Programas são apenas programas. Podem ser esquecidos tão logo os eleitos assumam seus cargos nas prefeituras. Afinal, a Lei 9.504/97 , que regula as eleições, obriga os candidatos a apresentarem programas à Justiça Eleitoral, mas não estabelece nenhuma penalidade, caso o eleito não seja fiel ao que prometeu ao eleitorado. De qualquer forma, apresentamos aqui uma breve análise das proposições dos cinco candidatos que lideram as pesquisas de intenção de voto para a Prefeitura de São Paulo. Checamos também os programas de Andrea Matarazzo (PSD), Antonio Carlos (PCO), Arthur do Val (Patriota), Joice Hasselmann (PSL), Levy Fidelix (PRTB), Marina Helou (Rede), Orlando Silva (PCdoB), Felipe Sabará (Novo) e de Vera Lucia (PSTU) e, com exceção de Antonio Carlos, Fidelix e Vera Lucia, todos os demais abordam o tema da mobilidade com algum traço de sustentabilidade.
Os programas registrados no TSE pelas candidaturas de Celso Russomanno (Republicanos), Bruno Covas (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL), Márcio França (PSB) e Jilmar Tatto (PT) apresentam propostas até relativamente avançadas em assuntos como ciclovias, mobilidade a pé e transporte público, além de incluir mecanismos de participação social em todos planos e projetos de mobilidade. E em maior ou menor medida reconhecem os prejuízos implicados na ocupação desigual da cidade e na própria lógica de concentração de investimentos. Mas, há, evidentemente, diferenças. Vamos a elas...
Dos cinco candidatos analisados, dois deles - Boulos e Tatto - oferecem propostas mais objetivas e atendem a sete dos oito critérios adotados para o quadro de avaliação (ver abaixo), especialmente ao prever medidas para a redução de mortes no trânsito, assunto ainda raro nos programas das capitais brasileiras. Ambos também se destacam ao buscar regulações para aplicativos, criar formas de financiamento extratarifário para o transporte e na descentralização das instâncias decisórias.
Em seu programa, o atual prefeito Bruno Covas aposta no estímulo ao transporte público, novos modais, além da pretensão em incentivar a transição para economia de baixo carbono, priorizando pedestres e bicicletas. Entre os compromissos dessa pauta, ele sugere a integração máxima dos modos de transporte, a implantação de um corredor de ônibus exclusivo para a Zona Leste da cidade, além do projeto de um BRT para a mesma região, com integração da rede cicloviária e conexão com o metrô. Covas também promete a expansão da malha de ciclovias, que deve ultrapassar os 650 km, além da continuidade e ampliação do programa de requalificação de calçadas, a fim de tornar a cidade mais acessível. O prefeito é o único candidato a propor a utilização do modo aquaviário, a partir da criação de um sistema de transporte público por barcos, nas represas da Zona Sul da cidade, em integração com o bilhete único.
O programa de Celso Russomano aponta a necessidade de revisão da política municipal de transportes, com a finalidade de reduzir os impactos no orçamento. Para a promoção e incentivo do transporte público, Russomano sugere a expansão das faixas exclusivas de ônibus e a requalificação do serviço e dos terminais, que poderão ser concedidos à iniciativa privada, para sua exploração comercial.
Na área de mobilidade ativa, o programa compromete-se com a "elaboração/revisão do Plano Cicloviário, integrado ao Plano de Mobilidade do Município", além de reforçar o investimento em projetos de infraestrutura para pedestres e ciclistas.
Plano de logística
Russomanno defende o incentivo à eletromobilidade e "o estímulo em larga escala das substituição de combustíveis fósseis, através de medidas de compensação e controle nas regiões que recebem maior carga poluente". No eixo de meio ambiente e sustentabilidade, o programa se destaca por ser o único a apontar a necessidade de revisão do plano de logística e abastecimento, priorizando o uso os veículos leves, como bicicletas e patinetes, evocando a necessidade de infraestruturas de suporte, como áreas de descanso e de guarda dos pequenos veículos.
O candidato do Republicanos defende, ainda, o fortalecimento da articulação interinstitucional entre os municípios da Região Metropolitana, a fim de melhorar a integração e complementação das políticas de mobilidade da Grande São Paulo. O programa também prevê algumas medidas de modernização de equipamentos, no âmbito da gestão de tráfego, da fiscalização e fluidez do trânsito a partir da CET.
Há também uma "barrigada" no programa de Celso Russomano. O texto propõe a criação de um conselho municipal de transporte que, no entanto, já existe como instância instituída por decreto desde 2013.
Priorizar o transporte público
O programa de Guilherme Boulos é o único a afirmar - de forma taxativa - a prioridade do transporte público, coletivo e ativo sobre o transporte individual, propondo restrições ao uso do carro particular. Entre outras diretrizes, propõe buscar a geração de fundos para o financiamento da mobilidade, melhorar a qualidade do sistema de transporte público, além de trazer a população como agente ativo na proposição, planejamento e revisões do modelo de transporte para a capital.
