelo menos teoricamente - que a cidade tenha calçadas generosas. Na avaliação realizada pela Campanha Calçadas do Brasil, em 2019, Boa Vista obteve a média 6,13 (numa escala de zero a dez), porque embora tivesse locais com excelente acessibilidade e caminhabilidade, também apresentava vias sem passeios, ou com pavimentos bastante danificados.


Mas, apesar disso, foi a melhor capital entre todas na Região Norte do país. Justamente naquele ano que a cidade conseguiu um recorde na construção e renovação de suas calçadas, hoje com extensão calculada em pouco mais de 434 km, conforme o Observatório de Boa Vista, uma plataforma de informações sobre o município mantida pela prefeitura. Na mesma página, há também informações sobre a oferta de transporte público: "são 80 ônibus, 100% acessíveis, operando em 17 linhas, atendendo a todos os 57 bairros do município, como também as áreas de interesse social", segundo o Observatório.


O recurso a essa plataforma pública e à Lei de Acesso à Informação foram as saídas encontradas pela equipe do Estudo Mobilize 2022 para obter dados sobre a mobilidade na capital roraimense, uma vez que Boa Vista foi uma das poucas capitais que não atenderam às insistentes solicitações da equipe.

 

Ciclofaixa em avenida de Rio Branco: infraestrutura ainda está restrita às áreas mais centrais. Foto: PMBV

 

Apesar dessa dificuldade, o trabalho contou também com a colaboração de Karen Andrade, estudante de Arquitetura e Urbanismo na UFRR e parceira local para a avaliação das condições de mobilidade na cidade. Embora em seu dia a dia ela use um carro próprio ou um táxi-lotação para circular pela cidade, no período de avaliação ela procurou experimentar outras formas de transporte, como os ônibus e o simples caminhar. "Foi uma experiência nova para mim e hoje vejo que adquiri um novo olhar, ideias e pensamentos mais sensíveis para os problemas da mobilidade urbana", explicou em uma entrevista ao Mobilize Brasil.


Qual é a sua percepção geral sobre a mobilidade em Boa Vista? Há boa oferta de transportes? 
A mobilidade em Boa Vista é razoável, mas avalio que há pontos críticos que precisariam de requalificação. Nos últimos anos, houve um aumento considerável na circulação de pessoas e veículos na cidade, mas ainda assim não há grandes engarrafamentos que geram atrasos nos trajetos cotidianos. 

Os ônibus do transporte coletivo cumprem bem, com regularidade, os horários previstos, o que também pode ser acompanhado por meio de um aplicativo. Mas, o sistema não consegue atender à demanda,  especialmente nos horários de início e fim do horário comercial e escolar. O resultado é que os ônibus ficam superlotados nesses momentos do dia. Nessas horas, a alternativa são os táxis-lotação, carros regulamentados pela prefeitura, que fazem o mesmo percurso dos ônibus. Carros de aplicativos estão com oferta baixíssima, em qualquer horário do dia.

 

Táxis-lotação: transporte regulamentado pela prefeitura. Foto: Fernando Teixeira/Prefeitura de Boa Vista


Como estão as tarifas? Os valores são adequados para a renda da cidade?
Veja, o ônibus custa R$ 4,50, o táxi-lotação sai por R$ 5,75, e uma viagem média em carro por aplicativo custa entre 10 e 15 reais, no valor normal. O sistema público de ônibus conta com cartões de descontos para os passageiros, por exemplo para estudantes. Ainda assim, considerando o desembolso mensal, o valor da tarifa inteira pesa muito para os trabalhadores e principalmente para os desempregados.

 

E quanto aos pedestres e ciclistas? A infraestrutura para a mobilidade ativa está sendo bem organizada?
Nos últimos anos Boa Vista tem recebido um número considerável de refugiados da Venezuela; Este grupo de pessoas tem se deslocado, em sua maioria, por meio de bicicletas e a pé. E já faz algum tempo, muitas pessoas passaram a praticar o ciclismo por esporte ou hobby. Acredito que para atender a essas novas demandas a prefeitura tem implantado algumas ciclovias na cidade, mas quase sempre na área mais central da cidade. E noto que alguns pontos são conflituosos com o tráfego dos automóveis. 

