“Cidade Linda”, além das aparências… – Instituto Caminhabilidade
Instituto Caminhabilidade

14
fevereiro
Publicado por leticia no dia 14 de fevereiro de 2017

Para criar um projeto de embelezamento de cidade, precisamos refletir sobre O QUE SIGNIFICA BELEZA URBANA e quais são os caminhos e elementos a serem implementados em uma cidade para alcançar uma verdadeira cidade linda.

 

Primeiro de tudo precisamos romper uma barreira, a de que beleza não se discute.

 

Muitas vezes discutir a beleza da cidade é evitado, ou se torna conversa de bar e discussão sem fundamento porque achamos que achar algo bonito ou não é apenas uma questão de gosto e que gosto cada um tem o seu, único.

 

Porém, quando falamos de planejamento de cidades, um dos princípios mais importantes de se prezar na hora de planejar é a beleza urbana, e esta beleza tem que ser COLETIVA.

 

Com base neste princípio, alguns estudos começaram a tentar identificar o que é beleza da cidade para os cidadãos, e baseado nos resultados indicam diretrizes e elementos que criam uma cidade mais bonita, PARA TODOS.

 

Vou compartilhar aqui duas destas experiências.

 

Primeira experiência – Pesquisa em Sheffield na Inglaterra

 

A primeira experiência é uma pesquisa realizada em 2010 chamada “Pessoas e Lugares: Atitudes públicas para a beleza” (“People and places: Public attitudes to beauty”) . Realizada pela IPSOS MORI em Sheffield no Reino Unido a pedido da antiga Comissão de Arquitetura e Ambiente Construído (CABE) – uma comissão governamental com foco na qualidade do desenho/design urbano.

 

A pesquisa foi motivada pelo projeto de revitalização e embelezamento que Sheffield estava passando naquele momento, tendo como objetivo principal colaborar com o plano local naquele momento mas também influenciar outros planos de embelezamento de cidades  de forma a sugerir o entendimento de beleza urbana pela população antes de propor desenhos e melhorias de cima para baixo.

 

BELEZA É EXPERIÊNCIA

 

Uma das coisas importantes nesta pesquisa foi identificar, o que já foi mencionado antes, que as pessoas tem barreiras para falar em beleza. Principalmente porque há  a crença de que beleza é pessoal, subjetivo, indefinido e “cosmetizado”. Com isso o estudo percebeu que  beleza urbana para os cidadãos não é um aspecto meramente visual e sim uma experiência.

 

Ou seja, as pessoas não apenas veem os elementos da cidade como mais ou menos bonito, mas experimentam a cidade de forma mais ou menos agradável, fazendo a associação a lugares mais ou menos bonitos na cidade.

 

Experiências para serem “bonitas” precisam haver gerado sensações positivas como alegria, conforto e segurança. Por isso, um dos elementos que aparecem mais fortemente relacionado a beleza para os entrevistados é estar em contato com a natureza na cidade.

 

Outro ponto relevante da pesquisa foi identificar que as pessoas consideram que ter acesso a beleza um direito de todos que vivem na cidade e por isso projetos de “embelezamento” devem ter ações por toda a cidade e ser realizadas em escala local.

 

Segunda experiência – 6 princípios para criar cidades mais atrativas

 

A segunda referência que vou compartilhar é um vídeo manifesto da britânica School of Life (Escola da Vida) em como criar cidades atrativas, e de forma muito didática define  e explica 6 princípios para fazê-lo (recomendo ver o vídeo, pois tudo o que vou explicar abaixo está muito melhor explicado no vídeo):

 

  • 1. Nem tão caótica, nem tão ordenada

O primeiro princípio se refere a como quando há ordem nos sentimos melhor no espaço, porém ordem como tamanho dos edifício e disposição, mas não edifícios todos iguais e padronizados como os projetos de moradia social no brasil por exemplo, isso se torna entediante e desagradável. E por isso explicam que a melhor combinação é variedade e ordem.

