Faço Pilates duas vezes por semana numa academia localizada em uma das movimentadas esquinas paulistanas. Como toda academia, oferece programas de condicionamento físico baseado naqueles aparelhos de musculação e os outros que simulam os nossos movimentos cotidianos: bicicletas ergométricas, esteiras, estepes, e por aí vai. A grande maioria dos frequentadores são jovens cheios de energia e pressa, que optam por utilizar um minúsculo elevador para chegar no espaço da academia, situado a um lance de escada, certamente para poupar energia e ganhar tempo para o treino.
Enquanto espero o início da minha atividade ouço sempre queixas sobre trânsito e sobre a pouca oferta de vagas para estacionar na vizinhança, obrigando os queixosos a se submeterem a numerosas e estressantes voltas no congestionamento das ruas para depois caminharem uma ou mais quadras quando têm sorte de estacionarem. Mas a correria da chegada logo fica esquecida na concentração do aquecimento: pelo menos 30 minutos na esteira, no estepe, no orbitrek, na bicicleta ergométrica, e nas outras parafernálias.
Por que não a pé?
Uma das vezes, após ouvir o desabafo de uma das frequentadoras sobre a injustiça de ter levado uma multa só porque excedeu cinco minutinhos o tempo de parada na Zona Azul, perguntei onde ela morava. Era a uma distância de mais ou menos oito quadras da academia. Então quis saber por que ela não vinha a pé. Se programando para sair uma meia hora antes do início da aula, com certeza conseguiria chegar pontual e calmamente, sem perigo de levar multa, e o que é melhor, já aquecida e exercitada. Ela me olhou como se eu propusesse a coisa mais absurda do mundo e logo se justificou: é muito longe, a ladeira é muito íngreme, é perigoso andar na rua por conta dos assaltos, as calçadas tem muitos buracos, a rua é escura, e por aí vai. Minha colega de academia prefere se aquecer no ambiente abafado e artificial da academia a fazê-lo usufruindo o espaço público da via.
Certamente os motivos que ela alegou: as péssimas condições de conservação das calçadas, os pisos desconfortáveis, a insegurança das ruas mal iluminadas, a sinalização precária para quem caminha, são certamente desencorajadores para consolidar o saudável hábito cotidiano da Mobilidade a Pé na cidade e acabam por criar, ao meu ver, o cenário de realismo absurdo que predomina nas academias: esteiras, estepes e outras parafernálias que imitam movimentos cotidianos, lotadas de pessoas que deveriam ocupar espaços públicos urbanos. Será que um dia esta situação tenderá a se normalizar? Quando iremos nos apropriar dos espaços públicos de caminhada? Enquanto isso não ocorre, os proprietários de academias agradecem.