Construídos nos anos 1970, os calçadões do Centro de São Paulo foram uma importante conquista para os milhões de pedestres que circulam diariamente por esse "casco antigo" da capital paulista.
Passados 40 anos, porém, essa infraestrutura começa a dar sinais de fadiga. Basta passear naquela região - entre as praças da Sé e República para notar dezenas de falhas no pavimento, com buracos, pedras soltas e muitas cicatrizes herdadas de obras subterrâneas, em especial das empresas de telefonia.
Um olhar mais atento também verá cotidianamente as equipes de reparos de pavimentos da prefeitura, numa operação infindável, já que todos os dias novos buracos surgem sob as rodas de caminhões ou dos impactos de pesadas cacambas de aço. Afinal, trata-se de um pavimento feito para suportar apenas o peso de pessoas e de veículos leves.
Por conta desses problemas a prefeitura de São Paulo está realizando uma obra-piloto com novo tipo de pavimentação na rua Sete de Abril, uma via que tem um uso misto, com espaços compartilhados entre carros, caminhões, pedestres e bicicletas.
A intervenção responde a uma das metas da atual gestão, a de requalificar vias e praças relevantes do centro da cidade, de forma a estimular a presença das pessoas nos espaços públicos. Na mira da administração, logo após a obra da Sete de Abril, estão os calçadões do centro, o Vale do Anhangabaú, e a av. Santo Amaro, uma via muito prejudicada pela construção de um corredor de ônibus, ainda nos anos 1980.
O projeto foi desenvolvido sob a coordenação do arquiteto Luís Eduardo Surian Brettas, superintendente do Desenho da Paisagem da SPUrbs, empresa municipal de planejamento. A proposta envolveu uma ampla pesquisa de materiais e soluções para resolver os problemas de microdrenagem, pavimentação e de interferências das instalações subterrâneas.
Rua Sete de Abril: visão de futuro
Pavimento de blocos maciços
Destaque para um novo tipo de bloco de concreto capaz de suportar os impactos de veículos bem pesados, como carros-forte, caminhões de coleta de lixo ou de bombeiros. A peça foi dimensionada para suportar trens de rodas com sobrecargas de 20 toneladas, explica Brettas: "Fizemos um trabalho em conjunto com a Associação Brasileira de Cimento Portland, que nos ajudou a encontrar a melhor alternativa com o melhor dimensionamento. A ideia é que o pavimento suporte o tráfego pesado eventual, que mantenha suas características de acabamento superficial e que, no caso de alguma obra, seja possível remover as peças e recolocá-las sem grandes danos e sem cicatrizes no pavimento. A ABCP fez algumas propostas e nós fomos dirigindo a pesquisa até chegar à alternativa que desejávamos".
Os blocos de pavimentação são maciços e têm grandes dimensões (40 cm x 20 cm x 16 cm), com peso de 30 kg, e dotados de ranhuras que propiciam o encaixe justo, sob um leito de areia pré-nivelado. "Eles são calculados e trabalham de forma completamente diferente da dos pisos intertravados", explica Brettas.
Subsolo
Apesar das diferenças o novo pavimento assemelha-se aos intertravados pela praticidade de remoção em caso de obras subterrâneas. Em tese, basta extrair uma das peças e desmontar o conjunto, que depois pode ser reconstruído, com perdas mínimas de material. Na prática, a operação pode ser bem mais difícil em função do peso e da pressão lateral entre os componentes. "Talvez seja necessário destruir um dos blocos para destravar o conjunto", avalia o arquiteto da SPUrbs.
O subterrâneo do pavimento recebeu uma série de tubos de grande diâmetro que funcionarão como um banco de dutos, para atender às futuras demandas de empresas de eletricidade, telefonia e dados. Os tubos são identificados e serão acessados por tampas de inspeção, permitindo a passagem de cabos sem a necessidade de demolição do pavimento. As caixas e tampas de inspeção também estão recebendo um tratamento diferenciado: estarão abaixo do nível do pavimento e terão seu topo selado com uma resina que permitirá o acabamento e nivelamento milimétrico com o pavimento. Ainda sob o solo está sendo instalada uma linha de canaletas que receberá as águas das chuvas, de forma a evitar a formação das poças, comuns nos calçadões de São Paulo.
Além do pavimento, a equipe da SPUrbs está desenvolvendo uma nova família de mobiliário urbano para a renovação dos calçadões. Segundo Brettas, as peças inspiram-se na linguagem dos parklets, que foram muito bem aceitos pela população da cidade. Assim, finalmente, o centro voltará a ter pontos para descanso dos pedestres. Além deles e dos ciclistas, apenas veículos autorizados terão acesso à rua, por meio de controles eletrônicos e balizadores pneumáticos.
Piso autolimpante
Um diferencial importante das peças de pavimentação é a adição de dióxido de titânio na face exposta do concreto, material semicondutor que tem a capacidade de reagir e degradar materiais orgânicos e poluentes da atmosfera. Com essa técnica a prefeitura espera ter um pavimento que seja capaz de eliminar manchas de óleos e de resíduos orgânicos, como os líquidos de sacos de lixo, por exemplo. Além disso, o novo piso poderá também capturar gases gerados pela circulação de veículos automotores na região e também reduzir mal cheiros gerados por lixo, gases de esgoto etc.
Veja mais imagens do projeto e obra: www.mobilize.org.br/galeria-fotos/282/novo-pavimento-para-calcadao-em-sp.html
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