Brasilia Para Pessoas

28
agosto
Publicado por Brasília no dia 28 de agosto de 2023

Texto e fotos: Uirá Lourenço

No dia 23 de agosto fiz um pedal mais longo, pela Estrada Parque Taguatinga (EPTG). Já fazia algum tempo que não passava por lá1 e estava curioso para observar a (i)mobilidade após a entrega do túnel de Taguatinga e da terceira saída de Águas Claras.

Nos 56 km de pedal constatei o caos graças à forte política rodoviarista de incentivo ao automóvel. Na altura do bairro Sudoeste, o viaduto em obras é um grande obstáculo. A região – antes agradável e arborizada – está estéril e hostil. Um carcará se hidratava numa poça lamacenta no canteiro de obras.

Na entrada do bairro Sudoeste, aridez causada pelo trevo rodoviário em obras.

Segui caminho e o mar de carros se intensificava até chegar ao auge na EPTG. Do alto da passarela, o congestionamento interminável. Parece que agora não há mais horário de pico: de manhã estava tudo parado (em diferentes pontos) e no início da tarde também. Apenas alguns ônibus em meio a tantos carros.

Enquanto isso, a ciclovia vazia. Devo ter visto ou cruzado com, no máximo, 20 ciclistas. Em geral, homens jovens. Chamou atenção uma mulher, guerreira, pedalando junto aos carros. Ponto fora da curva na preponderância masculina diante dos obstáculos. Em alguns trechos a ciclovia termina de repente, inclusive na chegada à Taguatinga. Para piorar, no túnel batizado de Rei Pelé (que prefiro chamar Túnel Rei Automóvel2) é expressamente proibido caminhar e pedalar.

Mar de Carros na EPTG.

Obstáculos no caminho: término da ciclovia e proibição expressa no túnel.

Após passar pelo caminho de rato no final da EPTG e atravessar correndo, próximo à entrada do túnel, me deparo com um ambiente árido e hostil. Cadê o prometido boulevard sobre o túnel?! Faltam banquinhos, falta sombra e sobra área impermeabilizada. Ao meio-dia o desconforto térmico era grande3.    

Encontrei na Praça do Relógio o Júlio, Eloy e Felipe, moradores da região e membros da Rede Cidadã de Taguatinga. Eles me mostraram outro problema no pseudo-boulevard (com tanto concreto e sem local de lazer e convivência não dá para chamar de boulevard): a esquina da morte. Um cruzamento mal sinalizado e que, apesar do grande movimento de pedestres e ciclistas, muitos motoristas passam bem rápido. O Sr. Eloy comentou que já houve, pelo menos, dois atropelamentos recentes (vídeo divulgado no Instagram).

Cenas de Taguatinga: ambiente árido no pseudo-boulevard e esquina da morte.

Fiz uma pausa para hidratar e segui de volta pela EPTG. Novo perrengue para alcançar a ciclovia, que continuava vazia. De repente me deparo com essa cena emblemática: placa indicando a Cidade do Automóvel e ao fundo o anúncio do GDF enaltecendo o Túnel de Taguatinga.

Na EPTG, cenário automotivo bem evidente.

A ciclovia termina mais uma vez, próximo do acesso à EPIA. Me preparo para enfrentar o mar de carros parados – EPTG, EPIA e EPIG com fila interminável de carros e caminhões. Poucos ônibus no horizonte.

No trajeto de volta, caos automotivo na EPTG, EPIA e início da EPIG.

Decidi seguir pela via do Setor Policial, em obras. A placa informa tratar-se da construção de BRT (sistema rápido por ônibus). Mas ali é uma das poucas vias que tem (ou tinha) faixa exclusiva de ônibus. Será que precisava de uma grande obra? Sigo pelo asfalto tórrido, sem sombra. Mais à frente outra cena lamentável: várias árvores frondosas marcadas com ‘X’. Possivelmente o canteiro arborizado vai virar pista e intensificar a ilha de calor.

Ainda no Setor Policial, próximo à W3 Sul, continuo caminho pelo canteiro e vejo paineiras sendo extirpadas, arrancadas pela raiz. Assim como o pseudo-boulevard de Taguatinga, o pseudo-BRT serve para justificar mais uma ampliação de via, mais pistas para a frota crescente de automóvel.

Paineiras marcadas e suprimidas no Setor Policial.

Apesar dos anúncios do governo que exaltam os motoristas e das grandes obras (túnel de Taguatinga, terceira saída de Águas Claras e viaduto do Sudoeste, entre outras), pretendo continuar sem carro. Será que um dia vou me render?!

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1 Morei em Águas Claras por dois anos, acompanhei as obras de ampliação da EPTG (curiosamente chamada de Linha Verde) e fiz muitos registros – fotos e vídeos.

2 Escrevi sobre o túnel no blog: https://brasiliaparapessoas.org/2023/06/27/tunel-rei-automovel/

3 Confirmei depois a alta temperatura. Segundo noticiado, foi o dia mais quente do ano no DF. 

Álbum completo com fotos do Pedal Exploratório:

https://flic.kr/s/aHBqjASmXG

VÍDEO

O vídeo mostra os detalhes do trajeto de bicicleta até Taguatinga.



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Uirá Uirá Lourenço
Morador de Brasília, servidor público, ambientalista e admirador da natureza, Uirá é um batalhador incansável pela melhoria das condições de mobilidade na capital federal. Usa a bicicleta no dia a dia há mais de 25 anos e, por opção, não tem carro. A família toda pedala, caminha e usa transporte coletivo. Tem como paixão e hobby a análise da mobilidade urbana, com foco nos modos saudáveis e coletivos de transporte. Com duas câmeras e o olhar sempre atento, registra a mobilidade em Brasília e nas cidades por onde passa, no Brasil e em outros países. O acervo de imagens (fotos e vídeos), os artigos e estudos produzidos são divulgados e compartilhados com gestores públicos e técnicos, na busca de um modelo mais humano e saudável de cidade. É voluntário da rede Bike Anjo, colaborador do Mobilize e membro da Rede Urbanidade.
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