Brasilia Para Pessoas

10
janeiro
Publicado por Brasília no dia 10 de janeiro de 2025

Texto e fotos: Uirá Lourenço

Atropelamento fatal no Eixão Norte.

O ano começa bem sangrento no Distrito Federal. Uma triste sequência de atropelamentos e mortes de pedestres e ciclistas. Só nos primeiros seis dias do ano ocorreram nove atropelamentos, três pessoas foram mortas (um ciclista e dois pedestres). Os dados do ano passado revelam o perigo nas pistas: houve 4.112 atropelamentos, média de 11 pessoas atropeladas por dia (divulgados pelo Correio Braziliense).

Correr para não morrer é o lema em muitos pontos do Distrito Federal, como no final da Asa Norte (na altura do Setor Hospitalar) e ao longo da via de acesso à ponte JK, onde não há qualquer local seguro de travessia (faixa de pedestre, passarela ou semáforo).

O Governo do Distrito Federal (GDF) pode e deve atuar para evitar tragédias no trânsito e humanizar a cidade.

Detalhes das tragédias

Algumas das notícias sobre atropelamentos e mortes no início de 2025. Fonte: G1/DF e Metrópoles.

Eis algumas informações sobre os atropelamentos recentes, com base nas notícias veiculadas:

– 1/1/2025: Tiago Gonçalves de Oliveira, 38 anos, foi atropelado enquanto pedalava no acostamento da BR-070, em Taguatinga. O ciclista foi levado ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos. O motorista foi preso alguns dias depois.

– 3/1/2025: Uma mulher de 50 anos foi atropelada no Guará, próximo à estação de metrô. Ela foi levada com ferimentos ao Hospital de Base.

– 3/1/2025: Uma mulher de 43 anos foi atropelada por motorista alcoolizado na Cidade Estrutural. Ela teve ferimento na cabeça e foi levada ao hospital.

– 4/1/2025: Um adolescente de 15 anos foi atropelado por motorista quando pedalava no Paranoá. Ele foi levado em estado grave para o Hospital Regional do Paranoá.

– 6/1/2025: Edilton Nunes de Oliveira, de 63 anos, foi atropelado e morto por motorista ao atravessar a EPIA. Ele trabalhava no serviço de roçagem e não resistiu ao atropelamento.

– 6/1/2025: Uma mulher de 38 anos foi atropelada e morta por ônibus ao atravessar via que passa pela região central de Taguatinga.

– 6/1/2025: Uma mulher e duas crianças (filhas) foram atropeladas por motorista em Ceilândia, altura da QNP 11, ao atravessarem na faixa. Uma das crianças foi levada ao Hospital Regional de Ceilândia. A faixa de pedestres onde ocorreu o atropelamento está com pintura apagada.  

Breve análise 

A maioria das vítimas fica anônima, tornam-se números nas frias e mórbidas estatísticas publicadas anualmente pelo Departamento de Trânsito. Vale lembrar que muitas pessoas ficam com sequelas permanentes, muitas famílias têm que lidar com o trauma da perda ou com os cuidados dos feridos.

Falta investigar melhor as causas dos ‘acidentes’ (sinistros de trânsito)1, promover melhorias nas vias, educar e fiscalizar mais; aos repórteres, cabe melhor apuração sobre os detalhes em cada local da tragédia: a velocidade dos motoristas, a sinalização, as condições de iluminação, o nome da vítima, os riscos de quem passa a pé e de bicicleta diariamente.   

Quais eram as condições de travessia onde o Sr. Edilton morreu atropelado enquanto trabalhava na roçagem na EPIA Norte no dia 6/1? A motorista que fez uma manobra brusca (o vídeo mostra que ela saiu da terceira faixa da esquerda e acelerou para conseguir acessar o desvio à direita) sofrerá algum tipo de sanção, perderá pontos na habilitação e vai ressarcir a família da vítima pelo dano irreparável?

Quem são as vítimas atropeladas por ônibus, recentemente, no centro de Taguatinga? Um ciclista atropelado em 24 de dezembro, que ficou em estado grave, e a mulher atropelada e morta no dia 6 de janeiro. A que velocidade estavam os motoristas no local com limite de 30 km/h? Medidas de engenharia de trânsito e fiscalização não poderiam ser adotadas para evitar essas e outras futuras tragédias?

No local em que a mulher e as duas filhas foram atropeladas em Ceilândia, no dia 6/1, a faixa de travessia estava apagada. O perfil ceilandiamuitatreta no instagram esteve no local no dia seguinte ao atropelamento e gravou vídeo que mostra a falta de pintura, situação que perdura alguns meses (pelo menos desde final de agosto/2024). Segundo a Administração de Ceilândia, o Departamento de Trânsito aguarda a próxima estiagem para refazer a pintura da faixa. Será que vão aguardar até maio de 2025?!

Muitas perguntas podem ser feitas, em vez de simplesmente culpar os mais vulneráveis (pedestres e ciclistas), como se vê em comentários de notícias sobre as tragédias. E muitas respostas/providências podem ser dadas pelos órgãos de trânsito.

O que fazer?

Zona 30 (com velocidade reduzida) na Universidade de Brasília.

Dá para fazer muito. As autoridades de trânsito precisam agir, não dá para tratar cada atropelamento como mera fatalidade.

