Semáforo quebrado revela muito sobre o quanto precisamos caminhar rumo à mobilidade moderna
Texto e fotos: Uirá Lourenço
Neste início de ano ocorreu um fato que entristece e demonstra bem o descaso com o mais frágil no trânsito: o pedestre. Entre a Torre de TV e o Setor Hoteleiro Norte, no Eixo Monumental, o botão no semáforo – que as pessoas apertam para permitir a travessia – quebrou. Foram pelo menos cinco dias de sufoco, longa espera e correria.
Observei e registrei as pessoas se lançando entre carros e ônibus em alta velocidade. Trabalhadores, crianças, idosos, ciclistas e turistas corriam para atravessar as seis faixas do Eixo Monumental. Flagrei pessoas quase atropeladas, inclusive duas moças que escaparam por pouco de dois motoristas de ônibus (vídeos ao final do texto).
Como de costume, quando vejo problemas como calçada destruída, ciclovia sem continuidade e falta de faixa de travessia, fiz registro na ouvidoria (com relato e fotos) e pedi providências.1 Ao longo da semana vídeos do local foram postados no instagram (@brasiliaparapessoas) e o Detran/DF foi marcado. Mas os dias se passaram e nada de providências.
Um dos vídeos postados no Instagram (@brasiliaparapessoas).
No vídeo de 18/1, que mostra as pessoas forçando a travessia, o órgão de trânsito respondeu e, curiosamente, informou: ‘o #DetranDF realiza a Operação Sossego em diversas regiões do DF justamente para coibir essas motos barulhentas que adulteram o escapamento do veículo’. Acho que a resposta postada dispensa comentários. Será que viram o vídeo?
É bom lembrar que o semáforo danificado está na área central, turística e com bom policiamento. E mesmo assim os pedestres continuavam invisíveis. Vale aqui uma honrosa ressalva a três policiais que passavam na viatura e pararam pata interromper o fluxo motorizado e permitir a travessia segura das pessoas.
Na capital automotiva por excelência – cujos habitantes têm anatomia ímpar (cabeça, tronco e 4 rodas) –, quem usa as próprias pernas nos deslocamentos parece não ter voz. Por essas bandas o pedestre tem que assumir diferentes papéis para sobreviver: atleta de alto desempenho (com fôlego e vigor físico para encarar as travessias) e agente de trânsito (com autoridade para forçar que os motoristas parem e deem preferência).
Graças ao vigor físico e à sorte dos que fazem a travessia no local, não houve feridos ou mortos. Caso alguém tivesse se ferido em razão do semáforo sem conserto, alguma autoridade, algum órgão governamental teria assumido a culpa?
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1 O blog reúne as solicitações registradas na ouvidoria ao longo dos anos, com pedidos de melhoria na acessibilidade e na mobilidade. As solicitações feitas em 2023 estão no link: https://brasiliaparapessoas.wordpress.com/solicitacoes-de-informacoes-e-sic/2023-2/
VÍDEOS
Dois flagrantes no Eixo Monumental, no período em que o semáforo esteve quebrado. Duas moças quase atropeladas e pessoas acenando aos motoristas para permitir a travessia.