Em Florianópolis, uma obra de acessibilidade vem provocando polêmica entre técnicos da Prefeitura, população e agora também o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), que nesta segunda-feira (8) esteve no local juntamente com associações de deficientes.
Trata-se da obra de revitalização da Avenida das Rendeiras, na Lagoa da Conceição, onde na semana passada começaram a ser instalados pisos táteis em trechos da nova calçada. Mas a colocação do piso “guia” bem na ponta da calçada causou estranhamento na maior parte das pessoas que passaram no local.
Para a arquiteta Meli Malatesta, especialista em mobilidade a pé, o piso tátil, do modo como foi construído em Florianópolis, indica sim alguma "duplicidade na interpretação da NBR 9050, se comparado por exemplo ao uso desse elemento como é feito na capital paulista", observa.
Segundo ela, "em São Paulo, o piso tátil direcional, que é aquele elemento que está na continuidade do limite do lote, é colocado no eixo do caminho, seja este percurso situado num passeio ou mesmo nos trajetos para se chegar na área de embarque do transporte, como o metrô por exemplo."
A especialista aponta outro problema na obra em andamento em Florianópolis: "Pelo que vi na imagem [a ilustração utilizada pelo Ipuf], me causou estranheza o fato de usarem o piso tátil direcional e não o piso tátil de alerta, que seria mais apropriado para este tipo de situação".
Na imagem ilustrativa do manual de calçadas, cego segue rente ao muro, guiado pelo piso. Imagem: Divulgação/PMF
Segundo Malatesta, "o piso direcional deve guiar o caminho a ser seguido pelo deficiente, e o de alerta [bolinhas] servir para advertir sobre algo à frente, o que parece ser o caso em questão na capital catarinense", conclui.
Essa avaliação coincide com a do MPSC, que fez uma vistoria no local nesta segunda-feira (8) com associações de deficientes visuais. Uma das questões levantadas foi que há trechos onde o piso tátil fica logo acima da água, o que pode levar a um maior risco de quedas. Segundo as autoridades, a colocação na borda da calçada está errada; o correto seria a instalação ali de pisos de alerta.
Ainda sobre o piso direcional, Meli abre um parêntese para relativizar seu uso: "A questão é que as mesmas saliências que servem para serem percebidas pela bengala do deficiente visual, acabam perturbando o deslocamento de cadeirantes e mesmo de idosos, que têm o andar mais arrastado", diz.
O que diz a Prefeitura
No site da Prefeitura de Florianópolis, a informação é de que não há erro algum na colocação, e de que a construção do piso tátil foi feita em conjunto com técnicos do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf) e associações de deficientes, obedecendo às normas técnicas da ABNT e do Manual Calçada Certa.
Em nota, o Ipuf explica que, de acordo com a norma, nos trechos onde há muro, o elemento tátil deve servir de anteparo para ajudar o caminhar dos cegos, de pessoas com baixa visão ou mesmo de cadeirantes e idosos. Já nos locais onde não há edificações ou muros, como às margens da Lagoa da Conceição, a instalação do piso guia será feita acompanhando a borda da calçada.
Mas, justamente essa localização no limite da calçada fez com que muita gente colocasse em dúvida se dará segurança para quem não enxerga bem. Também aqui os técnicos esclarecem que a função do elemento podotátil não é servir para o cego caminhar sobre ele, como muitos imaginam, mas servir de sinalização ao guiar os passos do deficiente visual, que usará a bengala para identificá-lo.
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