Inicialmente, a capital alemã parece ideal para ciclistas. Mas quem pedala todo dia sabe que as coisas não são tão perfeitas assim. Clarissa Neher* fala sobre uma iniciativa que quer revolucionar o ciclismo em Berlim.
Uma das primeiras diferenças culturais que percebi em Berlim foi a importância da bicicleta como meio de transporte. As condições pareciam ideais para pedalar, mas, depois de um tempo, vi que era tudo ilusão. Embora a Alemanha esteja bem mais avançada do que o Brasil nesse quesito, pedalar aqui exige coragem e muita, mas muita paciência.
Sem prática e, confesso, com um pouco de medo, comecei pedalando apenas na calçada, o que na verdade é proibido e pode render uma multa. Com o tempo, ganhei confiança, e a bicicleta se tornou o meu principal meio de locomoção, não importa a distância nem o clima – pedalo até quando neva.
Com a experiência, fui percebendo que pedalar em algumas regiões de Berlim é quase tão arriscado quanto no Brasil. Em avenidas movimentadas, dividir o espaço com carros exige atenção constante. Onde não há ciclovias, os ciclistas devem andar na rua ao lado dos carros. E muitos motoristas fazem questão de bloquear a faixa toda para não deixar os ciclistas passarem.
A competição acontece também onde há ciclovias. Dificilmente saio de A e chego a B sem ter que desviar de pelo menos um carro parado em cima da faixa destinada às bicicletas.
Referendo
Para uma cidade que se diz moderna e sustentável, Berlim deixa a desejar na segurança de quem pedala. Por isso, um grupo de ciclistas voluntários quer promover um referendo para obrigar a prefeitura a adotar uma legislação específica para as bicicletas. A iniciativa começou recentemente, com a coleta das 20 mil assinaturas necessárias para abrir o processo.
O grupo pede, entre outras coisas, a construção de no mínimo 50 km de ciclovias seguras por ano até 2025, alargamento das ciclovias já existentes em avenidas, e a criação de uma divisão na polícia para investigar roubos de bicicletas.
A prefeitura não está nem um pouco contente com a proposta e argumenta que a aprovação do referendo pode causar confronto entre ciclistas e usuários de outros meios de transporte.
Pois o objetivo do referendo é justamente deixar a cidade mais segura para ciclistas e, com isso, estimular o uso da bicicleta como meio de transporte, já que seus benefícios para saúde e o meio ambiente são incontestáveis.
Resta agora saber se a população de Berlim também está disposta a largar o carro e subir na bicicleta. Eu, como ciclista, sou a favor do referendo.
*Clarissa Neher é jornalista freelancer na DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Ela escreve sobre a cidade que adotou na coluna Checkpoint Berlim, publicada às sextas-feiras no portal Terra
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