Insegurança, medo de assaltos e de sinistros de trânsito é a principal marca no dia a dia dos homens e mulheres que trabalham nas entregas de mercadorias pelas ruas das cidades brasileiras.
O dado alarmante é um dos resultados do estudo "Segurança Viária e Ciclologística: desafios e oportunidades no Brasil”, realizado pela Fundación Mapfre e pelo Laboratório de Mobilidade Sustentável (Labmob/UFRJ) e que ouviu 336 trabalhadores desse setor, além de observar as relações trabalhistas, as condições viárias para a circulação dos entregadores e as melhores práticas das empresas que atuam no setor. O estudo foi realizado nas cidades de Curitiba , Fortaleza e São Paulo, cidade onde foram realizadas as entrevistas.
Veja algumas conclusões da pesquisa:
Os trabalhadores do pedal são majoritariamente homens (92%) -- com média de idade de 26 anos (76% até 30 anos) -- que se autodeclaram pretos e pardos (68%) e trabalham cerca de 7 horas por dia.
85% não possuem nenhum tipo de seguro, seja de saúde, vida ou odontológico, revelando a desassistência e vulnerabilidade desses profissionais.
35% dos participantes do estudo já estiveram envolvidos em acidente de trânsito ou já presenciaram alguma ocorrência, impactando seus comportamentos e percepções.
As 24 entregadoras que participaram do estudo indicam medo de furto/roubo/assalto, de acidentes e da vulnerabilidade em relação aos veículos motorizados. Por meio dos dados, foi possível identificar que elas sofrem tanto sinistros como os homens.
A visão de uma cidade pouco amigável à sua dinâmica de trabalho, além de questões como falta de respeito, educação e desatenção com os ciclistas foram fortemente repetidas como causas dos acidentes de trânsito.
A infraestrutura viária urbana das cidades, que ainda não está totalmente adequada às atividades da ciclologística, também foi mencionada - especialmente a provisão de pontos de apoio que contribuam com a intensa rotina na rua e no trânsito.
Os profissionais toleram muitos riscos. A sensação de insegurança com relação ao trabalho, combinada aos riscos da profissão e falta de assistências encontradas, causam impacto direto na decisão de permanência na profissão. Foi levantado que poucos têm pretensão de seguir trabalhando como entregadores-ciclistas.
A atividade ciclologística ainda é pouco abordada no planejamento nacional urbano e de mobilidade. Ainda que hoje ela seja reconhecida como considerável oportunidade na transição energética e esteja presente em ações em prol da mobilidade ativa - atividade em que a pessoa usa a própria força como propulsora do veículo - ainda há poucas iniciativas e projetos voltados para o dia a dia desses profissionais e sua segurança.
Lançamento
Na live de lançamento realizada hoje (12), participaram os coordenadores do estudo, Victor Andrade e Jéssica Lucena (Labmob), Fátima Lima, representante da Fundación Mapfre, Zé Lobo, da organização Transporte Ativo, e da jornalista, ciclista e vereadora Renata Falzoni, além de representantes de prefeituras das cidades avaliadas.
Zé Lobo e Renata Falzoni lembraram que as entregas por bicicletas já eram comuns há várias décadas nas cidades brasileiras, mas de forma quase invisível. Eles destacaram que somente nos últimos anos, com a chegada das empresas de aplicativos, e após a pandemia, os serviços com bicicletas ganharam as ruas de forma mais ampla e mostraram o grande potencial da chamada ciclologística como forma de transporte de cargas urbanas.
Ciclista com cargobike para entrega de encomendas Foto: reprodução do estudo
"Quem já experimentou pilotar uma cargobike com 15 kg ou 20 kg de mercadorias sabe das dificuldades que esses trabalhadores enfrentam pela simples ausência de uma guia rebaixada", lembrou Renata Falzoni. Não por acaso, a falta de ciclovias bem estruturadas na maior parte das ruas das cidades, além da velocidade ameaçadora do trânsito, são alguns dos pontos mais destacados pelos trabalhadores entrevistados.
Com a pesquisa, explicou o professor Victor Andrade, espera-se que as autoridades compreendam a importância dessa atividade para reduzir o trânsito, as emissões de carbono e a poluição urbana. E que invistam na infraestrutura para melhorar as condiçoes de circulação das bicicletas de carga, além de todas as bikes que trafegam pelas cidades. Não custa lembrar que cada bicicleta significa um carro a menos nas ruas. E também vale lembrar que pedestres e cadeirantes também sofrem perrengues todos os dias nas ruas de todas as cidades.
Para ler o relatório simplificado, clique aqui e baixe o arquivo em formato PDF.
Se preferir, acesse o site da Fundación Mapfre
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