Como avaliar as sensações de caminhar pela cidade

Comportamento das pessoas durante prática é avaliado por aplicativos, sensores e dados de celulares no projeto "Walk & Feel", escreve Claudio Bernardes, do Secovi/SP

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Fonte: Folha de S.Paulo  |  Autor: Claudio Bernardes*  |  Postado em: 08 de maio de 2020

Baixa caminhabilidade, altos níveis de estresse

Baixa caminhabilidade, altos níveis de estresse

créditos: Projeto Walk & Feel


Quando se fala em mobilidade, pouca ou nenhuma atenção é dada à apropriação dos espaços públicos para que as pessoas possam caminhar com facilidade e comodidade. Essa característica é definida na língua inglesa pelo termo walkability, que podemos traduzir como “caminhabilidade”.

 

Essa falta de atenção ao caminhar como modo de transporte tem como consequência a escassez de dados estatísticos sobre o desenvolvimento desse processo e, portanto, da dificuldade em compreender a sua importância e seus potenciais efeitos positivos no modelo de mobilidade de uma cidade.


A caminhabilidade, numa conceituação mais ampla, deve incluir fatores quantitativos relacionados à infraestrutura de forma geral, e fatores qualitativos relacionados à percepção de segurança, sensibilidade estética, bem-estar etc.


Contudo, todos os aspectos relacionados a esses fatores não têm sido mensurados e tratados estatisticamente, de forma a permitir a utilização dos resultados para compreender melhor a caminhabilidade e estruturar as melhorias necessárias para otimizá-la como modo de transporte eficiente, seguro e confortável. Por essa razão, pesquisadores liderados por Linda Doerrzapf, do Instituto de Planejamento Espacial da Technische Universität, em Viena, na Áustria, procuraram desenvolver um modelo que pudesse avaliar de forma científica e estatística a caminhabilidade.


Para os cientistas, a abordagem para avaliar indiretamente o caminhar pode ser efetuada por meio da observação sistemática do comportamento das pessoas no espaço urbano, usando dados de celulares, sensores, aplicativos e câmeras permanentemente instaladas.


Numa primeira etapa, os pesquisadores propõem que sejam avaliadas as percepções e as emoções por meio de biossensores: pulseiras ou cintas toráxicas que medem dados fisiológicos em tempo real, como atividade eletrodérmica, temperatura da pele e batimento cardíaco. A fusão desses resultados, por meio de modelagens adequadas, pode trazer informações relacionadas às emoções experimentadas ao longo do percurso.


Como uma segunda etapa, preconizam a utilização de um aplicativo para celulares desenvolvido em conjunto por psicólogos e planejadores urbanos, que permite ao usuário inserir suas percepções subjetivas com respeito ao meio ambiente.


Dessa forma, os dados medidos pelos sensores e as informações inseridas no aplicativo são relacionadas umas com as outras, permitindo a identificação das reações psicológicas humanas no ambiente físico. A obtenção de resultados confiáveis sobre as reações humanas no contexto urbano permitirá o desenvolvimento de algoritmos apropriados para sua validação em ambientes fora do estudo experimental. Com isso, será possível uma avaliação mais precisa das reações psicológicas dos pedestres como indicador de caminhabilidade.


A abordagem sugerida pelos pesquisadores promove a avaliação da capacidade e da sensação de caminhar com uma compreensão mais holística, e pode ajudar a melhorar as condições dos pedestres e a qualidade de vida nas áreas urbanas. Portanto, é vital poder coletar dados abrangentes e de alta qualidade, como base para uma avaliação precisa das características e dos atributos da caminhada.


Determinar parâmetros e coletar dados para a detecção de emoções é um desafio relevante para os estudos. Por outro lado, questões relacionadas à privacidade devem ser levadas em consideração ao se estruturar um programa de pesquisa.


De qualquer maneira, a abordagem fundada nas sensações e reações psicológicas dos pedestres aos espaços urbanos, tratada de forma científica e estatística, deve contribuir em muito para que se assegure a caminhabilidade nas cidades, beneficiando de maneira significativa os sistemas de mobilidade.

*Claudio Bernardes é engenheiro civil e presidente do Conselho Consultivo do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi). Presidiu a entidade de 2012 a 2015. Artigo originalmente publicado na edição de 4mai2020 do jornal Folha de S. Paulo


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