A Prefeitura de São Paulo, no início deste ano, colocou em vigor a lei nº 15.442, que triplica o valor da multa para quem não mantém o passeio público em ordem ou livre de obstáculos. A penalidade, que virou motivo de reclamações entre a população paulistana, é de no mínimo R$ 300 por metro linear e o cidadão multado tem até 15 dias de prazo para recorrer a partir da publicação da autuação no Diário Oficial da Cidade – ou do recebimento da notificação, enviada pelo Correio.
Pergunto-me se realmente é no bolso do paulistano – literalmente – onde mora a saída para os problemas de reforma e conservação das nossas calçadas. Três meses após o início da fiscalização da nova legislação das calçadas de São Paulo, os agentes da Prefeitura já aplicaram cerca de 1.630 multas aos munícipes que não cumpriram as regras. A média é de 18 autuações por dia.
Mas, punições a parte, a nova lei não tem mostrado grandes resultados, além das temidas multas aos paulistanos. Falo isso, porque, além de lutar para levar o tema da acessibilidade para pauta do Poder Público, sou uma pedestre. Sim, cadeirante também é pedestre! E assim como um “andante”, eu tenho que driblar obstáculos para “cadeirar” diante das péssimas condições de nossas calçadas.
E digo NOSSA porque a calçada é um bem de todos. Do proprietário e do visitante.
Um exemplo simples ilustra o que quero dizer: lixeiras, vasos de plantas, bancos, cadeiras, grades, floreiras, cinzeiros… Nada disso pode ser colocado na calçada de uma hora para outra, por livre escolha do proprietário do imóvel. Para isso, é preciso ter um Termo de Permissão de Uso (TPU) expedido pela Prefeitura. Esta regra também vale para os comerciantes, que costumam parar churrasqueiras na calçada e até mesmo as populares ‘TVs de cachorro’, que ficam paradas em frente a bares e padarias, impedindo a passagem dos pedestres. Sem esse termo, tudo não passa de irregularidade.
Para exigir um padrão de qualidade para o seu passeio, o munícipe, algumas vezes, tem de seguir padrões de construção na hora de reformar a sua própria calçada. E o Poder Público, por sua vez, deve orientar a população sobre os meios de se denunciar irregularidades, bem como as formas de se fazer as mudanças adequadas na hora de implantar a calçada correta. Mas, infelizmente, ainda falta informação e sobra burocracia.
Quando falamos de calçada estamos nos referindo a um bem coletivo que proporciona qualidade de vida para toda a população e não a um só grupo específico. Se a calçada é acessível para mim, que sou cadeirante, ela será para cegos, jovens, mães com carrinho de bebê, mulheres com sapato de salto alto… enfim, calçada bem projetada protege até os distraídos.
Aqui em São Paulo, enquanto fui vereadora da cidade, criei a Lei do PEC, o Plano Emergencial de Calçadas, que determina que a Prefeitura reforme o passeio público das rotas estratégicas determinadas pela Secretária Municipal da Pessoa com Deficiência. Estas rotas tratam-se dos locais onde se encontram os principais serviços dirigidos à população, como escolas, hospitais, creches, bancos, empresas etc.
Quando melhoramos 10% dos passeios públicos que estejam em rotas estratégicas – leia-se locais de maior concentração de serviços – resolvemos 80% da mobilidade de um município. Contudo, sem este planejamento, a Prefeitura tem de tomar outras medidas, como a aplicação de multas, responsável por gerar mais reclamações que soluções realmente eficientes.
E, ainda sim, o trabalho de fiscalização, que é de obrigação do Executivo, só ocorre após denúncias dos pedestres. Sem essas reclamações, que chegam, principalmente, por meio do site da Prefeitura ou diretamente nas subprefeituras, a fiscalização não é feita. É aí que voltamos a um ponto crucial neste ciclo: a participação do cidadão.
Pensando em instigar a população a denunciar a péssima qualidade do passeio público que criamos o projeto dos Guardiões das Calçadas. A ideia é simples: um grupo formado por funcionários de minha equipe escolhe um ponto estratégico da cidade – sempre com grande circulação de pedestres – vai até o local, checa as vias que precisam ser melhoradas, fotografa e lista as ruas e os números dos locais. Este relatório é encaminhado aos órgãos competentes, que passam a ser cobrados. O resultado destas vistorias pode ser conferido no www.maragabrillli.com.br/
Com este mesmo propósito que criamos a cartilha das calçadas, em parceira com a AME Jardins, e a Cartilha Olhe a Paulista, que traz dados sobre a reforma que tornou a avenida uma das mais acessíveis da América Latina – ambas orientam a população sobre como acessibilizar o seu passeio e estão disponíveis para download no site dos Guardiões. Aliás, o canal foi criado justamente para que as pessoas busquem o conteúdo que as norteie da melhor forma possível, tornando-as, assim, aptas a se tornar guardiões de suas próprias regiões.
Se informar é imprescindível para que fiquemos atentos ao nosso papel como agentes da transformação do meio em que vivemos. Mais importante que reclamar é participar. As calçadas são o cartão postal das cidades. Elas não só deflagram o planejamento urbano de bons gestores, como as atitudes de uma população consciente e inclusiva. Promover estas frentes tem de fazer parte da nossa luta diária por uma cidade mais acolhedora.