Barcelona, na região da Catalunha na Espanha, é citada ainda hoje como exemplo de cidade que soube aproveitar a realização das Olimpíadas, em 1992, para investir em urbanismo e se modernizar. Hoje, é conhecida como uma das referências mundiais em mobilidade urbana.
Ao contrário do que se pensa, no entanto, a cidade só começou a investir pesadamente no setor depois dos Jogos Olímpicos. Em 1997, o governo da Catalunha se juntou às autoridades municipais da região metropolitana de Barcelona para criar um órgão de transportes integrado.
O esforço conjunto de planejamento deu resultado: segundo os dados mais recentes do governo, em 2015, só 23,2% dos deslocamentos diários eram feitos em veículos particulares. Surpreendentes 41,7% dos trajetos eram feitos de bicicleta ou a pé; e outros 35,1%, por transporte público.
Com a estratégia de priorizar o transporte público e não-motorizado, as mortes no trânsito de Barcelona não param de cair: de 2012 a 2015, a cidade reduziu as mortes em 10% e o número de feridos graves em 20%.
Pablo Noy Serrano, presidente da Associação Ibero-Americana para Mobilidade Urbana Sustentável (ASIMUS) e da Associação Espanhola de Car Sharing, credita os avanços à política urbana consistente que vem sendo implementada na cidade no médio prazo.
“Há alguns anos, descobrimos que éramos uma cidade poluída. Adotamos a transformação dessa situação como uma agenda política. Por isso adotamos linhas de ônibus menos poluentes e priorizamos o deslocamento a pé ou de bicicleta”, explica em entrevista ao site da revista Exame.
As lições para São Paulo
Apesar de ter a maior malha metroviária do país e liderar o ranking de mobilidade da Urban Systems, São Paulo ainda tem desafios a enfrentar, a começar pela insatisfação dos próprios usuários.
A possibilidade de implantação do modelo de Barcelona em São Paulo esbarra nas diferenças monumentais entre as duas cidades: a capital da Catalunha tem uma extensão de apenas 101 km², enquanto a capital paulista tem 1.521 km².
Além disso, Barcelona tem pouco mais de 1,5 milhão de habitantes, enquanto São Paulo tem mais de 12 milhões, segundo as últimas estimativas do IBGE.
Mesmo considerando todas essas diferenças, o principal entrave às melhorias na rede de transporte em São Paulo parece ser a falta de incentivos do poder público.
Serrano, que participou de um evento organizado pela ONG Opção Brasil e promovido pela SDECTI e pelo Investe SP na semana passada, afirma que ainda não teve oportunidade de avaliar as características do transporte em São Paulo, mas que há alguns conceitos básicos que devem ser levados em conta em uma eventual reestruturação.
“Em qualquer lugar, primeiro você precisa criar as condições”, explica ele após a reportagem perguntar se a população de Barcelona já usava mais bicicletas do que a média quando o poder público decidiu investir nos meios de transporte não motorizados.
“A cidade era como qualquer outra, tinha uma cultura centrada em carros. Mas investimos em integrar os transportes. No começo, a prefeitura bancava um programa de compartilhamento de bicicletas. Hoje em dia, o número de bicicletas particulares supera o de públicas”, exemplifica.
São Paulo tem potencial para repetir o feito, opina Serrano. “Vocês têm um bom clima, especialmente se comparado à maioria das cidades da Europa. Além disso, são vários trechos com ruas bastante planas”.
Há dois anos, a prefeitura de Barcelona também implantou uma “superquadra”: fechou as ruas de alguns quarteirões para carros e criou um espaço de convivência para pedestres. “Tivemos muita controvérsia na instalação desse espaço”, conta Pablo Serrano. A BBC entrevistou alguns dos moradores desses quarteirões no começo do ano e, enquanto alguns comerciantes se queixavam, os moradores do entorno estavam aprovando a iniciativa.
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