Em frente à estação Santana do Metrô, intenso trânsito de carros e pedestres. Foto: Vivian Reis/G1
A Avenida Cruzeiro do Sul, localizada entre a região central e a Zona Norte de São Paulo, é a via mais perigosa para pedestres na capital paulista, aponta o último relatório sobre acidentes de trânsito fatais da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Em 2015, das seis mortes registradas em acidentes de trânsito na via, todas foram causadas por atropelamentos.
Embora a avenida possua três estações de Metrô e grande fluxo de pedestres nestes pontos, seus semáforos ficam abertos para os pedestres por apenas 25 segundos. Já o farol para veículos fica verde por até 5 minutos e 25 segundos (ou seja, 13 vezes mais tempo para os carros do que para quem está a pé).
Além disso, em alguns cruzamentos faltam faixas de segurança e sinais para pedestres, ou os semáforos estão sem sincronização.
Em nota, a CET afirmou que atribui o alto número de acidentes na via ao desrespeito de pedestres à sinalização na travessia da faixas e sinais vermelhos, e afirma que vai intensificar as ações com agentes de trânsito a fim de orientar os pedestres e evitar acidentes.
A capital também teve, segundo a CET, o menor número de mortes em acidentes em 37 anos. Em 2014, por exemplo, a via mais perigosa da época, a Avenida Marechal Tito, teve 15 mortes por atropelamento (2,5 vezes o número registrado na Cruzeiro do Sul). No total, as mortes no trânsito em São Paulo caíram 20,6% em 2015. Em 2014 foram 1.249 mortes, contra 992 no ano passado. Nesta quarta-feira (20) completa um ano de redução de velocidade nas marginais.
Apesar de a Marginal Tietê ter tido três mortes a mais no ano passado, totalizando nove óbitos por atropelamento, ela não é considerada mais perigosa do que a Cruzeiro do Sul porque é exclusiva para veículos (não tendo semáforos nem faixas de pedestres).
Além disso, com 23,5 km de extensão, ela é três vezes maior do que a Cruzeiro do Sul (que tem 7,6 km), o que indica mais mortes por menos quilômetros na avenida da Zona Norte. Os atropelamentos fatais na marginal correspondem a 30% dos acidentes com mortes registrados no ano passado (a maioria ocorreu em colisões e em queda de motociclistas).
Perigos
O G1 percorreu a Avenida Cruzeiro do Sul e ouviu um especialista que confirmou que a via privilegia os veículos aos pedestres.
A via começa junto à Avenida do Estado. Lá, já exige atenção redobrada do pedestre, pois há fluxo de veículos vindos tanto da Avenida do Estado quanto da Rua Pasteur. “Trabalho aqui há três anos e vejo atropelamentos e batidas frequentemente nesta esquina”, relatou Beto da Silva, de 29 anos, que trabalha em uma borracharia nas imediações do local.
Início da Cruzeiro do Sul exige atenção em dobro do pedestre por conta do fluxo de veículos da Av. do Estado e da Rua Pasteur. Foto: Vivian Reis/G1
Semáforos
A movimentação também é intensa no cruzamento com a Rua Pedro Vicente devido à proximidade ao acesso à estação Armênia do Metrô. O problema no trecho é que o semáforo de pedestres está sem sincronização.
“Trabalho aqui há uma semana e vejo 'quase atropelamentos' direto aqui em frente, uns três ou quatro por dia se eu estiver distraído. Inclusive, uns 15 minutos atrás quase ocorreu um acidente entre viatura, ônibus e pedestre aqui”, contou Felippe Peixoto, de 25 anos, que trabalha como atendente em uma farmácia.
Nas imediações da estação Armênia do Metrô, travessia deveria ser feita em duas partes. Foto: Vivian Reis/G1
O problema se repete no cruzamento com a Avenida Zaki Narchi. Quem está na via e pretende cruzar a Cruzeiro do Sul precisa ter paciência ou apertar o passo para encontrar os semáforos coincidindo no verde.
O cruzamento com a Avenida Ataliba Leonel também demanda atenção redobrada por conta da falta de sincronização.
O Boletim Técnico 48 da própria CET, lançado em 2011 e ainda considerado atual, comprovou que a travessia de avenidas em duas etapas "resultava em um tempo de espera longo que estimulava os pedestres a fazerem a travessia em conflito com os veículos, gerando desconforto e alto potencial de acidentes".
Pedestre deve aguardar duas vezes para atravessar, pois sinais de pedestres estão fora de sincronia no cruzamento da Zaki Narchi com a Cruzeiro do Sul. Foto: Vivian Reis/G1
O próximo ponto problemático é nas imediações da estação Carandiru do Metrô. Após caminhar cerca de 200 metros da Avenida Zaki Narchi até a próxima faixa, o pedestre precisa esperar 5 minutos e 25 segundos para que o sinal abra para ele. Quando isso acontece, ele precisa ser rápido, já que em 25 segundos o sinal volta a fechar.
Em poucos minutos de observação no local é possível presenciar dezenas de pedestres aguardando o momento menos perigoso, sem automóveis, ônibus e caminhões, para chegar ao outro lado da via.
O engenheiro civil e especialista em transportes Sérgio Ejzenberg explicou que o tempo descrito induz o pedestre ao erro. "Esse tempo é absurdo, indecente. Em 5 minutos e 25 segundos de espera, o pedestre fica maluco, pensa que o sinal quebrou, procura uma brecha e pode morrer. Para o pedestre, o tempo máximo de espera deve ser de 2 minutos", diz Ejzenberg.
Sobre a distância entre as faixas de pedestres, o especialista não considera que sejam o problema da Avenida Cruzeiro do Sul. "O Código de Trânsito Brasileiro prevê que, se o pedestre não encontra uma faixa em 50 metros, ele deve alcançar a esquina mais próxima ou atravessar após se certificar das condições de segurança para isso", explica.
"Mais do que a quantidade de faixas, a Cruzeiro do Sul é doente do ponto de vista urbanístico. As estações de Metrô ao longo de sua extensão mataram essa via, que hoje é uma mistura de avenida e minhocão. A via é um tubo encaixotado com concreto dos lados", opina o especialista.
Leia a matéria na íntegra, com mais fotos e observações ponto a ponto de todo o trecho percorrido pela reportagem do portal G1 na Av. Cruzeiro do Sul.
Leia também:
Estatuto do Pedestre é revisto por entidades em defesa da mobilidade a pé
Número de motoristas bêbados ao volante cresce 41% em São Paulo
São Paulo faz eleições para Conselho de Transporte e Tráfego
O desenho urbano que salva vidas