O candidato também defende a criação de uma autoridade metropolitana de transporte urbanos, em conjunto com os demais municípios da RMSP. Promete implementar a "tarifa zero", a começar pelos desempregados e estudantes, e para viabilizar a proposta, defende a criação de um fundo municipal de financiamento, "com recursos de diversas origens". Sugere também uma auditoria e renegociação dos contratos de concessão de ônibus, buscando avançar numa política tarifária mais subsidiada e menos reguladora da demanda de transporte. O programa do candidato do PSOL também inclui a ampliação dos corredores de ônibus e a substituição mais rápida da frota de veículos da cidade por veículos elétricos ou outros de energia limpa. Ainda em relação ao transporte público, Boulos sugere políticas para combater o assédio sexual contra as mulheres, a criação de linhas de ônibus internas aos bairros, e políticas de acessibilidade nos transportes, privilegiando as regiões periféricas.
No tema de redução de acidentes o programa prevê a manutenção da política de redução de velocidades nas vias urbanas, assim como a promoção e aprimoramento da segurança e qualidade do transporte cicloviário. Fala também em equipamentos de apoio aos ciclistas, como bicicletários nos entornos das estações, com gestão e acesso integrados ao bilhete único. Boulos também promete alargar calçadas, priorizando a mobilidade ativa, especialmente a pé.
Por fim, vale reforçar que o programa do PSOL fala em ampliar, democratizar e descentralizar as instâncias de participação da sociedade civil e propõe a criação do conselho da cidade e o conselho popular do orçamento, medidas que ampliam a transparência e buscam garantir participação social.
O programa de Jilmar Tatto enfatiza a priorização de pedestres e ciclistas e o transporte coletivo sobre o individual. Propõe também a implantação gradativa da "tarifa zero", a criação de uma empresa pública para operar o sistema de transporte municipal e a criação de um sistema público de bicicletas compartilhadas.
O candidato do PT sugere a cobrança de estacionamentos públicos como fonte de financiamento para subsídios para melhorar o transporte coletivo. Defende a revisão dos contratos de concessão dos serviços de transporte, o fim da privatização da Zona Azul e o investimento em infraestrutura para o transporte coletivo, contemplando áreas mais periféricas da cidade.
Mobilidade ativa
Na área de mobilidade ativa, o texto defende a retomada do planejamento cicloviário aprovado pelo Plano de Mobilidade Urbana (PlanMOb), que previa a expansão da rede em 500 km a cada quatro anos, com prioridade para a conexão entre ciclovias e transposições dos rios, viadutos e pontes e novas ciclovias/ciclofaixas na periferia. Inclui também a criação de bicicletários e de um sistema público de bicicletas compartilhadas, além de um programa de incentivo financeiro para compra e manutenção de bicicletas.
Para a mobilidade pedestre, Jilmar Tatto promete a construção de calçadões e superquadras exclusivas para pedestres, a implantação de vias de trânsito compartilhado, com baixa velocidade e - atenção todos - a retomada da responsabilidade pelo prefeitura da construção e manutenção das calçadas, assumindo o compromisso de readequação dessas infraestruturas em territórios vulneráveis, como favelas e periferias. Por fim, a candidatura se propõe trabalhar para reduzir as mortes no trânsito, criar zonas calmas e adaptar os tempos semafóricos para travessias seguras.
No programa de Márcio França a melhoria da qualidade da mobilidade urbana, junto da garantia de participação social, figuram como duas das diretrizes centrais para um futuro governo. Das 40 propostas apresentadas, três dedicam-se exclusivamente ao tema: congelamento da tarifa atual do transporte público e estratégia de subsídio visando à gratuidade em feriados e domingos; reestruturação do conceito de transporte e mobilidade da cidade; e bilhetagem transparente. França pretende também avaliar a retomada de linhas de ônibus extintas pela atual gestão e ampliar o tempo de integração do bilhete único.
Na área de mobilidade ativa, o texto propõe a promoção de conexões urbanas através da rede cicloviária e a oferta de mais bicicletários e ciclovias, estimulando a integração com o transporte coletivo. ampliação de passeios em locais de grande fluxo e alta densidade, priorizando ciclovias e passarelas. Sugere também a criação de serviços de cadeiras de rodas elétricas compartilhadas e a priorização da locomoção não motorizada no centro da cidade. Na área de logística, o texto prevê um fórum para a construção de políticas públicas entre prefeitura e operadores de transporte.
Como os candidatos tratam a mobilidade sustentável: clique e veja
Se quiser, leia na íntegra os programas de todas as candidaturas de São Paulo:
Andrea Matarazzo (PSD)
Antonio Carlos (PCO)
Arthur do Val (Patriota)
Celso Russomanno (Republicanos)
Guilherme Boulos (PSOL)
Joice Hasselmann (PSL)
Levy Fidelix (PRTB)
Marcio França (PSB)
Marina Helou (Rede)
Orlando Silva (PCdoB)
Felipe Sabará (Novo)
Vera Lucia (PSTU)
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