Brasilia Para Pessoas

20
março
Publicado por Brasília no dia 20 de março de 2024

Texto e fotos: Uirá Lourenço

Nos últimos dias ocorreu uma série de atropelamentos e mortes no Distrito Federal. No dia 13 de março um homem de 33 anos foi atropelado ao descer de um carro e atravessar a EPTG (Estrada Parque Taguatinga). No dia 14 um homem de 40 anos foi atropelado ao tentar atravessar a EPIA (Estrada Parque Indústria e Abastecimento) Sul. No dia 15 uma mulher de 57 anos foi atropelada por um ônibus em Samambaia após se desequilibrar na calçada e cair na pista. Três mortes por atropelamento em três dias seguidos, em diferentes pontos do DF.

Muitas perguntas me vêm à mente. Quem eram essas pessoas? As mortes poderiam ter sido evitadas? Será que nossas autoridades tem noção do nível de insegurança aos pedestres? Ou, como diz a canção, consideram apenas mais um que ‘morreu na contramão, atrapalhando o tráfego’?   

Eixão da Morte

O Eixão fez duas vítimas este mês (por enquanto). Um homem foi assassinado na passagem subterrânea da 102 Norte, no dia 5 de março; ontem (18/3) à noite um homem foi atropelado e morto no Eixão Sul, altura da quadra 106. Segundo as notícias, as duas vítimas estavam em situação de rua.

Pedestre atropelado e morto no Eixão Norte.

A pergunta que não quer calar: até quando teremos uma via expressa com limite de 80 km/h que dilacera a cidade de norte a sul, uma barreira quase intransponível aos sem-carro? Homens, mulheres, estudantes, trabalhadores, crianças e idosos que se arriscam diariamente para chegarem vivos ao outro lado.

Segundo estudo do Departamento de Estradas de Rodagem (DER/DF) em 20071, são mais de 80 mil travessias diariamente, em condições inseguras, ‘possibilitando assaltos e atos de violência’ (o próprio governo atestou a gravidade do problema há 17 anos!). Segundo pesquisa recente realizada pelo Instituto de Pesquisa e Estatística (IPE/DF)2, pelo menos 274 pessoas atravessam o Eixão por cima diariamente na 116/216 Norte, altura do Setor Hospitalar. Centenas de pessoas sujeitas a alto risco sem qualquer apoio na travessia (faixa, semáforo ou passarela), e sem qualquer providência governamental para solucionar o problema.

As passagens subterrâneas são tenebrosas. As medidas paliativas recentes do GDF (reforma do revestimento e do piso) não mudaram o submundo do Eixão. O fato de não enxergar quem está do outro lado (as extremidades em L) aumenta a insegurança, especialmente à noite. A falta de acessibilidade e de policiamento agravam o problema. Não é à toa que muitas pessoas preferem atravessar por cima, entre os carros em alta velocidade.

Travessia no Eixão com carros a 80 km/h ou mais.

Não são apenas pedestres as vítimas do Eixão. Além dos atropelamentos, ocorrem com frequência colisões e engavetamentos. É fato que a alta velocidade aumenta significativamente o risco de lesões graves e mortes. Os dados do Departamento de Trânsito (Detran/DF) revelam quão perigoso é o Eixão: em apenas três anos (2017 a 2019) foram 296 feridos e 16 mortos, entre pedestres, ciclistas, condutores e passageiros.

Quem passa de carro também está em risco no Eixão da Morte. O noticiário revela algumas das vítimas motorizadas em decorrência de colisões e engavetamentos. Num dos casos recentes, um motorista de 45 anos morreu em colisão com poste na 204 Norte, em dezembro de 2023.

Vale lembrar que, ao contrário dos monumentos, o alto limite de velocidade – de 80 km/h – não é tombado em Brasília. A velocidade pode e deve ser reduzida/adequada para no máximo 60 km/h no Eixão e em outras vias com esse limite (por exemplo, L4, EPIA e via de acesso à ponte JK). Essa é uma medida básica adotada em várias cidades modernas para aumentar a segurança no trânsito. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda limite de até 50 km/h nas cidades.

O Ministério Público (MPDFT), com apoio da Rede Urbanidade, propôs Ação Civil Pública este mês, contra o GDF, com o objetivo de buscar solução segura de travessia para pedestres e ciclistas no Eixão. O MP pede ainda a redução do limite de velocidade para 60 km/h como forma de aumentar a segurança ao longo da via expressa. Um Manifesto de Apoio foi lançado em favor da Ação e para pedir um Eixão Seguro para todos – pedestres, ciclistas e motoristas (link de acesso para assinar o Manifesto).  

Chega de tantas mortes! A pressa não vale uma vida. São vidas que importam, apesar de os atropelados muitas vezes aparecerem apenas como números frios nas estatísticas dos órgãos de trânsito e não terem sequer o nome divulgado nas notícias.

_________________________

1 Estudo de Segurança de Pedestres no Eixo Rodoviário, realizado pelo DER/DF.

2 Pesquisa ‘Travessias do Eixão’, realizada pelo IPE/DF com a colaboração da Universidade de Brasília (UnB) e da Associação Andar a Pé em 2021.

Notícias da violência nas pistas:

https://www.metropoles.com/distrito-federal/df-onibus-da-aeronautica-atropela-pedestre-que-saiu-de-carro-na-eptg

Homem desce de carro na EPTG e morre atropelado por ônibus da FAB

https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2024/03/15/homem-morre-atropelado-ao-tentar-atravessar-epia-no-df.ghtml

Homem morre atropelado ao tentar atravessar EPIA, no DF

https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2024/03/6819581-mulher-se-desequilibra-cai-em-via-publica-e-e-esmagada-por-onibus-no-df.html

Mulher se desequilibra, cai em via pública e é esmagada por ônibus no DF

https://www.metropoles.com/distrito-federal/homem-e-atropelado-sofre-parada-cardiaca-e-morre-no-eixao-sul

Homem é atropelado, sofre parada cardíaca e morre no Eixão Sul

https://www.metropoles.com/distrito-federal/pedestre-e-morto-em-passagem-subterranea-da-asa-norte

Pedestre é morto em passagem subterrânea da Asa Norte

https://www.metropoles.com/distrito-federal/forte-batida-no-eixao-destruiu-carro-e-matou-motorista-veja-imagens

Veja imagens de forte batida no Eixão que destruiu carro e matou homem

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Uirá Uirá Lourenço
Morador de Brasília, servidor público, ambientalista e admirador da natureza, Uirá é um batalhador incansável pela melhoria das condições de mobilidade na capital federal. Usa a bicicleta no dia a dia há mais de 25 anos e, por opção, não tem carro. A família toda pedala, caminha e usa transporte coletivo. Tem como paixão e hobby a análise da mobilidade urbana, com foco nos modos saudáveis e coletivos de transporte. Com duas câmeras e o olhar sempre atento, registra a mobilidade em Brasília e nas cidades por onde passa, no Brasil e em outros países. O acervo de imagens (fotos e vídeos), os artigos e estudos produzidos são divulgados e compartilhados com gestores públicos e técnicos, na busca de um modelo mais humano e saudável de cidade. É voluntário da rede Bike Anjo, colaborador do Mobilize e membro da Rede Urbanidade.
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