Dando como exemplo Amsterdam onde os prédios tem a mesma altura porém cada um com uma fachada completamente original.

E conseguir ser uma entre o caos e o padronizado é que faz com que a experiência na cidade seja agradável e bonita, através do que eles definem como complexidade organizada.

 

 

 

  • 2. Ter vida visível

Neste princípio presa pelo fascinante e atrativo que é ver o que as pessoas estão fazendo, movimento nas ruas. Para isso as cidades devem parar de escondem o que as pessoas estão fazendo por trás de vidros espelhados e frios, e vias sem espaço para caminhar e criar fachadas ativas e transparentes com vida na rua.

Pois o que acontece e é feito na cidade deve ser mostrado e valorizado.

 principio 2

 

    • 3. Ser compacta

Neste princípio o foco é em espaços públicos compactos e aconchegantes. Exemplifica como se constrói uma boa praça pública, não podendo nem ser tão grande nem tão pequena. Onde é possível ver o rosto das pessoas de qualquer lugar da praça.

 

  • 4. Orientação e mistério

Este princípio está estritamente relacionado ao deslocamentos na cidade. Ao se deslocar é preciso ter um balanço entre pequenas ruas para caminhar, se perder e apreciar a vida das cidades e ruas estruturais que nos levem aos lugares. Assim alcança-se um equilíbrio entre o prazer do mistério e o prazer da orientação.

 

 

  • 5. Escala

Aqui fala-se em escala no sentido de altura dos edifícios e na importância de escolher o uso do “ar” urbano em cima dos terrenos, pois afinal é o que compõe a vista da cidade. Torres altas devem valer a pena, e devem ser dedicadas a coisas especiais e importantes para a cidade, pois se destacam e representam o valor daquela cidade.

 

 

  • 6. Valorizar o local e autêntico

As cidades devem prezar e garantir sua identidade, proteger e fomentar elementos únicos e não pareça que é qualquer outra cidade do mundo. Para isso deve definir fortemente seu caráter e incentivar o uso de materiais locais.

 

Lições aprendidas

 

Com base nas conclusões da primeira pesquisa pesquisa, o primeiro passo para criar um projeto para uma cidade linda é entender que projetos e locais fazem a experiência da cidade mais agradável.

 

Alguns projetos, por exemplo, que podem ser considerados como embelezadores de São Paulo são: as Ruas Abertas aos domingos, a pedestrianização da Rua 7 de abril, a criação da calçada verde no bairro na Liberdade.

 

No segundo exemplo, o vídeo da School of Life alguns, elementos mais específicos são identificados. Mas mais uma vez  reforça que os elementos que garantem a atratividade de uma cidade estão estritamente relacionado à vida nas ruas e as sensações positivas ao se deslocar e experimentar os espaços públicos.

 

Além disso, adiciona um elemento que não pode ser ignorado ao fazer-se uma pesquisa e consulta sobre beleza urbana, que é descobrir a personalidade da cidade e as identidades locais. Devendo ser aplicado a escala mais local,  como bairros, garantindo bairros autênticos.

 

Pesquisa na Cidade de São Paulo

 

Considerando as descobertas e aprendizados  a partir das experiência apresentadas também vale a pena vale olhar para o que já temos de dados sobre a relação dos paulistanos com São Paulo.

 

Todos os anos a Rede Nossa São Paulo realiza a pesquisa Indicadores de Referência de Bem-Estar no Município (Irbem) e divulga próximo ao aniversario da cidade. Neste ano o que mais chamou atenção na pesquisa foi que o ítem pior avaliado pelos paulistanos foi transparencia e participação política, e ainda mais, a população indicou querem consultas populares ao temas da cidade, poder participar mais das decisões.

