Os três projetos vencedores do Prêmio Cidade Caminhável deste ano merecem destaque por saírem das centralidades do imaginário popular de áreas caminháveis e desenvolverem soluções para contextos mais desafiadores, menos caminháveis e mais vulnerabilizados no ambiente urbano. Além disso, abraçaram perspectivas de gênero e infância, tornando-se verdadeiros modelos de desenvolvimento urbano inclusivo.
O município de Jundiaí, em São Paulo, foi ganhador na categoria de Cidades Médias com o “Plano de Bairro Novo Horizonte e Região”. Além de promover a caminhabilidade em bairros periféricos, o projeto envolveu ativamente as crianças na sua concepção, integrando a natureza e projetos comunitários.
No texto anterior, apresentamos o projeto “Rua da Gente”, de Benevides, vencedor na categoria de Cidades Pequenas. A iniciativa transformou estradas que cortam a cidade em pontos de encontro e expandiu programas de ressignificação das ruas para todas as regiões (se você ainda não leu, clique aqui para conferir).
O “Plano de Bairro Novo Horizonte e Região” já é inovador desde a sua criação, por propor um planejamento com escala de bairro, o que ainda é bastante incipiente no Brasil. Normalmente, o planejamento se concentra a nível municipal, tornando-se menos participativo e realista.
Além disso, o território escolhido é distante do centro e trata-se de uma região periférica. A área, que compreende os bairros Novo Horizonte, Fazenda Grande, Tulipas, Bom Jardim, Parque Industrial e Distrito Industrial, começou como uma ocupação no local onde passava a antiga linha férrea Sorocabana. Hoje, abriga 37 mil pessoas (10% do total de Jundiaí), sendo 12% crianças de 0 a 15 anos e 17% idosos, a maioria com renda de até 2 salários mínimos (Plano de Bairro Novo Horizonte e Região, 2021).
A participação coletiva e central na construção desse plano considerou principalmente a perspectiva das crianças. Esse enfoque já faz parte da tradição de Jundiaí, que é membro da Rede Mundial de Cidades das Crianças, idealizada pelo pedagogo e desenhista italiano Francesco Tonucci. Além disso, a cidade conta com o Comitê das Crianças, um órgão que escuta as demandas e sugestões das crianças em relação à cidade.
Um dos pontos interessantes da consulta a esse Comitê foi que se descobriu que apenas 40% das crianças vão a pé para a escola. No entanto, dentre as 60% que não vão caminhando, 1/3 afirmou que iria a pé se as calçadas fossem melhores e se o caminho tivesse sombra. Isso levou o plano a incorporar elementos como arborização, bancos e hortas no trajeto escolar, atendendo às necessidades das crianças e, por conseguinte, promovendo a perspectiva de gênero e criando um ambiente mais seguro, confortável e convidativo para caminhar.
Esses critérios adotados no “Plano de Bairro Novo Horizonte e Região” fazem com que ele seja um exemplo inspirador de como a caminhabilidade pode ser abordada de maneira inclusiva e transformadora. O projeto não apenas melhora a infraestrutura urbana, mas também promove a igualdade de gênero, atende às necessidades da primeira infância e fortalece as comunidades periféricas.
Acreditamos que, para reverter o contexto de injustiça produzida pela urbanização carrocêntrica, é preciso priorizar os territórios e pessoas mais afetadas, ou seja, crianças e mulheres, pessoas negras e periféricas. À medida que essas iniciativas continuam a prosperar, podemos vislumbrar um futuro em que todas as cidades se tornem verdadeiramente caminháveis, acolhendo a diversidade e as necessidades de todos os seus habitantes.
O Prêmio Cidade Caminhável tem como objetivo identificar e reconhecer projetos feitos pelo poder público em cidades brasileiras de todos os tamanhos que tenham melhorado o deslocamento a pé. Mais do que isso, busca traçar um panorama do desenvolvimento da caminhabilidade no Brasil.
Na primeira edição, realizada em 2021, foram considerados projetos realizados desde 2012, quando entrou em vigor a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU — Lei 12.587/12). Já na segunda edição, em 2023, foram analisadas iniciativas feitas em 2021 e 2022. Foram 32 inscrições válidas, provenientes de 17 cidades em sete estados, abrangendo todas as regiões do país.
Prefeitura de Jundiaí. Unidade de Gestão de Planejamento Urbano e Meio Ambiente. Plano de Bairro de Novo Horizonte e Região. Jundiaí, 2021.
IBGE. Censo Brasileiro de 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.