"O atual modelo de urbanização é insustentável e é necessário inovar os padrões de desenvolvimento com novas formas de colaboração, cooperação, planejamento, governança e financiamento”. A citação foi feita por José Carlos Bernasconi, presidente do Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco), no painel Mobilidade, Acessibilidade e Desenvolvimento Urbano, realizado ontem (15) durante o evento Construction Summit 2016, em São Paulo.
Bernasconi referia-se ao relatório Cidades do Mundo (ONU-Habitat) divulgado em maio passado para defender uma alteração profunda nas formas de gestão das cidades, especialmente no Brasil, onde quase 85% da população vivem em áreas urbanizadas, o que significa 170 milhões de pessoas habitando uma área com 22 mil km2. "Tamanha concentração de pessoas impõe enormes desafios e é incrível que, apesar dos problemas, toda essa gente encontre formas de se alimentar, transportar, viver", avaliou o dirigente do Sinaenco. Para Bernasconi, é preciso planejar as mudanças a longo prazo e desenvolver projetos que ao mesmo tempo reduzam as desigualdades sociais, melhorem a mobilidade urbana e propiciem ganhos para o meio ambiente.
Ele lembrou, ainda, as frequentes alterações de planos e projetos, que ocorrem a cada mudança de governantes, e defendeu a necessidade de que o planejamento seja - de fato - um instrumento de estado, não de governo: "O prefeito pode ser comparado a um piloto que assume a condução da cidade, mas que deve seguir um plano, dar sequência a uma proposta de gestão discutida com a sociedade", resumiu Bernasconi.
O encontro contou com a participação de representantes de vários segmentos da sociedade civil, tal como o professor Miguel Bucalém, coordenador científico do USP Cidades, que fez a mediação dos debates, a arquiteta Silvana Cambiaghi, da Comissão Permanente de Acessibilidade (CPA) de São Paulo; Gilberto Perre, secretário executivo da Frente Nacional de Prefeitos (FNP); e Guilhermo Petzhold, especialista em mobilidade urbana do WRI Brasil Cidades Sustentáveis.
Transporte público x carros
Gilberto Perre, da FNP, explicou que nos últimos anos as prefeituras viveram um momento virtuoso, com aumento expressivo das arrecadações, o que permitiu projetos e obras importantes, mas que agora, com a crise, passam por um processo difícil, de absoluta falta de recursos. Defendeu uma proposta de financiamento e subsídio ao transporte público por meio de uma Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico (Cide) Municipal. Ele explicou que segundo dados de uma pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV), na capital paulista, um simples acréscimo de R$ 0,10 no preço da gasolina/álcool poderia reduzir em cerca de R$ 0,30 o valor da tarifa do transporte coletivo.
Petzhold, da WRI Brasil, lembrou que os congestionamentos geram prejuízos econômicos que podem chegar a até 10% do PIB do Brasil. "No país, os carros particulares transportam 33% dos passageiros, mas ocupam 78% das vias públicas, enquanto os ônibus ocupam apenas 20% dos espaços mas respondem por 70% dos deslocamentos diários. Precisamos mudar essa cultura carrocêntrica e dar mais espaço para outras formas de mobilidade", explicou o especialista.
Ao abordar o conceito da Acessibilidade e Desenho Universal, a arquiteta Silvana Cambiaghi afirmou que os espaços - em edifícios ou no ambiente urbano - precisam ser flexíveis para serem usados por qualquer pessoa, seja uma criança, um idoso, uma pessoa com deficiência ou alguém que esteja com a mobilidade momentaneamente reduzida. "E isso já deve nascer no projeto da arquitetura, no detalhamento de cada cômodo, por exemplo na definição da largura das portas", explicou a especialista, que também é cadeirante.
Leia o relatório Cidades do Mundo da ONU-Habitat (link)
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