 

Outra pesquisa que está sendo realizada de forma virtual sobre o que é beleza para os paulistanos pela Talking City (disponível para resposta e colaboração neste link: https://goo.gl/57e82H). E os resultados parciais até agora estão confirmando o que foi mencionado anteriormente neste artigo, de como beleza é experiência na cidade e construção coletiva:

 

 

 

Outra referência ainda pode ser a pesquisa de 2012 (um pouco antiga já) da Folha chamada DNA Paulistano que além de traçar o perfil dos paulistanos por região e bairro, também identifica as maiores queixas de cada local, podendo ser considerados os itens de maior atenção em cada região para melhorar a experiência da cidade. Tratando bairros de formas diferente por terem problemas diferentes – entender a localidade é essencial.

 

Sugestões para o Programa Cidade Linda

 

 

Baseado em tudo que foi exposto neste artigo concluo com algumas sugestões para a continuidade de forma adequada do programa Cidade Linda na cidade de São Paulo:

* Pensar beleza como experiência dos que estão e circulam pelos espaços públicos da cidade (por exemplo é mais agradável atravessar uma rua correndo com medo de ser atropelado ou atravessar com conforto e segurança?)

* Incluir a população no diálogo e nas decisões sobre a cidade

* Entender a identidade de São Paulo e fortalecer essa identidade

* Identificar as especificidades de cada bairro e valorizar o local

* Prezar pela diversidade

* Prezar pela humanização da cidade e pela vida nas ruas

* Considerar elementos locais em diferente regiões da cidade

* Ser transparente em todas as decisões

 

Porque falar de Cidade Linda é importante

 

Apenas para finalizar, como vi muitos comentários nas rede sociais dizendo que o programa Cidade Linda estava ganhando proporções exageradas nas discussões de construção da cidade visto que há projetos sendo realizados em outras áreas “mais importantes” como saúde, me sinto na obrigação de relembrar que TUDO está inter-relacionado.

E que por exemplo uma cidade com maior inclusão social e tolerância gera pessoas mais felizes e satisfeitas. Uma cidade com menor velocidade tem menos mortes e acidentes no trânsito, gerando uma experiência mais bonita.

Dito isso, o problema é que um programa de embelezamento de cidade não pode se focar e tomar decisões como:  muros com arte urbana ou cinza?; guias estão bem pintadas ou precisa mais uma camada de branco?. E deve sim entender como fazer a experiência da cidade ser melhor e mais inclusiva, e ai decidir quais programas que influenciam na estética conseguem alcançar esta melhor experiência coletiva.

Medidas para deixar a Cidade mais Linda influenciariam diretamente em outras áreas e demandas sociais, como saúde, cultura, transporte e etc.

 

Se esta gestão quer ter como sua bandeira uma Cidade Linda, ótimo, mas que entenda e faça deste plano um projeto estrutural de cidade, integrado e colaborativo.

Porque todo mundo quer sim viver em uma cidade melhor, mais justa e mais bonita.

 

 

 

Referências:

 

Ipsos MORI (2010) People and Places: Public attitudes to beauty, London: Ipsos MORI on behalf of the Commission for Architecture and the Built Environment – http://www.designcouncil.org.uk/sites/default/files/asset/document/people-and-places.pdf

https://www.youtube.com/watch?v=Hy4QjmKzF1c

 http://www.carlalink.com/talkingcity 

 http://www.nossasaopaulo.org.br/pesquisas/apresentacao-irbem2017.pdf 

http://folhaspdados.blogfolha.uol.com.br/2012/09/14/dna-paulistano-navegue-pelos-dados-em-mapa-interativo/ 

 

 



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Leticia O Instituto Caminhabilidade é uma ONG liderada por mulheres e fundada em 2012 que, para alcançar a equidade de gênero e enfrentar a crise climática, desenvolve cidades caminháveis com o protagonismo da cidadania. Para isso, faz projetos e ações colaborativas e prioritárias para populações vulnerabilizadas, criando pontes entre sociedade civil, poder público e demais atores. .
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