Texto e fotos: Uirá Lourenço
Neste ano que termina nada se viu de mudança na mobilidade em Brasília. Na verdade o que se viu foi o avanço da imobilidade, decorrente do aumento da frota motorizada, da falta de ações efetivas de melhorias nos modos coletivos e saudáveis de transporte e do desrespeito no trânsito.
O transporte coletivo ficou ainda mais caro, sem qualquer ganho em conforto e segurança. O bilhete único ainda é apenas uma promessa distante de campanha. As queixas dos usuários de ônibus enchem as seções de leitores dos jornais e as redes sociais, como se pode ver na seção “Queixas da Imobilidade” deste blog. A A EPTG (“Linha Verde”), símbolo maior da imobilidade, continua cinza e caótica. Quem se aventura de ônibus continua aprisionado no engarrafamento, pedestres e ciclistas continuam em risco, expostos à lama e ao intenso fluxo motorizado.
O programa do atual governador é recheado de objetivos bem intencionados:
– “Priorizar o transporte não motorizado em relação ao motorizado e o motorizado coletivo em relação ao individual.”,
– “Promover o funcionamento sistêmico do transporte público, com o objetivo de tornar atrativo o transporte coletivo.”,
– “Promover o uso de veículos movidos a combustíveis renováveis e pouco poluentes, como biocombustíveis e veículos elétricos.”,
– “Ampliar o uso de bicicletas para deslocamentos diários casa-trabalho e casa-escola.”
– “Facilitar o uso das calçadas pelos pedestres.”
– “Promover acessibilidade para as pessoas com deficiência ou dificuldades de locomoção.”
Como diz a expressão, de boas intenções o inferno está cheio. Não basta o bonito plano assinado, precisa-se de ações efetivas, de vontade política para mudar o atrasado e vergonhoso modelo de transporte. E as obras anunciadas em 2015 confirmam o atraso do governo atual, ao manter o foco na fluidez motorizada, com ampliação de vias e construção de viadutos.
Para piorar se mantêm os altos limites de velocidade nas vias. Ao contrário da tendência mundial de humanizar as vias e de reduzir os limites de velocidade (no Brasil, São Paulo vem reduzindo o limite de velocidade há alguns anos), não há programa amplo de redução da velocidade no Distrito Federal, o que compromete ainda mais a insegurança de todos, especialmente de quem caminha e pedala.
Projetos rodoviaristas de governos anteriores continuam como prioritários. As imagens de dois projetos mantidos pelo atual governo (ampliação do Eixão Norte e da ponte do Bragueto e construção de túnel em Taguatinga) revelam o viés rodoviarista. Na ilustração não aparece nada além de carros, sequer um ônibus, ciclista ou pedestre.
Se o governo anterior quis emplacar a ideia de “Brasília, capital das ciclovias”, este parece querer emplacar a ideia de “Brasília, referência em respeito ao pedestre”. Mas basta uma curta caminhada pelo Plano Piloto para constatar a imobilidade: crateras, bloqueios e ausência de calçadas compõem o cenário sombrio a quem caminha. As pistas para circulação de veículos motorizados costumam estar em bom estado; entretanto, as calçadas, quando existem, estão em estado deplorável.
A contradição entre a propaganda governamental e a realidade fica evidente na sede do Poder Executivo local. Na reforma da calçada em frente ao Palácio do Buriti, deixou-se uma cratera intransponível a poucos metros da calçada reformada, o que demonstra falta de visão integrada. Falta aos gestores públicos ver a mobilidade de forma ampla, com caminhos contínuos, seguros e confortáveis. Na sede do Poder Legislativo local também impera a inacessibilidade, com calçadas destruídas e rampas diariamente bloqueadas.
Fiquemos atentos em 2016. Se continuarem os projetos e ações rodoviaristas, o governador apenas manterá a visão atrasada dos governos anteriores, contribuindo para saturar de vez as vias e os espaços públicos. Mais canteiros, calçadas e praças serão convertidos em pistas e estacionamentos. E se consolidará a imagem de Brasília composta por cabeça, tronco e rodas (4 rodas).
O atual governo pode, por outro lado, reverter o quadro de imobilidade e priorizar efetivamente o transporte coletivo e os modos saudáveis de locomoção (como previsto na política nacional de mobilidade urbana e no programa do governador Rollemberg). Neste caso, deixará uma marca na cidade, um legado. Com planejamento inteligente das obras e ações em mobilidade urbana, priorizando pessoas e segurança no trânsito, em vez de automóveis e fluidez motorizada, caminharemos no rumo da mobilidade sustentável, justa e moderna.
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Mais fotos da imobilidade no DF no álbum virtual: https://picasaweb.google.com/112427601743437901602/ImobilidadeDF