O mundo pede água – O direito de ir e vir
O direito de ir e vir

25
março
Publicado por admin no dia 25 de março de 2019


Acesso à água potável é um desafio para o desenvolvimento sustentável de cidades. E mesmo o simples uso de um automóvel contribui para levar óleos, restos de borracha e outros resíduos  para os cursos d’água que alimentam os mananciais

 

É estarrecedor pensar que um mar de pessoas – em sua maioria miseráveis – ainda não tem acesso a um recurso que para muita gente passa despercebido no dia a dia: a água.

De acordo com a Unesco, em um relatório recente lançado às vésperas do Dia Mundial da Água, celebrado em dia 22 de março, mais de 2 bilhões de pessoas no mundo não contam hoje com uma fonte adequada de água potável e um número ainda maior, 4,3 bilhões, não conta com saneamento básico.

O documento ainda traz uma análise muito interessante sobre a desigualdade: as pessoas que são pobres ou sofrem discriminação social têm maior probabilidade de ter acesso limitado à água e saneamento adequados.

No Brasil, a falta de saneamento básico é a privação que mais afeta crianças e adolescentes pobres.

E quando um direito tão essencial é negado significa que outros, como educação, saúde e habitação, também são comprometidos. Ou seja, falamos de uma cascata de privações que afetam cidades de todo o país e que atingem, sobretudo, quem mais precisa e está no início da vida.

Como exemplo de grupos desfavorecidos estão as pessoas que também adquirem algum tipo deficiência por conta da falta de saneamento básico, atendimento adequado de saúde e reabilitação, pouco acesso à informação e outros problemas decorrentes da pobreza. Estima-se que 90% dos casos de deficiência visual causadas por doenças como a catarata e o glaucoma, por exemplo, estejam concentrados em nações em desenvolvimento.

E quando trazemos esse olhar para as cidades, a desigualdade é ainda mais escancarada. As casas urbanas ricas com água encanada tendem a pagar muito menos por litro de água, enquanto pessoas pobres que moram em favelas muitas vezes precisam comprar água de caminhões, quiosques e outros fornecedores, gastando cerca de 10 a 20 vezes mais. Uma equação perversa.

A cada dia, celebramos mais o modo de vida urbano e as tecnologias. Mas para onde caminharemos se não tivermos água?

Nesse contexto, melhorar a gestão dos recursos hídricos e fornecer a todos o acesso à água potável e saneamento seguros e acessíveis financeiramente são ações essenciais para erradicar a pobreza, construir cidades pacíficas e prósperas, garantindo que ‘ninguém seja deixado para trás’.

Estar à frente de um segmento que é tão negligenciado no Brasil e ser a personificação de uma somatória de exclusões (mulher e tetraplégica), me desperta a cada dia para o descumprimento dos direitos humanos em nosso país e no mundo. E o acesso à água é um direito humano. Um direito que ainda está na mão de quem detém o maior poder.

Em minha última missão na ONU, em Genebra, conheci a delegação de Vanuatu, um arquipélago paradisíaco cuja existência é ameaçada por conta da pobreza e das mudanças climáticas.

Delegação de Vanuatu, na reunião de Genebra Foto: arquivo pessoal

Lá, o acesso à água potável é escasso e o local vive sob o risco eminente de epidemias causadas por doenças trazidas de enchentes e da falta de saneamento básico. Não por acaso, a inclusão em Vanuatu caminha a passos lentos. Não há, por exemplo, intérpretes da língua de sinais em toda a Ilha. A população surda vive a exclusão da exclusão.

O exemplo de Vanuatu serve não só para repensarmos nossa relação com a água e o desperdício, mas provoca nosso olhar para a inclusão e partir da distribuição desigual dos recursos hídricos no mundo e das ações do homem no meio ambiente. Quando a água chega a todo mundo é um alerta positivo de que a inclusão está no radar de determinada nação.

O futuro das nossas cidades e das próximas gerações dependerá de escolhas conscientes feitas por nós hoje. Não poluir e não desperdiçar água é o primeiro passo de quem pensa no outro.



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