Ciclovias em SP: legado positivo supera defeitos

Reproduzimos reportagem do jornalista Gustavo Basso, que fez um balanço dos 10 anos de implantação da rede cicloviária na capital paulista

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Fonte: Yahoo Notícias  |  Autor: Gustavo Basso  |  Postado em: 11 de fevereiro de 2022

Ciclista cruza ciclovia sobre ponte em 2014

Ciclista cruza ciclovia sobre ponte em 2014

créditos: Fábio Arantes Secom/Prefeitura de S.Paulo



Pouco mais de dez anos se passaram desde que a Prefeitura de São Paulo retomou a implantação de ciclofaixas e ciclovias na capital paulista. A malha atual foi iniciada na gestão de Gilberto Kassab, no final de 2011, ampliada para mais de 400 km na gestão de Fernando Haddad, passou por retrocessos durante o governo de João Dória e foi novamente retomada pelo seu sucessor, Bruno Covas. 
Hoje, fevereiro de 2022, a cidade conta com 667,1 km de Ciclovias/Ciclofaixas e 32,1 km de Ciclorrotas, segundo dados da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET/SP).


Esses quase 700 km de infraestrutura cicloviária não são exatamente um paraíso para os ciclistas que circulam na cidade, mas certamente estimularam o uso da bike na cidade. E vias importantes seguem sem essa infraestrutura, o que tem gerado vários sinistros envolvendo ciclistas, como o ocorrido ontem (10) com o entregador Claudenir Cauê dos Santos Queiróz,  na av. Corifeu de Azevedo Marques, zona oeste da cidade. Uma via que está no plano cicloviário da cidade, com previsão de obras para 2022.


Reproduzimos a excelente reportagem de Gustavo Basso, originalmente publicada no site Yahoo, que faz um balanço positivo desse decênio, apesar das falhas, problemas de manutenção e atrasos no cronograma.


A estudante universitária Lis Levisky “nasceu” como ciclista quando a cidade já contava com 380 km de ciclovias e faixas exclusivas, o que a permitiu começar aos 15 anos a percorrer os 7 km que separam sua casa, na Vila Sônia, da escola no Alto de Pinheiros. “Eu não me atrevia pegar avenidas dividindo espaço com os carros”, comenta. “Já deixei de ir a lugares por não ter ciclovia ou similar, por ser mais perigoso, além das ruas esburacadas e mal iluminadas; se não fosse toda essa estrutura, certamente eu levaria mais tempo para adotar a bicicleta como meio de transporte, ou talvez nem tivesse conseguido fazer”.


Lis reflete parte da realidade das ciclovias, que como revelado na primeira reportagem desta série, apesar de necessária e sinal de progresso na avaliação de especialistas, acaba deixando de fora a integração das periferias, que historicamente fazem maior uso da bicicleta como meio de transporte por questões econômicas.


Estudos feitos pelo Centro de Estudos das Metrópole (CEM), ligado à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, apontam que a renda dos moradores a 300 metros das ciclovias e ciclofaixas é 43% maior do que a média da cidade de São Paulo. No entorno das estações de bicicletas compartilhadas essa diferença sobre para 223% maior do que a média.


“Um contrassenso observado é a ausência de ciclovias e ciclofaixas em áreas em que grande parte da população não possui automóvel”, avaliam os autores da nota, que afirmam que pessoas negras além de ter menor renda, ocupam localizações da cidade que dão menos acesso a empregos por transporte público, incluindo a malha cicloviária.


Morar perto a até 500 metros de uma ciclovia aumenta em 154% a chance de usar a bicicleta como meio de transporte em São Paulo, segundo um estudo feito por pesquisadores da USP com a Universidade de Melbourne, na Austrália. A pesquisa avaliou ainda que o transporte sobre trilhos em um raio de até 1.500 metros aumenta em 107% a chance de usar a bicicleta.

 


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apa cicloviário de São Paulo (fev 2022). Clique para acessar  Imagem: Reprodução CET/SP

 

Seis anos após começar a pedalar para deslocar, Lis agora tem habilitação para dirigir o carro da família, porém continua priorizando a bicicleta, Ela diz entender melhor o risco que representa o compartilhamento das faixas de trânsito. “Existe muito motorista imprudente, mas também vejo que há muita coisa para prestar atenção; se antes eu tinha um pensamento de usar a rua ‘porque sou menor, tenho a preferência e você que lide’, hoje entendo que é uma questão muito mais complexa.


Complexidade que só é tratada, compreendida e abordada com profundidade quando debatido pela sociedade – processo este que começou a cerca de uma década e se estende, na visão de Renata Falzoni. “Hoje há um legado cultural até mensurável; a sociedade passou a ver que onde há ciclovia, não há mortes, a população aprova a iniciativa”, defende.

O último estudo da Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) aponta que mais de 80% da população de São Paulo e Rio de Janeiro concorda que o poder público deve investir mais em um sistema de transporte que priorize deslocamentos de bicicleta e a pé após a pandemia e é favorável à implementação de novas ciclovias e ciclofaixas na cidade.


“É uma tristeza termos nos colocado diante do dilema de fazer mal feito ou não fazer, mas é o que vivemos no Brasil; de todo modo, não há dúvida que os últimos dez anos, mesmo entre falhas e erros, os avanços nesse campo foram enormes”, conclui Valter Caldana. “Foi excelente, necessária, e caso não houvesse ocorrido, seria uma catástrofe”.


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