Ficam algumas sugestões levando em conta o que se vê de positivo em segurança no trânsito e em humanização das vias. Há bons livros e manuais de referência (guia de Desenho de Ruas, de Moderação do Tráfego, de Gestão da Velocidade e o livro Cidades para Pessoas)2, e muitas cidades que nos inspiram: as cidades europeias estão na vanguarda, tais como Amsterdã, Berlim, Copenhague e Paris.

  • Redução/readequação dos limites de velocidade nas vias do DF com o objetivo de aumentar a segurança para todos: pedestres, ciclistas, motociclistas e motoristas;3
  • Levantamento dos pontos críticos de travessia e implantação de melhorias;
  • Implantação de zonas 30 efetivas (de baixa velocidade, com fiscalização);
  • Implantação de medidas de moderação de tráfego, tais como faixas elevadas de travessia, estreitamento de via e extensão de meio-fio;
  • Levantamento e monitoramento dos sinistros de trânsito no DF, com georreferenciamento e investigação das causas;
  • Campanhas permanentes de educação e fiscalização para coibir imprudência e excesso de velocidade;
  • Criação/reativação de conselhos participativos sobre segurança no trânsito e mobilidade urbana.

Placa no Eixo Monumental que destaca o perigo da alta velocidade.

Existem leis e programas governamentais de sobra para embasar ações em favor da vida e da segurança no trânsito. A Lei Federal 13.614/2018 criou o Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (Pnatrans), o Código de Trânsito (1997) estabelece a prioridade do pedestre, que ‘os veículos de maior porte serão sempre responsáveis pela segurança dos menores’, o motorizado protege o não motorizado. O Plano de Mobilidade Ativa do Distrito Federal (2020) tem entre os objetivos ‘Melhorar as infraestruturas de mobilidade para a população que se desloca a pé ou por bicicleta’.

Também não faltam recursos financeiros para um programa sério de segurança no trânsito, haja vista as grandes obras concluídas e em andamento (túneis e viadutos) em todo o DF. Para mencionar algumas das obras entregues pelo atual governo, o Túnel de Taguatinga teve custo de R$ 275 milhões, a Saída Norte (rebatizada de Complexo Viário Governador Joaquim Roriz) custou R$ 220 milhões, sem contar gastos posteriores com manutenção.

Brasília já teve o bom exemplo de respeito à faixa de pedestre, com a campanha Paz no Trânsito, que pode servir de inspiração. E aí, GDF, vamos pôr em prática ações efetivas para salvar vidas e ter vias seguras?!

_____________________________

1 O termo acidente deixou de ser utilizado, foi substituído por sinistro de trânsito (inclusive com alteração no Código de Trânsito). ‘Acidente’ é um termo que traz a noção de que as ocorrências são inevitáveis, ocorrem ao acaso. A atualização no termo reforça que atropelamentos e mortes nas pistas são, muitas vezes, evitáveis.

2 Essas são algumas referências com o objetivo de humanizar e tornar mais seguras as vias, as cidades de forma geral:

Guia Global de Desenho de Ruas (NACTO, 2018)

Gestão da Velocidade – um Manual de Segurança Viária para Gestores e Profissionais da Área (OPAS, 2012)

Guia de Medidas de Moderação de Tráfego (SENATRAN, 2024)

Cidades para Pessoas (Jan Gehl, 2015)

3 Sabe-se que a velocidade é um dos fatores principais de risco no trânsito. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o limite máximo de 50 km/h nas vias urbanas.

O Projeto de Lei 2789/2023, que tramita na Câmara dos Deputados, propõe alteração do art. 61 do Código de Trânsito para reduzir e adequar os limites de velocidade.  

Algumas notícias sobre as tragédias nas vias do DF:

https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2025/01/7029128-no-ano-passado-4-112-pessoas-foram-atropeladas-nas-vias-do-df.html

No ano passado, 4.112 pessoas foram atropeladas nas vias do DF

08/01/2025

https://www.metropoles.com/distrito-federal/df-contabiliza-11-atropelamentos-em-14-dias-cinco-pessoas-morreram

DF contabiliza 11 atropelamentos em 14 dias; cinco pessoas morreram

07/01/2025

https://g1.globo.com/df/distrito-federal/videos-bom-dia-df/playlist/videos-bom-dia-df-de-terca-feira-7-de-janeiro-de-2025.ghtml#video-13238562-id

Em menos de 15 dias, cinco pessoas morreram atropeladas no DF

07/01/2025

https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2025/01/06/mulher-morre-apos-ser-atropelada-por-onibus-no-centro-de-taguatinga-no-df.ghtml

Mulher morre após ser atropelada por ônibus no centro de Taguatinga, no DF

06/01/2025 

VÍDEOS

Alguns locais altamente perigosos para pedestres e ciclistas, sem travessia segura.



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Uirá Uirá Lourenço
Morador de Brasília, servidor público, ambientalista e admirador da natureza, Uirá é um batalhador incansável pela melhoria das condições de mobilidade na capital federal. Usa a bicicleta no dia a dia há mais de 25 anos e, por opção, não tem carro. A família toda pedala, caminha e usa transporte coletivo. Tem como paixão e hobby a análise da mobilidade urbana, com foco nos modos saudáveis e coletivos de transporte. Com duas câmeras e o olhar sempre atento, registra a mobilidade em Brasília e nas cidades por onde passa, no Brasil e em outros países. O acervo de imagens (fotos e vídeos), os artigos e estudos produzidos são divulgados e compartilhados com gestores públicos e técnicos, na busca de um modelo mais humano e saudável de cidade. É voluntário da rede Bike Anjo, colaborador do Mobilize e membro da Rede Urbanidade.
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