O slogan "Mais amor, menos motor", comum nas bicicletadas de dois ou três anos atrás, sempre me lembrava o "Paz e Amor", principal palavra de ordem da contracultura nos anos 1960. Ambas soam ingênuas, quase pueris frente à barbárie que vivemos nas cidades, não apenas no Brasil.
Um dos indicadores dessa "guerra urbana" foi apresentado pelo médico Marcos Musafir durante o 9º Congresso Brasileiro e o 5º Internacional de Trânsito e Vida, realizado em Salvador, na semana passada. Segundo o palestrante, são cerca de 1,3 milhões de mortos e 40 milhões de feridos em todo o mundo a cada ano, metade deles pedestres. No Brasil, por ano, são mais de 40 mil vidas perdidas, grande parte nas cidades, e a maioria em atropelamentos e acidentes com motocicletas.
O que chama a atenção nos últimos dois anos é o aumento de notícias na mídia brasileira sobre acidentes e atropelamentos envolvendo ônibus, especialmente nos corredores construídos entre 2013 e 2015. Não há dúvida de que ônibus confortáveis e seguros significam um passo positivo no transporte urbano: apenas um veículo articulado pode tirar das ruas mais de 70 carros, com enormes ganhos para a melhoria do ambiente urbana. No entanto, a condução de um veículo pesado, com mais de cem passageiros, não poderia ficar dependente de apenas um motorista, por mais treinado e consciente que ele seja. A figura - hoje questionada - do cobrador poderia suprir parcialmente a função de um auxiliar do motorista.
Uma alternativa mais racional e econômica envolve tecnologia. Anos atrás, quando o Expresso Tiradentes (o fura-fila) foi anunciado em São Paulo, havia a proposta de que os ônibus fossem guiados por trilhos virtuais - um cabeamento instalado sob o pavimento. O sistema foi desenvolvido no Brasil e poderia ser uma ferramenta para suprir qualquer mal-estar ou falha do condutor.
A terceira opção é a versão moderna do bonde, o chamado veículo leve sobre trilhos, em implantação no Rio de Janeiro, em Santos-SP e também em Cuiabá. Na capital mato-grossensse, as obras estão paralisadas desde 2013 por uma série de problemas políticos, técnicos e econômicos.
As vantagens do VLT são o ruído mínimo, ausência de emissões e a segurança e previsibilidade da trajetória de cada composição, o que permite uma convivência mais tranquila com a vida urbana. A desvantagem é o alto custo inicial, embora o sistema e os veículos tenham longa duração. Trata-se uma opção para longo prazo, bastante utilizada na Europa, Estados Unidos e mesmo aqui na América do Sul, em Buenos Aires, e mais recentemente em Medellín, na Colômbia.
Caminhar, pedalar ou andar em cadeiras de rodas ao lado de mamutes metálicos barulhentos, ruidosos e jogando fumaça no ar não é mesmo agradável. É perigoso e faz mal à saúde. Com o Brasil em crise, o caminho do meio parece ser o mais suave: faixas de ônibus elétricos com direção controlada por trilhos virtuais e sistemas de monitoramento a distância.
Outra possibilidade, na linha do "Menos Motor" está sendo apontada por ativistas que lançaram a proposta do PAC da Mobilidade Ativa. A ideia é exigir que o governo federal ponha em prática tudo aquilo que está escrito na Lei 12.587, que define a Política Nacional de Mobilidade Urbana: melhorar as calçadas, construir ciclovias, integrá-las ao transporte público e desenvolver pesquisa e campanhas educativas. O Mobilize apoia essa iniciativa. Sonhamos muito?
Marcos de Sousa
Editor do Mobilize Brasil