Belo Horizonte teria espaço para abrigar mais 65 praças da Liberdade (área pública de 35 mil m²) se as vagas destinadas a carros nas ruas não fossem mais necessárias. O levantamento, feito pela 99, empresa e aplicativo de transporte individual, considera somente o número de carros parados nas vias entre 10h e 11h, em 155 bairros da capital.
O estudo ainda chama a atenção para a ocupação de vagas em regiões próximas a estações de metrô e plataformas de ônibus, o que indica que muitas pessoas têm feito parte do trajeto de carro, aliando com o transporte público. Na avaliação de especialistas, a mobilidade intermodal é necessária, mas, para ser eficiente, o poder público precisa encarar o desafio de integrar melhor a rede e fortalecer o transporte público e outros tipos de modais.
“O nosso serviço é complementar. Alimentamos a rede de transporte público com passageiros”, diz o gerente de políticas públicas da 99, Christian Baines. Muitas viagens realizadas pelo aplicativo começam ou terminam nas redes de transporte público e, segundo ele, o serviço da empresa reduz a demanda por estacionamento.
Em outras capitais
Em São Paulo, a estimativa da empresa é que 80 mil vagas por dia não são mais necessárias: “As pessoas estão deixando de usar automóvel por causa do custo e da facilidade dos aplicativos. Espaços enormes dedicados a carros parados poderiam ser áreas de convivência, calçadas maiores e ciclovias”.
No Rio de Janeiro, a 99 fez uma parceria com o transporte público: quem utilizava o metrô ganhava desconto nas corridas do aplicativo.
Esse tipo de parceria é interessante, na opinião do coordenador de Políticas Públicas do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (IPTD), Bernardo Serra, e o poder público deve promover incentivos para que usuários não façam toda a viagem por aplicativo, mas também usem o transporte público. “Os aplicativos são interessantes porque desestimulam as pessoas a pegarem o próprio carro. Mas, ao mesmo tempo, acabam atraindo pessoas que usariam o transporte público”.
Segundo Serra, a mobilidade intermodal é necessária, mas as redes ainda estão pouco integradas. Estudos do IPTD mostram que, em Belo Horizonte, somente 27% da população vive a menos de 1 km de uma estação de metrô ou do BRT. Além disso, menos de 3% das vias da capital possuem alguma prioridade para o transporte público e apenas 38% das estações de média e alta capacidade estão próximas de ciclovia ou ciclofaixa: “O transporte público tem que ser valorizado para atrair mais usuários”.
O assessor parlamentar e estudante Gil Sotero, de 40 anos, usa diferentes modais em BH. Vai da faculdade ao trabalho de bicicleta, e, do trabalho para a casa, além de pedalar, usa metrô e ônibus. “Já avançou bastante, mas ainda pode melhorar. O horário em que permitem bicicleta comum nos ônibus e metrô é reduzido e são necessárias mais ciclovias. Pego ônibus porque, às vezes, não tem como pedalar com calma. Os modais maiores não são receptivos com os outros”, diz.
Números
Vagas: Na capital mineira, há 23.679 vagas físicas com sistema rotativo, que geram 107.069 possibilidades de estacionamento.
Estrutura: A cidade tem, atualmente, 45 km de pista exclusiva para ônibus e um total de 83 km de ciclovias.
Integração: Em SP, 13,2% das corridas da 99 começam ou terminam nas redes de transporte público; no Rio, o índice é de 24,3%.
Aposta em rede intermodal
Por enquanto, não está nos planos da Prefeitura de BH reduzir o número de vagas de estacionamento nas ruas. A ideia, segundo a administração, é fortalecer o transporte público e modais mais sustentáveis, como bicicleta e viagens a pé. Ainda neste ano, devem ser lançadas licitações para contratar projetos de mais 80 km de faixas exclusivas para ônibus e 56 km de ciclovias.
“Primeiro, a gente tem que dar uma oferta boa de transporte e condições para a pessoa deixar o automóvel e migrar para outro sistema”, diz a diretora de Planejamento e Informação da BHTrans, Elizabeth Gomes.
Segundo ela, é importante incentivar a mobilidade intermodal para reduzir o número de automóveis nas vias. Como forma de estímulo ao uso da bicicleta, o município planeja implementar mais vias com ciclovias próximo a estações de integração, além de bicicletários e bikes compartilhadas nessas estações.
Para melhorar os deslocamentos a pé, Elizabeth diz que a BHTrans tem investido no aumento dos tempos de semáforos para a travessia de pedestres e em sinais sonoros para pessoas com deficiência visual. Além disso, o órgão está estudando em quais áreas da cidade é viável iniciar a implantação da Zona 30.
Em relação ao transporte público, a gestora cita as tarifas menores em caso de integração, as faixas exclusivas, o BRT e o pagamento eletrônico, que agilizam as viagens, e a renovação da frota com veículos com ar-condicionado e suspensão a ar, que geram mais conforto.
Ela pontua, ainda, a instalação de painel eletrônico nos abrigos e o aplicativo Siu Mobile, que têm informações sobre o sistema, além da criação de linhas que interligam centralidades, como a 208 (Betânia/Barreiro): “Precisamos incentivar essas integrações”, afirma. Elizabeth diz no entanto que ainda não há previsão de parceria com aplicativos.
Número de ciclistas cresce 16%
A quantidade de ciclistas na capital mineira aumentou 16,19% neste ano, em comparação com 2017. O levantamento, feito pela Associação dos Ciclistas Urbanos (BH em Ciclo) com o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (IPTD), contabilizou 3.838 ciclistas na cidade.
“Não foi feito nada do ponto de vista de política pública para incentivar o uso de bicicleta no período. A gente deduz que parte das pessoas que experimentaram a possibilidade do deslocamento por bicicleta durante a crise de combustíveis percebeu que era possível substituir definitivamente o carro”, diz Carlos Edward Campos, membro do BH em Ciclo. Segundo ele, existe uma demanda reprimida e interessada em usar a bicicleta em partes do trajeto.
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