Texto e fotos: Uirá Lourenço
Rodoviária do Plano Piloto. Novembro/2007.
Tenho o costume de tirar fotos no meu trajeto a pé e de bicicleta. Estava organizando as imagens e é interessante ver as mudanças ao longo dos anos. Reuni algumas fotos e comento sobre a rodoviária, ou simplesmente rodô, como também é conhecida. Andar e pedalar por lá traz um misto de sensações. É bom ver tanta gente como em qualquer outra cidade comum. No entanto, o estado de abandono e os percalços na área central de Brasília causam tristeza.
A Rodoviária do Plano Piloto foi projetada por Lucio Costa e está no cruzamento entre o Eixo Monumental e o Eixão. É considerada o marco zero, onde fica a estação central do metrô e de onde saem ônibus para todo canto do Distrito Federal e para as cidades próximas de Goiás (o chamado Entorno de Brasília). Estima-se que pela rodoviária passem diariamente mais de 700 mil pessoas!
No acervo tem imagens desde 2007 até os dias de hoje. Observo que a rodoviária já teve banquinhos para descanso e havia um painel grande que supostamente anunciava os horários de partida dos ônibus (quando tirei a foto, em 2007, o painel não funcionava mais).
Rodoviária do Plano Piloto. Outubro/2007.
O drama das escadas rolantes é antigo. As imagens mostram que é raro ter todas as escadas em perfeito funcionamento. Os elevadores, que permitem o acesso de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, também sofrem com a falta de manutenção.
Escadas rolantes quebradas na Rodoviária. Setembro/2011 e Agosto/2019.
Elevadores quebrados na Rodoviária. Agosto/2019.
– Filas no terminal
O que seria da rodoviária sem as filas que serpenteiam todo o vão livre nos horários de pico? Sem dúvida, uma marca registrada que perdura ao longo do tempo.
Rodoviária do Plano Piloto. Setembro/2012.
Rodoviária do Plano Piloto. Fevereiro/2020.
Na parte voltada para o Eixo Monumental, onde ficam os ônibus para o Entorno, é comum ver guarda-chuvas abertos à tarde para proteger do sol. Em outros pontos, os guarda-chuvas protegem das goteiras.
Banho de sol na Rodoviária. Janeiro/2020.
Goteiras na Rodoviária. Novembro/2021.
– Calçadas em volta
Esplanada dos Ministérios, saída da Rodoviária. Agosto/2014.
No início da Esplanada dos Ministérios, na saída da Rodoviária do Plano Piloto, o fluxo de pedestres é bem grande. As fotos mostram a enxurrada de pessoas e as calçadas em condições precárias.
Esplanada dos Ministérios, saída da Rodoviária. 2016.
Em agosto de 2020 fiquei surpreso ao ver, enfim, a reforma da calçada na saída do terminal. Fiquei com esperança de que o caminho se tornasse plenamente acessível, como determinam as leis. Melhorou um pouco, é verdade. Mas ainda faltam rampas e piso tátil no trecho entre a rodoviária e os ministérios, o Museu da República e a Catedral. Ou seja, uma pessoa cega ou cadeirante não consegue sair do terminal central e ir em segurança até as principais atrações turísticas da capital federal.
Reforma da calçada no início da Esplanada dos Ministérios. Agosto/2020.
– Comércio formal e informal
Rodoviária do Plano Piloto. Julho/2021.
Outra marca registrada da rodoviária é o comércio diversificado. Camelôs, lojas de equipamentos eletrônicos, farmácia, lojas de roupas, verdurão, local para tirar foto 3×4 e a tradicional pastelaria Viçosa. Tem também o posto Na Hora, na plataforma de acesso ao metrô, que reúne guichês de órgãos públicos e oferece diferentes serviços.
Os sons da rodô são muito peculiares. Os vendedores anunciam chip de celular e frutas da época. O preço da goiaba, do pequi e das frutas em geral costuma ser muito bom. E tem ainda os que anunciam os destinos dos veículos que saem da plataforma superior: o chamado transporte pirata atrai muitos passageiros no final da tarde. “Planaltina, saindo agora, três vagas” e “Olha o chip da Claro” fazem parte da sonoplastia na plataforma superior.
