Transporte público é mais caro para o brasileiro

Comparação entre tarifa e renda média explica porque o brasileiro está deixando ônibus e trens e migrando para motos, bikes e apps de carros

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Fonte: Mobilize Brasil  |  Autor: Marcos de Sousa*  |  Postado em: 18 de janeiro de 2019

Ônibus em Belo Horizonte: tarifa alta pesa no bols

Ônibus em Belo Horizonte: tarifa alta pesa no bolso

créditos: Adão de Souza/Pref. de Belo Horizonte

Novas tarifas de transportes públicos marcaram o início do ano de 2019 em todo o Brasil. E em muitas cidades os reajustes superaram - de longe - a inflação dos últimos doze meses. É o caso de São Paulo, onde o aumento passou de 7% e corresponde ao dobro da inflação. Ou Aracaju, onde a prefeitura elevou a tarifa de R$ 3,50 para R$ 4, um aumento de 14,2%.  

 

Na capital sergipana, que agora tem a mais alta tarifa do Nordeste, uma pessoa que use o transporte duas vezes por dia durante o mês gastará cerca de R$ 240, quase 1/4 da renda média mensal de R$ 1.022,00, segundo a pesquisa anual do IBGE. Como se trata de renda média, o impacto desse valor é muito maior para as famílias de baixa renda, que ficam quase impedidas de utilizar o transporte "público".  

 

A constatação, em maior ou menor grau, vale para a maioria da cidades do país, como Curitiba e Londrina (R$ 4,25), Florianópolis  e Recife (R$ 4,40), Belo Horizonte (R$ 4,05), Uberaba (R$ 3,80), Manaus (R$ 3,80) e São José dos Campos (R$ 4,30). 

 

Os valores parecem modestos quando comparados com os preços de transportes públicos na Europa e Estados Unidos, que chegam até a cinco vezes mais do que as tarifas do Brasil. Mas, não é o que parece. 

 

No mundo
Para jogar luz sobre a questão, o Mobilize realizou um pequeno estudo comparativo entre a tarifa básica do transporte e a renda média em algumas cidades do Brasil e do mundo e notamos que o bilhete diário para ir e vir pesa bem mais no orçamento do brasileiro. Consideramos a tarifa básica como referência, salvo nas cidades onde o valor é variável, como em Xangai, na China, ou em Belo Horizonte (MG). Nestes casos, tomamos o valor médio. Para o cálculo do valor mensal, computamos duas viagens diárias por 30 dias, incluindo saídas nos finais de semana. 

 

Vejamos a região metropolitana de Nova York, por exemplo, com população de 18,2 milhões e área urbanizada de 8.683 km².  Lá, o preço do bilhete básico do metrô está em US$ 2,75 e renda média mensal gira em torno de US$ 5.378, conforme dados de 2017. Assim, o transporte leva cerca de 3% do orçamento do novaiorquino. Se tomarmos o exemplo de Xangai, com área total de 6.340 km² e população de 23,4 milhões, com renda média mensal de US$ 771 (2017) e bilhete médio de US$ 0,59, o transporte pesa 2,92% no orçamento. 


Em São Paulo, com 7.946,96  km² e população de 21,5 milhões em sua região metropolitana, a tarifa básica de R$ 4,30 pesa mais de 12% para o paulistano que receba a renda média mensal de R$ 2.124. Para os milhões de pessoas que ganham bem menos do que isso, o transporte se torna quase inacessível, dificultando até a busca de emprego ou a ida a um posto médico.

 



Tarifa, gasto mensal, renda média e peso do transporte no orçamento


Cidade

Tarifa
básica (US$)

Gasto mensal  (US$)

Renda média mensal (US$)

Peso do transporte no orçamento mensal (%)

         

Shenzhen

0,39

23,40

1.204,87

1,94%

México

0,26

15,60

621,10

2,51%

Los Angeles

1,75

105,00

3.829,39

2,74%

Pequim

0,59

35,40

1.250,97

2,83%

Xangai

0,59

35,40

1.210,64

2,92%

Nova York

2,75

165,00

5.407,83

3,05%

Washington

2,75

165,00

4.758,60

3,47%

Buenos Aires

0,35

21,00

580,78

3,62%

Tóquio

1,84

110,40

2.969,52

3,72%

Kuala Lumpur

0,73

43,80

1.025,76

4,27%

Moscou

0,75

45,00

958,99

4,69%

Paris

2,18

130,80

2.544,21

5,14%

Bern

4,27

256,20

4.874,48

5,26%

Melbourne

3,09

185,40

3.148,28

5,89%

Londres

3,21

192,60

3.229,76

5,96%

Madri

1,72

103,20

1.649,81

6,26%

Roma

1,72

103,20

1.590,34

6,49%

Copenhague

3,69

221,40

3.323,38

6,66%

Montreal

2,45

147,00

2.167,03

6,78%

Amsterdã

3,44

206,40

2.989,64

6,90%

Santiago

1,07

64,20

824,43

7,79%

Berlim

3,22

193,20

2.427,91

7,96%

Lisboa

1,71

102,60

994,28

10,32%

Brasília

1,36

81,60

687,39

11,87%

Rio de Janeiro

1,06

63,60

525,67

12,10%

São Paulo

1,16

69,60

567,45

12,27%

Medelin

0,70

42,00

331,08

12,69%

Salvador

1,00

60,00

437,62

13,71%

Porto Alegre

1,16

69,60

502,46

13,85%

Curitiba

1,15

69,00

452,56

15,25%

Florianópolis

1,13

67,80

434,53

15,60%

Recife

0,87

52,20

329,90

15,82%

Belo Horizonte

1,22

73,20

438,79

16,68%


Fontes:
1) IBGE (https://www.ibge.gov.br/estatisticas-novoportal/sociais/trabalho/17270-pnad-continua.html?=&t=resultados)
2) Numbeo (https://www.numbeo.com/cost-of-living/)
3) Statista (https://www.statista.com/topics/768/cost-of-living/)
4) Prefeituras e companhias de transporte das cidades 
Nota: foram consideradas as tarifas básicas do sistema de transportes aferidas em cada cidade no mês de janeiro de 2019. Para o cálculo do gasto mensal com transporte, foram computadas duas viagens diárias durante 30 dias por mês. Os dados de renda média mensal de cidades brasileiras foram obtidos da pesquisa Pnad/IBGE de 2017. Os das cidades estrangeiras foram compilados dos sites Numbeo e Statista.

 


O gráfico e a tabela talvez expliquem porque os brasileiros estão preferindo usar aplicativos de carros compartilhados, motocicletas, bicicletas e carros próprios em vez do ônibus. Há que lembrar ainda que boa parte dos ônibus urbanos, terminais e pontos de espera não oferecem um mínimo de conforto e segurança para seus clientes, que pagam muito, viajam apertados e perdem muito tempo na espera e nas viagens cotidianas. Esse composto perverso talvez explique também porque os ônibus são um dos alvos preferidos dos criminosos que desejam afrontar o poder público.  

 

Está aí um belo desafio para os novos governos de Brasília e dos estados. Transparência nos custos e subsídio são as palavras-chave para desatar esse nó.

 

*Colaboraram: Regina Rocha e Marília Hildebrand

 

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