Antes mesmo de ser inaugurada, a faixa verde de pedestres pintada no leito carroçável da avenida Liberdade, no centro de São Paulo, já vem gerando polêmica. O projeto piloto tem como objetivo coletar informações sobre a viabilidade da ampliação do espaço destinado aos pedestres na região, mas vem sendo questionado como se fosse uma política definitiva.
“Ao contrário do que possa parecer, o investimento financeiro para ampliar calçadas é muito alto. O piloto servirá para validar ou não um espaço a mais para os pedestres nessa região e a aplicação de recursos”, explica Ronaldo Tonobohn, superintendente de projetos da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Segundo Tonobohn, a escolha da avenida Liberdade se deu por uma série de características que podem ser avaliadas na região e que serviriam de parâmetro para outras localidades. “Além do grande fluxo de pedestres que já transitam pela rua há um acúmulo de águas pluviais, uma declividade acentuada da via entre outros fatores relevantes”, explica.
Alargar sai mais caro
Para a arquiteta e urbanista Meli Malatesta o ideal seria mesmo alargar as calçadas, o que no entanto é mais custoso e complexo. “Para alargar uma calçada é necessário mexer no coroamento da pista, ou seja, na curvatura dela. Os pontos de captação da rede pluvial ficam próximos ao meio fio e há galerias subterrâneas. Ao alargar as calçadas é preciso, portanto, fazer intervenções de superfície mas também subterrâneas. Por isso, num primeiro momento, sou a favor das faixas verdes”, avalia.
Malatesta cita o exemplo da rua Sete de Abril, também no centro, onde o alargamento da calçada não foi acompanhado de obras subterrâneas. “Ampliaram a calçada, mas o sistema de drenagem ficou prejudicado. Colocaram as grelhas no meio do passeio e quando chove os transeuntes evitam passar por ali”, revela. Este é, inclusive um dos motivos que levou a CET a implantar o projeto piloto na avenida Liberdade. Nas épocas de chuva a região recebe grande volume de água proveniente da região mais alta da Vergueiro, o que segundo a companhia poderia configurar um problema que será monitorado.
“Além da curvatura da via, pelo mesmo motivo de drenagem ou acesso de veículos, as calçadas também tem inclinação de lote. Se prolongássemos simplesmente a calçada o alinhamento da mesma ficaria incompatível com o viário, por isso trata-se de uma intervenção muito mais complexa do que simplesmente fazer concreto”, explica Tonobohn. “Faremos as avaliações nos horários de pico, onde mesmo antes da implementação das faixas verdes havia pessoas ocupando as vias. Ao contrário do que possa parecer, as avaliações não servirão para validar a faixa verde e sim responder se a ampliação do espaço para os pedestres resolverá os problemas de fluxo”, completa.
Ainda segundo a CET, após o término do período de avaliações um relatório de acompanhamento será encaminhado ao Contran, pois como se trata de um procedimento novo é necessária a validação do órgão de trânsito.
Compensação
A região da Liberdade onde a faixa verde será implementada já tem a urbanização consolidada. Embora as universidades que ali estão sejam as grandes responsáveis pela geração do intenso fluxo de pedestres, estas já cumpriram suas responsabilidades legais quanto ao impacto que causam no entorno. “Não há qualquer possibilidade legal de cobrar destas universidades pelas adequações nas calçadas, já que elas já cumpriram as medidas mitigadoras que lhes cabiam. O que temos feito é incluir nos Termos de Ajuste de Conduta (TAC) dos novos empreendimentos um recuo diferenciado de fachada, a implementação de ciclovias e calçadas compatíveis”, explica Tonobohn.
25 de Março e Santa Ifigênia
Perguntado sobre a possibilidade de aplicação da mesma metodologia em outras vias do centro da cidade, como a rua 25 de Março e a Santa Ifigênia, onde pedestres já ocupam o leito carroçável diariamente em grande número, o superintendente da CET foi taxativo: “É um piloto e precisa ser avaliado com cuidado antes de aplicar em outras localidades”.
Em 2013 a prefeitura de São Paulo e a SP Urbanismo iniciaram uma tratativa para um projeto de “pedestrianizar” a rua 25 de Março, o maior centro comercial a céu aberto do Brasil, nos mesmos moldes do que havia sido feito no Largo São Francisco. A proposta no entanto não foi acolhida pela associação dos comerciantes locais e o projeto parou.
Rua Boa Vista
Segundo a CET já existe um projeto de alargamento das estreitas calçadas da rua Boa Vista, próximo ao Pátio do Colégio e onde se encontra o Solar da Marquesa de Santos, e que deve ser colocado em prática em breve.
Avanço de calçadas
Nas esquinas e junto aos pontos de ônibus no trecho da avenida Liberdade onde será implementada a faixa verde já foi feito o avanço das calçadas, o que segundo Tonobohn foi responsável pelo atraso na implementação do projeto. Questionado sobre a possibilidade de reproduzir o avanço de calçadas em outras esquinas da cidade no intuito de facilitar a travessia de pedestres, o superintendente da CET lembrou de diversas intervenções do tipo que a companhia de tráfego realizou na cidade utilizando apenas a sinalização. “Consideramos que foram bem sucedidas porém não foram aprovadas pelo Denatran. No entanto a norma relativa a este projeto está sendo revista e quem sabe poderemos dar continuidade”, conclui.
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