Faixa Azul para motos: o teste continua em SP

CET/SP ainda não tem um balanço sobre a experiência com a nova faixa preferencial para motociclistas. Objetivo é reorganizar o trânsito na via e reduzir acidentes

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Marcos de Sousa/Regina Rocha  |  Postado em: 03 de fevereiro de 2022

Faixa Azul, espaço preferencial para motociclistas

Faixa Azul, espaço preferencial para motociclistas

créditos: CET/SP


No dia 25 de janeiro a Prefeitura de São Paulo inaugurou a "faixa azul", corredor de motociclistas na av. 23 de Maio, uma das principais vias da capital paulista. Passados dez dias, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET/SP) ainda não tem um balanço dos resultados, mas informou que está monitorando com atenção especial o trânsito na área para avaliar a intervenção, processo que pode seguir por vários meses, segundo a companhia.


O tráfego na nova faixa não é obrigatório, mas basta passar pela via para notar que a maioria absoluta dos motociclistas aderiu à novidade. Em parte, porque a intervenção simplesmente demarcou claramente uma área da via que já era utilizada preferencialmente pelos condutores de motocicletas.  Além da sinalização de solo, a intervenção incluiu sinalização vertical, alertando sobre o início e o término da faixa, cuidados e orientações para a mudança de faixas, uso da seta, respeito aos limites de velocidade e a atenção aos sinais de trânsito.

 

A faixa azul também é uma tentativa de responder a um aumento de 40% nos sinistros de trânsito e atendimentos do Samu em 2021, quando comparado com o ano de 2019, antes da pandemia. E, segundo dados da CET, apesar de as motocicletas representarem 15% de toda a frota da cidade, elas estão presentes em 40% dos sinistros.

 

Para a implantação do projeto-piloto a CET escolheu a av. 23 de Maio em razão do grande fluxo de motocicletas no horário de pico - mais de 2 mil motos por hora - e pela frequência de acidentes envolvendo motociclistas: 78% dos sinistros no local se devem a conflitos entre carro e moto. Conforme o texto divulgado pela companhia, a faixa azul baseia-se em dois princípios: o da Visão Zero, em que nenhuma morte no trânsito e aceitável, e o de Sistemas Seguros, para reorientar a forma como a segurança viária é vista e gerenciada. "Um sistema viário seguro ajuda evitar erros dos diferentes usuários e reduz o número de falhas graves que podem resultar em morte ou lesões graves", argumenta a CET em sua nota de lançamento.

 

Aumento da frota e dos riscos
O número de motos vem crescendo na cidade de São Paulo - e em todo o Brasil - ao longo dos anos. Na capital paulista, entre 2018 e 2021, a frota cresceu 30%, passando de 1 milhão para 1,3 milhão de motocicletas, motonetas e scooters, sem contar as bicicletas adaptadas, que recebem motores a combustão. Em entrevista ao jornal "Folha de S. Paulo", o professor de medicina do trânsito da Unifesp, Flávio Adura lembrou que a maior gravidade dos sinistros durante a pandemia pode estar relacionada ao uso mais intensivo das motos para as entregas de compras e para a geração de renda, em um momento de grande desemprego no país. Na entrevista, Adura destacou que os acidentes com motos matam 16 vezes mais do que os outros modos e frisou que o uso do celular - muito comum entre entregadores - aumenta em 400% o risco de um sinistro. "Uma pessoa circulando a 80 km/h e teclando uma mensagem no celular percorre um espaço maior que o de um campo de futebol sem perceber o que está acontecendo a sua volta", alertou Flávio Adura.


Segurança x pressão psicológica
O tema da segurança é amplamente discutido no livro "Risco no trânsito, omissão e calamidade - Impactos do incentivo à motocicleta no Brasil (Editora Annablume, 2016)", de Eduardo Alcântara Vasconcellos.  No capítulo 7, Vasconcellos fez um retrospecto das ações realizadas para reduzir a sinistralidade com as motos e lembra que apesar do esforço feito em várias sociedades, poucas conseguiram reduzir os acidentes em grande escala. "O problema central é que a motocicleta não tem um equipamento eficaz que possa proteger o condutor e seus passageiros...Ademais, os motociclistas têm dificuldade em ver os veículos que circulam por perto e também não são vistos com facilidade por eles", avalia Vasconcellos em artigo para o Mobilize Brasil.


Mas, vários especialistas em mobilidade apontam a pressão psicológica sobre os motociclistas de entregas como a principal razão para seu envolvimento em acidentes. A explicação é simples: a maioria deles ganha por entrega realizada, o que acaba exigindo o trabalho por longas horas, sob pressão dos clientes e do trânsito, e muita rapidez nas entregas, para realizar o maior número possível dessas viagens.  "Eles não tem vínculo empregatício, não tem seguro e são obrigados a cumprir horários fora das leis trabalhistas. Se não for assim, não trabalham... A responsabilidade maior não é deles, mas de legisladores e fiscalizadores que deveriam tentar diminuir esses eventos tão trágicos", resumiu o professor Flavio Adura na entrevista à Folha.


A CET informou que vinha acompanhando essa evolução da frota e notava também um aumento de óbitos em sinistros na cidade. Em 2021, 400 motociclistas morreram nas ruas de São Paulo, ou seja, mais de uma morte por dia, além de outras 7 mil vítimas de acidentes que ficaram com sequelas permanentes, segundo uma análise preliminar da gestora do tráfego paulistano. A proposta da faixa azul nasceu de uma série de estudos que os técnicos da CET realizaram durante os últimos meses em busca de soluções que pudessem trazer mais segurança ao motociclista, de forma compartilhada, e sem segregar espaços. E segundo a nota da companhia, o trabalho levou em consideração experiências em Kuala Lumpur, na Malásia, Copenhague, na Dinamarca, e de cidades da Austrália. E nasceu daí a proposta de desenvolver um projeto-piloto para ampliar a segurança das motocicletas.


Segundo o órgão de trânsito paulistano, para esse trabalho foram realizadas reuniões com técnicos da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) e do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), além de especialistas em mobilidade urbana, Corpo de Bombeiros, instrutores de motocicletas, motociclistas e funcionários da CET, entidades ligadas ao setor de motofretistas, entidades da sociedade civil, além de usuários de motocicletas.

 

Prioridades do projeto
Conforme a CET, o projeto da faixa azul pretende:

- Reduzir conflitos entre autos e motocicletas

- Organizar o espaço compartilhado entre autos e motocicletas

- Conscientizar os motoristas de carros e motocicletas no sentido da melhor utilização das vias

- Pacificar e humanizar o trânsito de São Paulo, ressaltando a importância de todos os modais envolvidos

 

 


Readequação da via
Para a implantação da faixa azul, a prefeitura teve que reorganizar as áreas de circulação no trecho da avenida. Antes eram quatro faixas para carros com 2,5 m a 3 m de largura, além da faixa de ônibus, que em alguns trechos chegava a ter até 5,40 metros de largura. Agora, as quatro faixas para carros têm 2,7 metros e também a faixa de ônibus teve sua largura reduzida. Assim, a nova faixa ficou com pouco mais de 1 metro.


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