Um estudo do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), divulgado nesta quinta-feira (26), mostra que a qualidade do ar na capital paulista permaneceu acima dos níveis recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) ao longo dos últimos 22 anos.
Segundo a nota técnica publicada pelo instituto, as emissões veiculares, ou seja, aquelas devidas ao trânsito de carros, motos, caminhões e ônibus, foram as maiores responsáveis pela má qualidade do ar na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). O estudo aponta que os poluentes do ar têm efeito agudo e crônico na saúde, levando ao desenvolvimento de doenças do sistema respiratório, como asma, além de agravar condições cardiovasculares.
Mesmo nos anos pandêmicos (2020 e 2021) os poluentes atmosféricos material particulado (MP2,5 e 10), ozônio (O3) e dióxido de nitrogênio (NO2) estiveram aquém do que a organização considera seguro para a saúde pública. Em alguns pontos da cidade, a ultrapassagem foi de quatro vezes o indicado. Além disso, no ano passado, nenhuma estação de monitoramento da qualidade do ar da cidade atendeu aos limites estabelecidos pela OMS com relação aos três poluentes.
"Existia uma noção geral de que o ar estava mais limpo por conta da redução da circulação das pessoas na cidade, mas verificamos no estudo que isso não aconteceu", afirmou David Tsai, gerente de projetos no Iema e coordenador deste estudo sobre a poluição do ar no município.
Segundo o pesquisador, "a redução da circulação foi drástica apenas nas primeiras semanas de isolamento, e o consumo de combustível na cidade no primeiro ano de pandemia não foi significativo ao ponto de eliminar a poluição do ar", acrescentou.
Os três poluentes
A análise realizada pelo Iema observou a evolução anual das concentrações dos três poluentes citados acima (MP, O3 e NO2) entre os anos de 2000 a 2021. Em relação ao dióxido de nitrogênio (NO2), houve redução das suas concentrações na atmosfera sobre São Paulo ao longo destes 20 anos. Segundo Tsai isso pode ser explicado pela presença do Programa de controle de emissões veiculares (Proconve), iniciado em 1986, que reduziu as emissões dos veículos na cidade. Mas em 2021, com a introdução de uma nova diretriz de qualidade do ar da OMS, os valores de concentração de poluentes considerados seguros à saúde foram reduzidos.
Com esses novos valores da OMS, o dióxido de nitrogênio na cidade passou a ser visto como distante do ideal. Por exemplo, a queda do NO2 na estação de monitoramento do Ibirapuera foi de 41 microgramas por metro cúbico (µg/m3) para 24 no período analisado, quando o número mínimo recomendado pela OMS é de 10. Isto significa que o local ainda tem o dobro da concentração indicada pelo conhecimento da ciência médica atual.
Já a estação de monitoramento da Marginal Tietê, que sofre o efeito imediato das emissões dos poluentes pelos veículos dada a proximidade com a via de tráfego, registra 49 (µg/m3) para o poluente, quase cinco vezes mais do que o recomendado.
Material particulado
O estudo também avaliou a concentração do material particulado 2,5 (mais fino) e do material particulado 10. Entre outros, ambos são emitidos pela combustão e também pelos desgastes das peças dos veículos e pelos atritos com a pista. A recomendação da OMS é de 15 microgramas por metro cúbico para o limite que uma estação de monitoramento deve registrar referente ao MP10. Porém, a estação mais limpa da cidade no ano de 2021 - estação Santo Amaro - apresentou 21 para o poluente. E, as piores do ano - Parque D. Pedro II, Perus e Marginal Tietê -, 30 (o dobro). Aliás, diversos outros pontos da cidade registraram valor próximo.
Com relação ao MP2,5, a situação está ainda mais inapropriada. A recomendação da OMS para este poluente é de 5 microgramas por metro cúbico. A estação Marginal Tietê registrou 19, quase quatro vezes mais do que o preconizado. E o melhor valor colhido, no Pico do Jaraguá, foi de 11, mais que o dobro do indicado.
Sobre os dados
A OMS estima que 7 milhões de pessoas morrem por ano em decorrência da poluição do ar no mundo, sendo 300 mil na região das Américas. A poluição afeta todos os órgãos do corpo humano - e demais seres vivos.
“O objetivo da nossa nota técnica é alertar a necessidade de se reduzir as emissões de poluentes em São Paulo. Para isso, precisa-se reduzir radicalmente a circulação de veículos na cidade, investindo em transporte público e transporte ativo”, diz Tsai.
Quanto mais perto uma pessoa vive ou trabalha em uma via de alto tráfego, mais ela respira esse ar poluído. Se a estação de monitoramento do Pico do Jaraguá - local de maior altitude, longe das fontes emissoras e dentro de um parque - apresenta recomendações acima do que indica a OMS, isso mostra que a cidade como um todo é poluída.
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