Desempregada, aos 18 anos, Silvania Costa aceitou o convite para correr 10 km e ganhar R$ 300 para o sustento da filha. Venceu a corrida e passou uma semana internada com febre alta, tamanho o esforço colocado na competição. Aos 28, foi medalha de ouro no salto em distância, classe T11 (deficiência visual).
Nosso país teve a honra de conhecer pessoas como Silvania, que superaram a deficiência e a pobreza. Elas chegaram ao Rio de Janeiro e conquistaram muito mais que pódios. Ensinaram na prática o significado de palavras como superação, direitos, inclusão e acessibilidade.
Por falar em acessos, a cidade do Rio de Janeiro passou por intervenções importantes para a melhoria do ir e vir. O Programa Bairro Maravilha, por exemplo, recuperou áreas da cidade incluindo rampas nas calçadas. Foram cerca de 8.200 rampas e a previsão é de chegar em 11 mil até o fim do ano.
Nos BRTs, as estações agora contemplam rampas e o embarque é no mesmo nível do ônibus, dispensando o uso da plataforma elevatória para embarcar. Além de todos entrarem no veículo da mesma forma, o processo toma muito menos tempo. Uma inspiração para que as que capitais brasileiras adotem em seus projetos o Desenho Universal, conceito aplicado a espaços e serviços a ser utilizados por qualquer pessoa.
Tal mudança é uma oportunidade para olharmos para o transporte coletivo brasileiro e torná-lo de fato um serviço 100% acessível. Afinal, já expirou o prazo de 10 anos estabelecido pelo decreto 5296, que prevê acessibilidade em todo sistema de transporte, como já lembramos aqui no Mobilize.
Claro que falta muito a melhorar na capital fluminense e em todas as cidades do Brasil, mas a Paraolimpíada nos trouxe a oportunidade de olharmos para a questão da acessibilidade de forma muito mais ampla e humana.
Temos ainda, a construção do Centro Paralímpico Brasileiro em São Paulo, que abrigou 15 modalidades esportivas e agora terá a missão de servir não só como espaço esportivo, mas um polo de produção de conhecimento, inovação e tecnologia do esporte. Em Londres, por exemplo, os centros de treinamento tornaram-se no fim dos jogos, espaços a ser aproveitados pela população, com a adaptação para parques públicos.
Infelizmente, o Brasil atual, além de não pensar no planejamento sustentável das cidades, ostenta uma das políticas de dispensação de órteses e próteses mais ineficazes do mundo. Em alguns estados, um brasileiro espera por cinco anos para receber uma cadeira de rodas. E quando essa população chega à idade escolar, se depara com instituições que não são acessíveis, porque apenas 21% de nossas escolas básicas têm acessibilidade. Dessa forma, ainda é distante imaginarmos o brasileiro exercendo o direito de ir e vir nas cidades.
A Paraolimpíada nos deu a chance de tirar da margem da invisibilidade mais de 45 milhões de brasileiros com deficiência, que podem ter a oportunidade de se reabilitar e ter dignidade. E ainda espelhar uma geração a respeitar a diversidade e superar barreiras. Está mais que na hora de impetrarmos uma nova mentalidade em nossa população, em nossa forma de fazer políticas públicas e de praticar a inclusão, impactando nas cidades e na vida direita das pessoas. Que o “espírito em movimento”, lema das Paraolimpíadas, contagie nossos gestores a crescer com as diferenças.