 Mapa cicloviário de Boa Vista: conforme o Observatório de Boa Vista, a cidade conta com 42,7 km de ciclovias,
um índice elevado em comparação com a população e a área urbanizada. 
Imagem: Observatório de Boa Vista


Voltando aos pedestres, houve algum avanço recente para melhorar a caminhabilidade, as condições para quem prefere, ou precisa caminhar?
Embora nos últimos anos a cidade tenha instalado semáforos e sinalização para pedestres, eles ainda não contam com assistência e infraestrutura suficiente para caminhar nas ruas de Boa Vista. As calçadas e passarelas são inconstantes e irregulares, principalmente nas periferias, onde as pessoas são obrigadas a caminhar pelo asfalto ou na terra crua. Nas praças e parques construídos mais recentemente estão sendo introduzidos recursos de acessibilidade, mas as pessoas com limitações físicas ainda enfrentam muitas dificuldades. 

 

Boa Vista é banhada pelo rio Branco. Existe algum transporte hidroviário?
O rio faz parte da vida da cidade, mas principalmente para o lazer. Existem barcos que fazem a travessia até a margem oposta e algumas embarcações que levam as pessoas para passeios nas praias ao longo do rio Branco. Mas não existe nenhum transporte público coletivo hidroviário.


Por fim, a cidade tem canais de participação para que as pessoas possam discutir e interferir nas políticas de mobilidade?
Há plataformas da prefeitura direcionadas para mobilidade, habitação e outros temas. Mas, o retorno nem sempre é imediato. Além disso, população também se posiciona nas redes sociais dos órgãos responsáveis por mobilidade 

 

Um passeio por Boa Vista 
Se quiser, veja também um vídeo de JP Amaral, criador e ativista do projeto Bike Anjo para o canal Bike é Legal, mantido pela jornalista Renata Falzoni. É um passeio de bicicleta por Boa Vista, mostrando vários avanços conquistados pela cidade. Mas, atenção: o relato foi feito há quase três anos - quando Boa Vista estava sob outra gestão municipal - e alguns projetos apresentados pelo JP podem ter sido descontinuados.

 Clique e veja vídeo. Imagem: Bike é Legal/ Reprodução


Plano de mobilidade
A equipe do Mobilize Brasil não obteve resposta da Prefeitura de Boa Vista em relação aos dados sobre a mobilidade na cidade ou sobre seu plano de mobilidade urbana. Mas, fontes externas indicaram que a gestão municipal está neste momento realizando cotações para o plano que a cidade deve elaborar para atender à Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei 12,587/2012). Se Boa Vista conseguir racionalizar a circulação dos automóveis particulares e seguir investindo em ciclovias, calçadas e na melhoria do transporte público, a cidade poderá se tornar um dos melhores exemplos brasileiros em mobilidade urbana sustentável.

 

Este texto integra o trabalho de preparação do Estudo Mobilize 2022, um levantamento da mobilidade urbana nas 27 capitais brasileiras que está sendo realizado pelo Mobilize Brasil.

 

 

Leia também:
Curitiba aposta seu futuro na renovação do BRT
Vitória (ES) persegue a via da mobilidade sustentável
Salvador, a cidade dos elevadores, busca hoje o transporte sobre pneus
Brasília em busca de uma nova utopia
Florianópolis e o desafio de tirar carros das vias

Comentários

Graciete Guerra da Costa - 08 de Junho de 2022 às 20:33 Positivo 1 Negativo 0

Parabéns Karen pelo seu excelente trabalho! Vc nos trás orgulho do Curso de Arquitetura de Boa Vista!!

Clique aqui e deixe seu comentário