Rodoviária do Plano Piloto. Novembro/2012.
Rodoviária do Plano Piloto. Abril/2011.
– Bicicletário e Ciclofaixa
Rodoviária do Plano Piloto. Dezembro/2011.
As imagens revelam que já existiu bicicletário na rodoviária. Em 2011 estavam lá os suportes e o espaço pintado de vermelho. É verdade que não era dos melhores. Lembro de passar na rodô e não conseguir parar a bicicleta em razão de a porta de acesso ao bicicletário estar fechada. E não tinha controle de acesso nem vigilância permanente. Com o tempo, o espaço foi se deteriorando e hoje restam apenas vestígios das vagas para os ciclistas, alguns suportes metálicos e lixo acumulado.
Ex-bicicletário da Rodoviária. Julho/2021 e Julho/2020.
Outra deficiência evidente é a falta de caminho para os ciclistas atravessarem a rodoviária. As fotos de 2014 mostram que já existiu ciclofaixa pintada ao longo do terminal, com pintura vermelha no ponto de travessia. Com o tempo a pintura se desgastou, a ciclofaixa desapareceu e o lugar passou a ser ocupado por táxis e ônibus. Posso garantir que pedalar no meio dos ônibus não é nada agradável.
Ciclofaixa e pintura na travessia. Rodoviária, maio/2014.
Ônibus no caminho de ciclista, parte norte da Rodoviária. Janeiro/2018.
Ciclofaixa apagada e invadida na Rodoviária (parte sul). Fevereiro/2018.
Ciclista na parte norte da Rodoviária. Fevereiro/2020.
– Tempos melhores por vir?
Pretendo continuar os registros na área central de Brasília e espero ter boas imagens para mostrar nos próximos anos. A importância da rodoviária do Plano Piloto é inquestionável, por estar na área central, por ser patrimônio tombado e o terminal de transporte mais movimentado do Distrito Federal.
A rodoviária deveria ser uma vitrine, acessível e com boas soluções em mobilidade, atrativas para a população. No coração de Brasília deveríamos ter um sistema moderno com ônibus elétricos, metrô, VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), bicicletário coberto e seguro, bicicletas e patinetes compartilhados. Como já escreveu a jornalista Conceição Freitas, a rodoviária (uma das piores do país) precisa ser tratada como o aeroporto (um dos melhores).
Para terminar o texto de forma otimista, deixo uma foto da parte de cima da rodoviária no período de floração dos ipês amarelos. Brasília é bela e merece um terminal central à altura!
Vista da parte superior da Rodoviária. Agosto/2020.
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1 Já escrevi outros textos no blog sobre a rodoviária. Um específico sobre os desafios de passar de bicicleta pela rodoviária e outro sobre os problemas no terminal, com propostas para modernizar a região central. Estão acessíveis nos links:
2 Em razão do abandono na rodoviária, ações civis públicas já foram propostas para obrigar o Governo do Distrito Federal (GDF) a providenciar melhorias.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF) propôs ação civil pública em 2019 – e obteve decisão favorável – para obrigar o GDF a manter as escadas rolantes e elevadores em funcionamento.
O Ministério Público (MPDFT), com apoio da Rede Urbanidade (formada por especialistas e ativistas em mobilidade urbana), realizou vistoria na rodoviária e, posteriormente, propôs ação civil pública em 2020 para exigir que o GDF crie espaço seguro para os ciclistas estacionarem e circularem na rodoviária, além de exigir acessibilidade nas calçadas da plataforma inferior. Atendendo a pedido do Ministério Público, o Tribunal de Justiça (TJDFT) marcou audiência pública para o dia 18/2/2022, às 14h15 (em modo virtual) para tratar do tema.
100 imagens da rodoviária de 2007 a 2021, reunidas no álbum virtual: https://flic.kr/s/aHBqjzAkx5
VÍDEOS
Alguns vídeos que mostram a realidade na área central de Brasília.